O globo, n. 31083, 13/09/2018. Sociedade, p. 31

 

Igreja Católica alemã registrou 3.600 casos de assédio a crianças

13/09/2018

 

 

Em resposta às denúncias de abuso sexual reveladas em diversos países, Papa convoca reunião com bispos de todo o mundo para discutir proteção de menores

Um estudo sobre a Igreja Católica divulgado ontem por vários veículos de imprensa da Alemanha revela que milhares de crianças foram abusadas sexualmente por padres no país entre 1946 e 2014, com acusações de que a instituição destruiu ou manipulou inúmeros documentos ligados aos suspeitos e minimizou a seriedade e a extensão dos acontecimentos.

Lançado em 2014, o levantamento, que será apresentado no dia 25 na Conferência Episcopal Alemã, indica que pelo menos 3.677 crianças, a maioria meninos com menos de 13 anos, foram vítimas de abuso sexual por 1.670 clérigos. Apenas um terço dos suspeitos enfrentou julgamentos de acordo com a lei canônica, mas enfrentaram sanções “mínimas”, segundo o relatório.

Por três anos e meio, um grupo de pesquisadores das universidades de Mannheim, Heidelberg e Giessen examinou 38 mil dossiês e manuscritos de 27 dioceses alemãs divulgados pela Igreja. A equipe, porém, não teve acesso direto aos arquivos.

Segundo o relatório, os padres acusados eram frequentemente transferidos sem que se avisassem aos fiéis sobre o possível perigo que representavam às crianças em suas novas dioceses.

Durante vários anos, a Igreja Católica na Alemanha foi abalada pelas revelações do abuso sexual. Em nota, a Conferência dos Bispos do país afirmou estar ciente da extensão dos abusos sexuais apontadas pelo estudo: “Estamos chocados e envergonhados”.

O bispo Stephan Ackerman, representante da conferência, afirmou que o relatório trará “mais clareza e transparência sobre essa página obscura da História da Igreja”, mas se queixou do vazamento do documento à imprensa, “um duro golpe para as vítimas de abusos”. A Igreja alemã disponibilizou um telefone de atendimento para fiéis que sofreram assédio.

Reunião extraordinária

A Santa Sé anunciou ontem que o Papa Francisco convocou uma reunião no Vaticano de todos os presidentes das Conferências Episcopais para abordar a questão da “proteção de menores”. O encontro será realizado em fevereiro, segundo comunicado do “C9”, o conselho de cardeais que ajuda o Pontífice na reforma da Cúria.

Francisco enfrenta uma crise sem precedentes pelas contínuas revelações de escândalos de abusos sexuais em vários países, como Austrália, EUA e Chile. O monsenhor Carlo María Vigano, ex-embaixador da Santa Sé, chegou a pedir a renúncia do Papa em agosto, após acusá-lo de ter protegido durante cinco anos o cardeal americano Theodore McCarrick, suspeito de agressões sexuais contra seminaristas e clérigos. O Vaticano assegurou na segundafeira que publicará “esclarecimentos” sobre o caso.

A crise atingiu o próprio “C9”, onde o cardeal chileno Francisco Javier Errazuriz, de 85 anos, que foi acusado de ter ignorado as acusações das vítimas de pedofilia por sacerdotes em seu país. Já o australiano George Pell, de 77 anos, que também integra o grupo, enfrenta acusações judiciais por agressões sexuais contra crianças.