O globo, n. 31208, 16/01/2019. País, p. 10

 

Bolsonaro escolhe líder novato para a Câmara

Bruno Góes

16/01/2019

 

 

Sem experiência na articulação política, Major Vitor Hugo (PSL-GO) é consultor legislativo e vai comandar negociações da reforma da Previdência; escolha surpreendeu até deputados do partido do presidente

O presidente Jair Bolsonaro escolheu um parlamentar estreante para o papel de líder na Câmara dos Deputados: o Major Vitor Hugo (PSL-GO), funcionário concursado da Casa, onde trabalha desde 2014 como consultor legislativo. Sem experiência na articulação política, principal tarefa do cargo, ele tem perfil diferente de outros nomes que ocuparam a mesma função em governos anteriores.

Durante os governos de Luiz Inácio Lula da Silva, parlamentares com mais de um mandato no currículo assumiram a posição, como Arlindo Chinaglia (PT-SP), José Múcio Monteiro (PTB-PE) e Candido Vaccarezza (PT-SP), que seguiu no cargo com Dilma Rousseff. Já no governo Michel Temer, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), em seu segundo mandato, assumiu o posto.

Formado na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman) — assim como o presidente —, bacharel em Direito e com tempo de serviço no exterior, o deputado Vitor Hugo terá como primeiro grande desafio negociar a aprovação da reforma da Previdência.

Será uma missão completamente diferente daquelas a que teve bom desempenho no passado. Durante a campanha eleitoral, Vitor Hugo atribuía a si o título de “cadete mais distinto da Aman”. Explorou o fato de ter sido o primeiro da turma e contou suas dificuldades para manter-se como um “destacado” militar.

Aperto de mão com FH

Em um vídeo gravado para a campanha, Vitor Hugo diz que serviu duas vezes na Costa do Marfim. Primeiro, entre 2004 e 2005, como segurança da embaixada brasileira no país africano. Depois, entre 2008 e 2009, como observador militar em missão das Nações Unidas. Neste segundo período, ele conta ter contraído malária cinco vezes.

Um dos momentos de sua trajetória que guarda é o aperto de mãos oferecido pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Em discurso de despedida do Exército, após passar em concurso para a Câmara, deixou registrada a ocasião.

“Falemos, então, dos tempos que vivi no Exército. Lembro-me das semanas de ansiedade para o resultado do concurso de admissão à preparatória; dos segundos apertando a mão do presidente da República, ao receber o Espadim, símbolo da Honra Militar”, afirmou.

Por estar há cinco anos na Câmara, Vitor Hugo conhece o funcionamento da Casa. Mas não tem vivência com a negociação entre parlamentares. A indicação provocou desconfiança entre experientes deputados.

Um ex-líder de governo, que não quis se identificar, disse ao GLOBO que “ninguém conhece” Vitor Hugo e ressaltou que o cargo demanda “experiência” e “trato político”. Principalmente, segundo seu ponto de vista, para enfrentar a “tranqueira” da reforma da Previdência. A pauta foi escolhida como prioritária pelo governo, e as articulações em torno do assunto, que sempre costuma dividir os congressistas, serão um termômetro do tamanho da força que a gestão de Bolsonaro terá no Congresso.

Na Esplanada, Vitor Hugo é próximo do ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas. Ambos são amigos desde os tempos de Aman.

Líder surpreendido

Aos 41 anos, Vitor Hugo teve 31 mil votos na eleição do ano passado. Ele é de Goiás, estado do atual líder do PSL, Delegado Waldir. A escolha de Vitor Hugo, na segundafeira, surpreendeu o colega de partido. Ao ser questionado pelo GLOBO, na noite de segunda-feira, sobre a indicação, Waldir confessou que ainda não sabia da formalização da escolha.