O globo, n. 31174, 13/12/2018. País, p. 5

 

Aécio recicla o discurso do PT

Bernardo Mello Franco

13/12/2018

 

 

‘O Brasil acordou perplexo com as mais graves denúncias de corrupção da nossa história recente”. Às vésperas da eleição de 2014, Aécio Neves comentava o depoimento de Paulo Roberto Costa à Lava-Jato. Para o tucano, a delação do ex-diretor da Petrobras valia como prova cabal contra a adversária.

“As denúncias do senhor Paulo Roberto mostram que a Petrobras vem sendo assaltada ao longo dos últimos anos por um grupo político, comandado pelo PT, com o objetivo de perpetuar-se no poder”, sentenciou, no dia seguinte.

Os petistas ficaram furiosos. Rui Falcão acusou o rival de “agressão rasteira” e tentou desqualificar o delator. “Aécio faz coro a denúncias sem provas veiculadas pela imprensa a partir de um processo de delação premiada, que, em si, já carrega toda a suspeição comum a esses procedimentos”, afirmou.

A vitória de Dilma Rousseff não interrompeu o bate-boca. Em dezembro de 2014, o PSDB pediu à Justiça Eleitoral para cassar a chapa petista e entregar a faixa presidencial a Aécio. O principal argumento do partido era a palavra de Paulo Roberto.

“A campanha eleitoral de 2010 da requerida Dilma Rousseff foi financiada, em parte, por dinheiro oriundo da corrupção da Petrobras. Esta afirmação foi feita peremptoriamente por Paulo Roberto Costa em depoimento prestado à Justiça Federal”, afirmaram os seis advogados do PSDB.

O tempo passou, Dilma foi derrubada e Aécio entrou na mira da Lava-Jato. Nesta terça, a PF fez buscas em dois apartamentos do tucano. Seria exagero dizer que “o Brasil acordou perplexo”, já que não é a primeira vez que ele recebe a visita da polícia. Desta vez, é suspeito de receber R$ 128 milhões da JBS.

Ao passar de acusador a acusado, Aécio decidiu reciclar o discurso do PT. “O que existe hoje é um roteiro assinado, comandado e coordenado pelo senhor Joesley Batista”, lamuriou-se ontem, da tribuna do Senado. Ele também acusou o delator de mentir à Justiça para se livrar da cadeia. “Repilo as acusações infames de que tenho sido vítima”, arrematou.

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Na Alerj, 75 com movimentação suspeita, diz Coaf

Juliana Dal Piva

Juliana Castro

13/12/2018

 

 

Transações financeiras envolvem funcionários de ao menos 20 deputados estaduais de 14 diferentes partidos; um deles é Fabrício de Queiroz, que trabalhava no gabinete de Flávio Bolsonaro, filho do presidente eleito

O relatório produzido pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf ) sobre as transferências de recursos a assessores e ex-assessores de deputados estaduais identificou, ao todo, 75 pessoas com “movimentação financeira suspeita registrada em contas de suas titularidades”.

Essas transações envolvem funcionários e ex-funcionários de ao menos 20 deputados com mandato na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) e que integram 14 partidos de diferentes matizes ideológicas. As transações também foram feitas entre esses assessores e seus parentes.

No documento do Coaf está descrito ainda que, “ademais, foram citados neste relatório outros 470 servidores e ex-servidores da Alerj na condição de remetentes ou destinatários de recursos”. O Coaf finalizou o documento em 3 de janeiro deste ano e avaliou as transações financeiras feitas de janeiro de 2016 a janeiro de 2017.

Um dos 75 listados é Fabrício de Queiroz, ex-assessor do deputado estadual e senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL). No documento, foi apontado que ele fez movimentação financeira atípica de R$ 1,2 milhão entre 2016 e 2017. Uma das transações citadas é um cheque de R$ 24 mil destinado à futura primeira-dama, Michelle. O presidente eleito Jair Bolsonaro afirmou tratar-se do pagamento de parte de uma dívida de R$ 40 mil.

No topo da lista

Além de Queiroz, outros funcionários de outros deputados foram alvo do Coaf. Alguns dos que movimentaram de forma atípica os maiores valores estão ou estavam lotados no gabinete do deputado estadual André Ceciliano (PT), que preside a Alerj atualmente. O total movimentado no período foi de R$ 49,3 milhões.

Em seguida, estão funcionários e ex-funcionários do gabinete do deputado Paulo Ramos (PDT), que movimentaram R$ 30,3 milhões no período.

De modo geral, o Coaf encontrou “fluxo atípico, tanto a crédito como a débito”. No relatório, assinala-se que em “uma parte dos analisados, os créditos recebidos de outros servidores por meio de transferências e/ou recebidos por meio de depósitos em espécie, por vezes, superou o montante recebido a título de salários”. O relatório deu entrada nos autos do Ministério Público Federal em 9 de janeiro de 2018. A movimentação atípica não configura um ilícito por si só.

Procurado, Ceciliano disse que duas assessoras que aparecem no relatório do Coaf ainda trabalham com ele e “são funcionárias dedicadas à função que exercem”. Um outro exerceu função de assessor parlamentar no gabinete entre 2011 e 2012. Um último citado é pai de uma assessora, mas nunca pertenceu aos quadros do gabinete, nem aos da Alerj.

Paulo Ramos afirmou que “pessoas de bem têm as suas vidas pessoais e profissionais ilegalmente devassadas simplesmente porque são assessores parlamentares. É o caso dos advogados do meu gabinete”. Mas Ramos também afirmou que há nomes citados no relatório que nunca pertenceram a seu gabinete.