O globo, n. 31141, 10/11/2018. País, p. 4

 

De volta para a cadeia

Mateus Coutinho

Tiago Dantas

10/11/2018

 

 

Joesley é acusado de omitir informações da corrupção no Ministério da Agricultura

Protagonista da crise que quase custou o cargo ao presidente Michel Temer, o empresário Joesley Batista voltou a ser preso ontem numa nova operação da Polícia Federal. Desta vez, Batista, e os delatores da J&F Ricardo Saud e Florisvaldo Caetano de Oliveira, este último o “homem da mala" da empresa, são acusados de envolvimento num esquema de corrupção no Ministério da Agricultura. A investigação comparou informações das delações premiadas do doleiro Lúcio Funaro e do próprio dono da J&F. Segundo a PF, omissões propositais dos delatores da empresa teriam comprometido as vantagens judiciais obtidas por Joesley e Saud, alvos de mandados de prisão ontem.

No total, a Justiça autorizou a prisão temporária de 16 pessoas, incluindo o exministro da Agricultura e o atual vice-governador de Minas Gerais, Antonio Andrade (MDB). Também alvo da operação e preso ontem, o advogado Mateus de Moura Lima Gomes, tentou se desfazer de R$ 3 mil em dinheiro que tinha em casa, jogando as notas no vaso sanitário. Segundo a Polícia Federal, o dinheiro foi descartado quando agentes entraram na casado advogado, em Nova Lima na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Responsável pela chamada Operação Capitu, o delegado Marcelo Veloso disse que os delatores “mentiram e omitiram em alguns pontos” envolvendo o episódio do pagamento de propina no âmbito da pasta da Agricultura e, por isso, teria ficado caracterizado a obstrução de Justiça. Os investigadores também revelaram, durante a entrevista, que uma rede de supermercados de Minas Gerais atuou para ajudar a operacionalizar a entrega de propina aos envolvidos, tendo repassado dinheiro em caixas, mala e até caixa de sabão. Uma operação de 2015 captou conversas dos executivos da J&F naquele ano, falando sobre a destruição de documentos da mesa ocupada por Saud. Em outra gravação, o executivo aparece falando com o então ministro da Agricultura, Neri Geller, Nela, Saud diz a Geller que estava preocupado coma possibilidade de ogovenrov ira liberar o us ode um veneno delonga duração, a Ivermectina. A proibição dou sodo produto era de interesse da J&F para evitar prejuízos às exportações da empresa. Em alguns países, a substância pode ser detectada em exames de inspeção sanitária e isso poderia impedira exportação de carne pela J& F.

Delação de Funaro

Em sua delação premiada, o lobista Lúcio Funaro, que operava para o Grupo JBS, do grupo J&F, afirma que a empresa teria pago R$ 2 milhões para conseguir a regulamentação da exportação de miúdos e despojos bovinos, além de R$ 5 milhões para aprovar a proibição do uso da ivermectina. Na versão do delator, o dinheiro foi repartido entre políticos e um funcionário da pasta indicado pelo ex-deputado Eduardo Cunha (MDB), atualmente preso e condenado na Lava-Jato. Para a desembargadora federal Mônica Sifuentes, que determinou as prisões, os fatos trazidos pela investigação policial apontam que os delatores estão “direcionando a atividade policial e investigatória para aquilo que lhes interessa revelar, ocultando fatos relevantes para o esclarecimento da atividade criminosa que se instalou no âmbito da administração federal".

— A Polícia Federal descobriu omissões intencionais e contradições graves que colocam em xeque a credibilidade da colaboração, isso caracterizou obstrução de justiça e prejuízo à instrução criminal do inquérito policial instaurado —afirmou o delegado Mário Veloso. — Mentiram e omitiram em alguns pontos. Por meio de nota, a defesa de Joesley afirmou que seu cliente é colaborador e que vem exercendo “à risca" essa função, tendo prestado mais de um depoimento no âmbito dessa investigação. A defesa diz acreditar que Joesley e outras pessoas ligadas a ele terão a prisão revista pela Justiça. A defesa de Antônio Andrade informou que se pronunciaria após tomar conhecimento sobre os detalhes do inquérito.

“A Polícia Federal descobriu omissões intencionais e contradições graves que colocam em xeque a credibilidade da colaboração, isso caracterizou obstrução de Justiça e prejuízo à instrução criminal do inquérito policial”

Mônica Sifuentes, desembargadora federal

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Discussão com Cunha sobre propina quase teve briga

Tiago Aguiar

10/11/2018

 

 

Clima com Joesley esquentou depois que ex-deputado, preso em 2016, afirmou que não poderia atender pleito de empresário

Uma das negociações de propina citadas na operação Capitu, da Polícia Federal (PF), quase terminou em briga entre Joesley Batista e o ex-deputado federal Eduardo Cunha (MDB). Os dois só não chegaram às vias de fato porque o ex-ministro da Agricultura e vice-governador de Minas Gerais, Antonio Andrade interveio. Andrade e Joesley foram presos na manhã de ontem. Cunha está na cadeia desde 2016, Complexo Médico-Penal, em Pinhais.

A delação de Joesley narra uma reunião, em 2013, em que o empresário se dirige a Cunha “com aspereza” ao cobrar o pedido de federalização do sistema de inspeção de frigoríficos. O ex-deputado então disse, segundo Joesley, que as demandas eram “inviáveis” e que a dificuldade impedia a obtenção de propinas. O empresário afirma que reagiu igualmente exaltado, levantando-se e intimando o deputado. Andrade, que era ministro na época, teria se colocado entre os dois para evitar uma briga, segundo o relato.

Ainda conforme a delação, Joesley e Cunha entenderam-se “na sequência imediata”, e Joesley chegou a convidar Cunha para ir a sede da J&F “a fim de conversarem e comporem-se”. Segundo Joesley, entre todas as exigências feitas aos deputados e também a representantes do Ministério da Agricultura em troca de propina, esta não foi atendida. Os outros dois pedidos foram: a regulamentação da exportação de despojos e a proibição do uso da ivermectina de longa duração (droga antiparasita usada em carnes).