O globo, n. 31172, 11/12/2018. País, p. 4

 

Com diploma e promessas

Carolina Brígido

Eduardo Bresciani

Jussara Soares

11/12/2018

 

 

Bolsonaro diz que vai governar para todos, e Rosa Weber fala em tolerância

Ao discursar ontem, após ser diplomado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o presidente eleito, Jair Bolsonaro, prometeu governar “em benefício de todos os brasileiros”, sem distinção de origem racial, sexo, cor, idade ou religião. Ao falar dos 57 milhões de votos que recebeu, comemorou o advento das “novas tecnologias” que possibilitaram sua eleição a partir das redes sociais. Condenando as “mentiras” e a “manipulação ideológica”, sem endereçar os recados, o presidente eleito disse que “o poder popular não precisa mais de intermediação”.

A presidente do TSE, por sua vez, Rosa Weber, pontuou que a democracia “repele a noção autoritária do pensamento único”.

A cúpula do Judiciário, os presidentes da Câmara e do Senado e uma série de políticos e militares participaram da rápida cerimônia no TSE que confirmou a eleição de Bolsonaro. A partir da diplomação, os partidos políticos e o Ministério Público terão 15 dias para contestar o mandato na Justiça Eleitoral, se acharem que houve alguma ilegalidade na disputa. Aposse está marcada para 1º de janeiro.

— A construção de uma nação mais justa e desenvolvida requer uma ruptura com práticas que, historicamente, retardaram o nosso progresso. Não mais a corrupção, não mais a violência, não mais as mentiras, não mais manipulação ideológica, não mais submissão do nosso destino a interesses alheios—declarou Bolsonaro, que reafirmou o compromisso comovo to popular, classificado por ele como “irreversível” e “inquebrantável”.

O recado de Rosa

Sem fazer referência à imprensa, Bolsonaro ressaltou que a tecnologia permite hoje que governantes se comuniquem com a população sem intermediários:

— O poder popular não precisa mais de intermediação. As novas tecnologias permitiram uma relação direta entre eleitor e seus representantes. Nesse novo ambiente, a crença na liberdade é a melhor garantia de respeito dos ideais que balizam a nossa Constituição.

Rosa Weber fez um discurso forte em defesa dos direitos humanos e da democracia, ressaltando que não se pode “suprimir ou abafar a opinião de grupos minoritários”.

— A democracia, não nos esqueçamos, repele a noção autoritária do pensamento único. É da essência mesma do regime democrático a convivência de opostos — afirmou, completando: — A democracia não se resume a escolhas periódicas, por voto secreto e livre, de governantes. Democracia é, também, exercício constante de diálogo e de tolerância, de mútua compreensão das diferenças, de sopesamento pacífico de ideias distintas, até mesmo antagônicas, sem que a vontade da maioria, cuja legitimidade não se contesta, busque suprimir ou abafar a opinião dos grupos minoritários, muito menos tolher ou comprometer-lhes os direitos constitucionalmente assegurados —concluiu.

Rosa Weber ressaltou que, na democracia, maioria e minoria devem conviver “como protagonistas do processo decisório”:

— A todos os cidadãos, sem qualquer exclusão, se assegura um núcleo essencial de direitos e garantias que não podem ser transgredidos nem ignorados.

Pela primeira vez, Bolsonaro disse que será o governante de todos os brasileiros e pediu o apoio de opositores na construção de um futuro melhor.

—Agradeço muito especialmente aos mais de 57 milhões de brasileiros que me honraram com seu voto. Aos que não me apoiaram, peço sua confiança para construirmos juntos um futuro melhor para o nosso país. A partir de 1º de janeiro, serei o presidente dos 210 milhões de brasileiros. Governarei em benefício de todos, sem distinção de origem racial, raça, sexo, cor, idade ou religião — disse o presidente da República eleito.

Quando entrou no plenário do TSE, Bolsonaro foi efusivamente aplaudido. Em retribuição, fez sinal de continência para a plateia. Depois, a banda dos Fuzileiros Navais de Brasília executou o Hino Nacional, que o futuro presidente acompanhou com a mão no peito. Quando recebeu o diploma eleitoral, Bolsonaro puxou Rosa Weber para posar para as fotos com ele, em um gesto que rompeu o protocolo da cerimônia.

_________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Aliados criticam 'tom' da presidente do TSE sobre direitos humanos

Daniel Gullino

Jussara Soares

11/12/2018

 

 

Aliados do presidente eleito, Jair Bolsonaro, criticaram ontem o discurso da presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Rosa Weber, em defesa dos direitos humanos, durante a cerimônia de diplomação.

Em sua fala, a presidente da Justiça Eleitoral lembrou os 70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, completados ontem, e disse que refletir sobre o tema é uma necessidade de todos:

— Em um país de tantas desigualdades como o nosso, refletir sobre a Declaração de Direitos Humanos não é mero exercício teórico, mas uma necessidade a que todos se impõe, governantes e governados.

Os deputados eleitos Carla Zambelli (PSL-SP), Beatriz Kicis (PRP-DF), Joice Hasselmann (PSL-SP) e Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PSL-SP) usaram o Twitter para criticar a ministra. Joice afirmou que Bolsonaro fez um discurso “simples, de união, e de agradecimentos”, ao contrário da presidente do TSE, que teria realizado “uma longa aula de direitos humanos fora de tom”.

Carla Zambelli destacou que a fala da ministra foi quatro vezes mais longa que a do presidente eleito. Beatriz considerou que Rosa submeteu Bolsonaro a uma “aulinha de direitos humanos”. Luiz Philippe de Orleans e Bragança disse que o discurso foi “inadequado”. O deputado Major Olímpio (PSL-SP) ironizou a fala: “Há os discursos bons e os discursos longos”.

A diplomação de Bolsonaro também serviu para que o futuro ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gustavo Bebianno, reclamasse das brigas no PSL e de ataques de Carlos Bolsonaro, filho do presidente, ao deputado eleito Julian Lemos.

— Acho que roupa suja se lava em casa. Acho que nada disso tem que ser exposto. Julian Lemos é um deputado eleito. Merecidamente eleito. Trabalhou muito pela campanha, muito mais pela campanha presidencial do que pela própria eleição. A eleição dele foi uma consequência. É um aliado muito forte, leal. A gente não sabe o dia de amanhã. Você não atira em aliado, não abate um soldado. Acho isso uma incoerência — afirmou Bebianno.

________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

'Eu sempre canto o hino olhando para a bandeira

Marlen Couto

Carolina Brígido

11/12/2018

 

 

Ministro Admar Gonzaga causa estranheza ao ficar de costas para a plateia

Na cerimônia de entrega do diploma eleitoral ao presidente eleito, Jair Bolsonaro, ontem, o ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Admar Gonzaga preferiu ficar de costas para a plateia formada por 700 autoridades e convidados, quando foi anunciado que seria executado o hino nacional brasileiro.

Admar voltou-se para a bandeira nacional, hasteada no plenário do tribunal, assim que o hino começou a tocar. O gesto solitário logo fez o ministro ficar entre os assuntos mais comentados nas redes sociais. Ao GLOBO, Admar explicou por que decidiu virar:

—Eu sempre canto o hino olhando para a bandeira. Aprendi nas aulas de educação moral e cívica no Colégio Santo Inácio e na Escola Alferes Tiradentes, em Florianópolis, onde sempre cantávamos o hino nacional antes de entrar em sala —disse o ministro.

O cerimonialista e presidente do Comitê Nacional do Cerimonial Público, (CNCP) Silvio Lobo Filho, afirma que se voltar para a bandeira no contexto da diplomação fere a Lei 5.700, de 1971, que regula a forma e a apresentação de símbolos nacionais. Ele explica que, durante cerimônias cívicas em geral, como a diplomação, não se oferece continência à bandeira, portanto, as autoridades que compõem a mesa não devem se voltar para sua direção, já que não é esse o símbolo que se está cultuando e, sim, o próprio hino:

—Somente é possível a execução do hino nacional diante da bandeira, quando ela estiver sendo hasteada. Em ambientes fechados em que não há hasteamento da bandeira não se volta a celebração para ela e, sim, ao hino nacional. Um símbolo não tem supremacia sobre o outro, tem igualdade.