O Estado de São Paulo, n. 45706, 07/12/2018. Política, p. A4

 

Lula megociou propina para filho, diz Palocci

Teo Cury

07/12/2018

 

 

 Recorte capturado

Zelotes. Ex-ministro depôs como testemunha em ação penal na qual o ex-presidente é réu sob a acusação de beneficiar montadoras com prorrogação de medida provisória

Delator. Palocci foi para prisão domiciliar após fechar acordo de delação premiada com a PF

Em depoimento à Justiça Federal no Distrito Federal, o ex-ministro Antonio Palocci disse ontem que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) negociou com o lobista do setor automobilístico Mauro Marcondes Machado pagamentos a Luís Cláudio Lula da Silva, seu filho caçula. Os repasses, afirmou o ministro, seriam contrapartida à aprovação de uma medida provisória que tinha como finalidade prorrogar incentivos fiscais de montadoras instaladas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. O caso foi revelado pelo Estado em outubro de 2015.

Ao juiz Ricardo Augusto Soares Leite, Palocci afirmou que entre o final de 2013 e o início de 2014 o filho caçula de Lula o procurou na sede de sua consultoria, em São Paulo, para pedir contribuições a seu projeto de esportes – implantar a liga de futebol americano no Brasil. “Ele disse que precisava para o evento ‘Touchdown’, que ele lidera, para fechar entre R$ 2 milhões e R$ 3 milhões e que eu ajudasse com recursos via empresas conhecidas, porque eu conhecia muitas”, disse.

O ex-ministro relatou que consultou Lula – atualmente preso e condenado na Lava Jato – “para saber se ele me autorizava a fazer isso.” Segundo Palocci, o ex-presidente disse que ele não precisaria atender ao pedido de seu filho “porque tinha resolvido o problema com Mauro Marcondes”. “Ele me falou que empresas iriam pagar Mauro Marcondes porque ele já prestava serviços a elas, e prestou nesta ocasião também, porque iam pagar quantia entre R$ 2 e R$ 3 milhões, e que o Mauro ia repassar recursos ao Luís Cláudio”, afirmou Palocci.

De acordo com o ex-ministro, Lula disse que tinha confiança em Marcondes e que o conhecia desde que era sindicalista no ABC e ele era atuante na área empresarial. “Me disse isso porque fiquei espantado com a forma como o ex-presidente teria interferido na MP de forma tão explícita”.

Palocci foi ouvido na condição de testemunha de acusação no processo em que Lula é acusado de corrupção por, segundo o Ministério Público Federal, ter recebido propina para editar a Medida Provisória 471. A MP, investigada na Operação Zelotes, foi aprovada em 2009. Além de Lula e do filho, o ex-ministro Gilberto Carvalho e outros quatro são réus.

Segundo o MPF, a empresa Marcondes e Mautoni Empreendimentos, representante dos interesses da CAOA (Hyundai) e da MMC Automotores (Mitsubishi do Brasil), teria ofertado R$ 6 milhões a Lula e Carvalho. O dinheiro seria, segundo os investigadores, para financiar campanhas do PT.

O depoimento de Palocci é o primeiro concedido após sua passagem para a prisão semiaberta domiciliar, na quinta-feira passada. Por causa disso, ele foi feito por meio de videoconferência em São Paulo.

FHC. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) também prestou depoimento por videoconferência no mesmo processo, como testemunha pela defesa de Mauro Marcondes. FHC relatou a pressão de regiões, parlamentares e setores da sociedade para que medidas provisórias sejam aprovadas. “Eventualmente o presidente ouve alguma demanda. A função do presidente é separar o que é bom do que é ruim para o País, o que é interesse nacional e o que não é.”