Correio braziliense, n. 20223, 03/10/2018. Brasil, p. 7

 

A pauta política da agenda climática

Paloma Oliveto

03/10/2018

 

 

Levantamento feito pelo Correio mostra que nem todos os candidatos ao Palácio do Planalto escolheram as mudanças climáticas como prioridade nos planos de governo. Especialistas alertam para a importância do tema

A próxima pessoa a ocupar o gabinete da Presidência do Palácio do Planalto terá o desafio de mostrar ao mundo as contribuições do Brasil com a agenda do clima. Em 2020, todos os signatários do Acordo de Paris, assinado em 2015 e promulgado pelo presidente Michel Temer no ano passado, precisam colocar em prática as metas assumidas, com objetivo de reduzir o aquecimento do planeta. Além disso, devem divulgar o plano de desenvolvimento de longo prazo para garantir que, até o fim do século, a temperatura no globo aumente, no máximo, 2ºC e, preferencialmente, 1,5ºC.

Levantamento feito pelo Correio mostra, porém, que nem todos os presidenciáveis elegeram as mudanças climáticas como prioridade nos planos de governo. Enquanto alguns documentos, como o apresentado pela ex-ministra do meio ambiente Marina Silva (Rede), contemplam ações diretas e indiretas de enfrentamento ao problema, outros não citam o aquecimento do planeta nem trazem propostas para combatê-lo ou mitigá-lo. É o caso de Jair Bolsonaro (PSL), cuja única referência ambiental é a possibilidade de explorar “fontes de energia renovável, solar e eólica” no Nordeste. O candidato, inclusive, já sinalizou que, se eleito, poderá retirar o Brasil do acordo internacional, assinado por 195 países.

“Isso não faz o menor sentido”, diz Carlos Rittl, secretário executivo da coalizão Observatório do Clima. “Quando o (Donald) Trump tira os Estados Unidos do acordo, ele faz isso visando atender aos interesses de quem o apoiou na campanha: o setor de carvão e de combustíveis fósseis. Para o Brasil, o acordo é uma oportunidade de crescimento e desenvolvimento com mais qualidade. Ameaçar retirá-lo não seria ruim para o clima, seria péssimo para a própria economia”, argumenta.

Na avaliação de Raquel Biderman, diretora-executiva do instituto WRI Brasil e vice-presidente do Conselho do WWF Brasil, o capitão da reserva é o único candidato que não compreendeu o significado do documento assinado pelo país na Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC) em 2015. “Combater a mudança climática não é uma escolha. Não se trata de uma questão de ambientalistas, mas da sobrevivência da economia. Retirar o país da plataforma é suicídio.”

 

Compromissos

Para Carlos Rittl, além do plano de Marina Silva, apenas os de Fernando Haddad (PT) e o de Guilherme Boulos (Psol) trazem discussões mais substanciais sobre as mudanças climáticas. “São os que têm agenda climática com compromissos objetivos. Os de Ciro (Gomes, do PTB), (Henrique) Meirelles (MDB), (João) Amoêdo (Novo) fazem referências mais genéricas, e o de (Geraldo) Alckmin (PSDB) é superficial”, cita. O plano de Haddad, segundo colocado nas pesquisas de intenção de voto, fala em “transição ecológica para a nova sociedade do século 21”, usando a mesma expressão contida no documento divulgado pela campanha de Luís Inácio Lula da Silva, quando o PT acreditava que o ex-presidente tinha chances de concorrer ao pleito de 2018.

Mais detalhado que o de Lula, o planejamento de Haddad propõe a “Reforma Fiscal Verde”, que cria um tributo sobre emissões de carbono, apresenta a meta de zerar as emissões de gases de efeito estufa da matriz elétrica até 2050 e afirma que a produção agroecológica de baixa emissão deve ser prioridade. O presidenciável também promete mudanças no crédito rural, incluindo o financiamento integral do Plano Safra para a agricultura de baixo carbono até 2030.

 

Mudanças climáticas na pauta dos presidenciáveis

Veja o que dizem os programas de governo de sete candidatos:

 

Alvaro Dias (Podemos)

»  O candidato, que já foi do Partido Verde, se compromete com “preservação e aproveitamento integral dos biomas nacionais”, “replantio de matas em 3,5 mil municípios” e com “créditos para a descarbonização”. Não traz ações detalhadas.

 

Ciro Gomes (PDT)

»  Sem detalhar, diz que lançará um pacote de investimentos para “energia elétrica e demais energias renováveis, como eólica, solar e biomassa, entre outras opções”.

»  Traz um capítulo sobre meio ambiente, incluindo cinco ações que visam “implementar as metas climáticas, de redução da emissão dos gases de estufa, até 2020 (definidas pelo Acordo de Paris)”. Entre elas, sobretaxar quem polui e criar mecanismos de compensação financeira para atividades impactantes.

 

Fernando Haddad (PT)

»  Afirma que a economia de baixo carbono é estratégica do plano de governo, promete “mudança na matriz produtiva liderada pela adoção de tecnologias verdes modernas, flexíveis e inteligente”.

»  Propõe a criação da Reforma Fiscal Verde, que incluirá a desoneração de tributos sobre investimentos verdes, reduzindo o custo tributário de investimentos de baixo carbono em 46,5%. Também promete criar um tributo sobre o carbono.

»  Promete zerar as emissões de gases de efeito estufa da matriz elétrica até 2050. “Também será perseguida a meta de instalar kits fotovoltaicos em 500 mil residências por ano”, diz.

»  Propõe a criação de um novo marco regulatório da mineração, “prevendo medidas para que a atividade mineradora produza com maior valor agregado e responsabilidade social e ambiental”.

 

Geraldo Alckmin (PSDB)

»  No capítulo de “Cidades Sustentáveis”, promete implementar “sistemas de transporte de qualidade, priorizando as energias renováveis”.

»  No tema “Meio Ambiente”, há 31 diretrizes, incluindo o “o cumprimento dos compromissos internacionais do Brasil ligados ao clima e à biodiversidade”; “implementar e monitorar a Política Nacional de Mudanças Climáticas”, “estimular a transição para uma economia de baixo carbono com a adoção de medidas voltadas à redução do desmatamento”; “implementar o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE)”; “eliminar, em curto espaço de tempo, o desmatamento ilegal”, e “promover e implementar o RenovaBio”.

 

Henrique Meirelles (MDB)

»  O economista se compromete a “seguir os objetivos do Acordo de Paris, elevando a participação de bioenergia sustentável na sua matriz energética, incentivando o reflorestamento e estimulando o investimento em energias renováveis”.

 

Jair Bolsonaro (PSL)

»  No capítulo de “Inovação, ciência e tecnologia”, diz que “o Nordeste tem grande potencial de desenvolver fontes de energia renovável, solar e eólica”.

 

João Amoêdo (Novo)

»  O empresário cita uma vez no programa as mudanças climáticas e apresenta, sem detalhamento, sete propostas para sustentabilidade, incluindo o fim do subsídio a fontes energéticas não renováveis, a ampliação da energia renovável na matriz energética do país e o combate ao desmatamento ilegal na Amazônia.

 

Marina Silva (Rede)

»  O tema mudanças climáticas é transversal no programa de governo. A candidata se compromete a promover “um desenvolvimento urbano que inclua a redução de emissão de gases de efeito estufa entre as suas prioridades”, desenvolver políticas de mobilidade que estimule os modais “com baixa emissão de poluentes, geração de energia limpa, renovável e distribuída e com eficiência energética, substituição de veículos movidos a combustíveis fósseis pelos elétricos e movidos a biocombustíveis e valorização de áreas verdes”. Também afirma que apoiará a implementação municipal de planos de monitoramento de extremos climáticos e prevenção e mitigação de impactos dos desastres naturais.

»  A presidenciável diz que vai “consolidar uma matriz elétrica sustentável que incorpore suas externalidades e produza o menor custo de investimento e de operação possível”.