O globo, n. 31146, 15/11/2018. Economia, p. 15

 

Em troca de apoio

Manoel Ventura

Amanda Almeida

Robson Bonin

15/11/2018

 

 

Guedes propõe dividir receita de megaleilão

Em seu primeiro encontro com os novos governadores, o presidente eleito, Jair Bolsonaro, e seu futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, fizeram um gesto de aproximação e prometeram dividir com estados e municípios parte da arrecadação que será obtida com um megaleilão do pré-sal. Em troca, pediram apoio para aprovar reformas como a da Previdência, mas não exigiram diretamente o cumprimento de medidas de ajuste fiscal pelos governos. Para Bolsonaro, o Brasil precisa aprovar medidas “amargas” para não ficar como a Grécia.

O leilão do pré-sal pode render R$ 100 bilhões aos cofres públicos. Porém, a licitação depende de um acordo entre União e Petrobras e da aprovação de um projeto de lei no Congresso. E, embora o montante previsto seja elevado, parte dele, R$ 30 bilhões, deve ir para as mãos da Petrobras. Além disso, Guedes precisará desse dinheiro para reduzir o rombo das contas do governo federal. Mesmo assim, ele abriu as portas para governadores e prefeitos:

—Está todo mundo apertado junto. Se arrecadar esses R$ 100 bilhões, eu vou pegar isso aí, e a gente pode passar para estados e municípios, para todo mundo pelo princípio do pacto federativo. Agora, o que não pode é atrapalhar a tramitação. Se for mudar, enfiar uma emenda lá, aí já atrasa — afirmou Guedes aos governadores.

Essa é uma sinalização da estratégia que Guedes pretende colocar em prática na relação do governo Bolsonaro com o Congresso. A ideia é negociar as pautas de interesse do governo no Legislativo prioritariamente com os governadores e não com os parlamentares.

— Querem ajuste (tributário) mais rápido? Participem da reforma previdenciária conosco. Façam um sacrifício —disse Guedes.

Em discurso, ele afirmou que “o modelo econômico perverso corrompeu aclasse política ”, que não teria margem para atuar coma maior parte do dinheiro já comprometido. E pediu apoio dos governadores a reformas:

—Se aclasse política fizera reforma aceleradamente, o recurso é descentralizado aceleradamente. Se fizer devagar,é descentralizado devagar.

O futuro ministro disse aos governadores que o projeto que viabiliza o leilão precisa ser aprovado rapidamente. A própria divisão dos recursos com estados e municípios poderia constar no projeto, desde que não atrapalhe o andamento da proposta. O presidente do Senado, Eunício Oliveira, disse que vai estudar com técnicos do Congresso como viabilizar a partilha no texto sem que o projeto precise ser novamente analisado pela Câmara, onde já foi aprovado.

Como o projeto só trata da medição e da forma de venda do petróleo, Guedes poderá seguir dois outros caminhos: editar uma medida provisória que permita o repasse via fundos de participação ou fazer por meio de convênios.

Divergência sobre reforma

O projeto facilita o fechamento de uma renegociação entre União e Petrobras em torno do contrato da cessão onerosa (acordo pelo qual a estatal obteve o direito de explorar 5 bilhões de barris da camada présal). Como esses campos têm mais petróleo do que o previsto, depois que o contrato for renegociado, o governo poderá leiloar o excedente.

Ao abrir a reunião com governadores, Bolsonaro defendeu a necessidade de reformas e disse que algumas medidas a serem tomadas são “amargas”:

— Queremos que todos se tornem responsáveis pelo futuro da nação. As principais reformas passam pela Câmara e pelo Senado. As pessoas têm a perfeita noção do que tem de ser feito. Algumas medidas são um pouco amargas. Mas não podemos tangenciar com a possibilidade de nos transformarmos naquilo que a Grécia passou, por exemplo.

Os governadores chegaram ao encontro com Guedes e Bolso na roco ma expectativa de receber ajudada União para solucionara situação dos estados, que passam por grave crise financeira. Segundo documento divulga doesta semana pelo Tesouro Nacional ,14 estados apresentam comprometimento de receitas com despesas de pessoal acimado limite de 60% previsto na Leide Responsabilidade Fiscal.

O governador eleito de São Paulo, João Do ria( PSD B ), disseque o grupo vai apoiara reforma. Já o governador eleito do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), fez ressalvas e afirmou que parte dos governadores defende “alterações” no que vem sendo negociado. Entre os pontos, está a diferenciação de tratamento entre trabalhadores rurais e urbanos e entre homens e mulheres:

— Há consenso sobre a necessidade da reforma, mas é necessário que direitos, principalmente os sociais, sejam garantidos para não penalizar as pessoas mais carentes.

O governador do Piauí, Wellington Dias (PT), defendeu ser preciso encontrar uma alternativa que ajuste as contas e respeite direitos:

—Não é razoável que se trabalhe com medidas que tenham impacto mais forte sob reos mais pobres. É preciso chegar no que é privilégio.

“Se arrecadar esses R$ 100 bilhões, eu vou pegar isso aí, e a gente pode passar para estados e municípios. Agora, o que não pode é atrapalhar a tramitação”

Paulo Guedes, futuro ministro da Economia

“As pessoas têm a noção do que tem de ser feito. Algumas medidas são um pouco amargas. Mas não podemos tangenciar a possibilidade de nos transformarmos naquilo que a Grécia passou”

Jair Bolsonaro, presidente eleito

Opinião do GLOBO - Fim de festa

Dados da Secretaria do Tesouro, portanto sem maquiagens, sobre as finanças dos estados dão a dimensão das pressões que Bolsonaro enfrentará da maioria dos governadores. Afinal, por incúria dos próprios governos, 14 estados apresentam um comprometimento das receitas com salários e benefícios muito acima do limite da Lei de Responsabilidade Fiscal, que é de 60%. Apenas o Espírito Santos tem as finanças equilibradas.

Como o próximo presidente garante, com razão, que não há condições de a União socorrer a Federação —Dilma já o fez, e de nada adiantou —, governadores que assumem no dia 1º de janeiro devem se preparar para, afinal, fazerem mesmo o dever de casa.

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Congresso vai acelerar votação de projeto do pré-sal.

Geralda Doca

15/11/2018

 

 

Em jantar de Guedes com presidentes da Câmara e do Senado, ficou definido que tramitação será rápida, só depende de quórum

Um projeto de lei que abre caminho para a realização de um megaleilão de petróleo do pré-sal foi o principal prato do cardápio de um jantar na terça-feira entre o presidente do Senado, Eunício Oliveira, representantes da atual equipe econômica e o ministro da Economia do novo governo, Paulo Guedes. Os recursos estimados com o leilão, de mais de R$ 100 bilhões, vão ajudar a reduzir o rombo das contas públicas. E devem ser partilhados com estados e municípios, conforme a promessa de Guedes aos governadores.

O projeto facilita o fechamento de renegociação entre União e Petrobras em torno da revisão de contrato que abre espaço para a realização do leilão.

Até agora, porém, não havia articulação da equipe do presidente eleito, Jair Bolsonaro, para aprovar o projeto, que passou pela Câmara e está pronto para ser incluído na pauta do plenário do Senado.

O jantar, mediado pelo atual ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, foi uma forma de resolver o mal estar entre a equipe do novo governo e o Congresso, após uma sucessão de embates. Primeiro, Guedes mandou dar uma “prensa” nos parlamentares para aprovar projetos de interesse do governo. Depois, Bolsonaro cancelou sem explicações uma reunião com Eunício. A aprovação do aumento dos ministros do Supremo Tribunal Federal pelo Senado e declarações de Eunício de que não se importava com o novo governo teriam sido o motivo, segundo auxiliares do presidente eleito.

Segundo interlocutores do presidente do Senado, o jantar foi amistoso e Guedes foi “simpático e cordial”. O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, participou do evento. Ficou acertado que o projeto poderia ser colocado em votação o mais rápido possível, até na semana que vem. Mas dependerá de quórum.

—Esse projeto é muito importante para o futuro governo porque vai ajudar no ajuste fiscal. Por isso, tem que ter quórum. Não dá para arriscar — afirmou o senador Romero Jucá (MDB-RR).

A equipe de Bolsonaro espera usar R$ 60 bilhões dos recursos do megaleilão para abater o déficit primário previsto para 2019, de R$ 139 bilhões.