O globo, n. 31127, 27/10/2018. País, p. 4

 

Garantia de liberdade

André de Souza

Carolina Brígido

Mateus Coutinho

27/10/2018

 

 

TSE e STF reagem a ações de TREs em universidades

Os ministros Luís Roberto Barroso, Marco Aurélio Mello e Gilmar Mendes também se pronunciaram em defesa da liberdade. A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu ontem à noite ao STF uma liminar para restabelecer as liberdades de expressão, reunião e cátedra nas universidades públicas. Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e Tribunal Superior Eleitoral (TSE) reagiram ontem contra o que apontaram como abusos que podem ter ocorrido em ações policiais e de fiscalização da Justiça Eleitoral realizadas nos últimos dias em 20 universidades em todo o país a partir de decisões de juízes eleitorais. Em 12 estados, juízes de primeira instância determinaram a apreensão de materiais e proibiram manifestações consideradas políticas. Os presidentes do STF, Dias Toffoli, e do TSE, Rosa Weber, condenaram a interferência nas universidades. A justificativa para as decisões dos juízes eleitorais é de que repartição pública não pode ser usada para fazer ato de campanha. Mas, em vários casos, o material apreendido não fazia menção a candidatos. —A vedação dirige-se à propaganda eleitoral e não alcança, por certo, a liberdade de manifestação e de expressão, preceitos tão caros à democracia, assegurados pela Constituição da República de 1988 — disse Rosa, no começo da sessão de ontem no plenário do TSE, acrescentando que ali berda dedem a nifes tação“éumprincí pio a ser intransigentemente garantido ”. Em outra frente, a procuradora-geral da República, Raquel Dogde, pediu ontem à noite ao STF uma liminar“para restabelecera liberdade de expressão, a liberdade de reunião, tanto de estudantes quanto de professores, a liberdade de cátedra no ambiente das universidades públicas brasileiras”. Dodge requer o impedimento de qualquer decisão que determine o ingresso de agentes públicos em universidades públicas e privadas para“recolhimento de documentos,interrupção de aulas e debates, a atividade disciplinar docente e discente e acoleta irregular de depoimentos". As ações dos TREs em universidades ocorreram em estados como Rio , Amazonas, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Paraíba, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul e Santa Catarina.

"Incabível"

Em nota, Dias Toffoli afirmou que o STF “sempre defendeu a autonomia e a independência das universidades, bem como o livre exercício do pensar, da expressão e da manifestação pacífica. Essa liberdade é o pilar sobre o qual se apoia a própria noção de Estado Democrático de Direito”. O ministro ressaltou que, em julgamento, o tribunal já afirmou que “a Lei Fundamental do Brasil veicula o mais democrático e civilizado regime da livre e plena circulação de ideias e opiniões”. Rosa Weber disse que o TSE está adotando “todas as providências cabíveis” a fim de “coibir eventuais excessos no exercício do poder de polícia eleitoral no âmbito das universidades de diversos estados da federação”. Outros ministros do Supremo também se manifestaram. Marco Aurélio Mello considerou “incabível” interferência externa nos campi, e Gilmar Mendes pediu tolerância e defendeu cautela em ações nas universidades. Para Marco Aurélio, “a quadra é de extremos” e o Estado Democrático de Direito corre perigo: — Universidade é campo do saber. O saber pressupõe liberdade no pensar, liberdade de expressar ideias. Toda interferência é, de início, incabível. Falo de forma geral. Mas reconheço que a quadra é de extremos. Por isso é perigosa, em termos de Estado Democrático de Direito. O ministro Gilmar Mendes pediu tolerância e defendeu cautela em ações em universidades para coibir propaganda irregular. — Tem que verificar se alguma manifestação desborda daquilo que a lei prevê. Não vou fazer juízo sobre a situação completa — disse Gilmar. — É claro que na esfera pública não pode haver preferência para um ou outro candidato, mas é preciso ter cautela para que não caiamos em nenhum exagero. O ministro Luís Roberto Barroso declarou que “como penso a vida, a polícia, como regra, só deve entrar em uma universidade se for para estudar”, segundo registrou a “Folha de S. Paulo”. As ações também geraram reações do Ministério Público Federal (MPF), da Defensoria Pública da União (DPU) e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), do MPF também se manifestou contra os atos.

“O STF sempre defendeu a autonomia universidades, bem como o livre exercício do pensar e da expressão. Essa liberdade é o pilar sobre o qual se apoia a própria noção de Estado Democrático de Direito”

Dias Toffoli presidente , do STF

“O TSE adotará as providências cabíveis para coibir eventuais excessos no exercício do poder de polícia eleitoral no âmbito das universidades”

Rosa Weber, presidente do TSE

“É preciso ter cautela para que não caiamos em nenhum exagero.”

Gilmar Mendes, ministro do STF

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Estudantes fazem protesto no TRE do Rio

Helena Borges

Lucas Altino

27/10/2018

 

 

Presidente da Corte diz não poder interferir em decisões de juízes de 1º grau, mas que fiscais têm atuado ‘de forma democrática’

Estudantes das universidades públicas do Rio se reuniram ontem em frente ao prédio do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-RJ) num ato de protesto. Uma comissão de seis estudantes, além do diretor da Faculdade de Direito da Uerj, Ricardo Lodi, foi recebida pelo presidente do tribunal, desembargador Carlos Eduardo da Fonseca Passos. Os estudantes reclamaram do que consideraram excessos da Justiça Eleitoral. A eles, Fonseca Passos disse que não poderia interferir nas decisões de juízes de primeiro grau. O presidente do TRE-RJ orientou os que se sentiram ofendidos ou afrontados a recorrer à Justiça. Membro da Federação Nacional dos Estudantes de Direito, Felipe Cesar Santiago disse que os universitários querem ser o “símbolo do diálogo”.

—A reunião foi importante para mostrar que houve doses cavalares ditatoriais nas ações dos TREs. Atos que compõem um grande contexto de arbitrariedade. Foram pontuais, mas conversam entre si. Depois do encontro, os estudantes saíram em passeata por ruas do Centro do Rio, com faixas e cartazes em defesa da liberdade de expressão nas universidades. Os alunos argumentam que as ações de fiscais tiveram como alvo manifestações que não tinham cunho eleitoral, o que é proibido em repartições públicas. Após o encontro com os estudantes, o presidente do TRE-RJ afirmou que apoia “o princípio da liberdade de expressão, graças ao qual são possíveis, inclusive, manifestações como a realizada hoje em frente à nossa Corte”. Mais cedo, em outra nota, Fonseca Passos negou excessos por parte de fiscais do TRE-RJ. “As recentes ações de fiscais eleitorais no estado do Rio foram desdobramentos de decisões judiciais fundamentadas, a partir de denúncias oriundas de eleitores e da Procuradoria Regional Eleitoral. A fiscalização tem atuado em conformidade com as normas vigentes e de forma democrática”, afirmou. Ainda ontem, o desembargador Raphael Ferreira de Mattos, do TRE-RJ, concedeu mandado de segurança preventivo pedido por dez ex-alunos da Faculdade Nacional de Direito (FND-UFRJ) por causa de um episódio acontecido na quinta-feira no prédio da faculdade, no Centro. Na ocasião, fiscais do TRERJ, sem se identificar, mandaram retirar uma bandeira pendurada no prédio, com os dizeres “CACO pela democracia Ditadura nunca mais - 102 anos de resistência”. Os fiscais não possuíam mandado judicial. Ferreira de Mattos determinou que o Juiz da Fiscalização Eleitoral preste esclarecimentos sobre o ocorrido. Além das ações da Justiça Eleitoral em 20 universidades de 12 estados, foram registradas nos últimos dias atividades de restrição da liberdade de expressão em 14 campi em 11 estados que não foram praticadas por fiscais dos TREs. Os autores dessas ações foram policiais, pessoas que se passaram por fiscais de TREs, pessoas não identificadas ou seguranças das universidades.