O globo, n. 31099, 29/09/2018. País, p. 8

 

Ao, TSE, Bolsonaro omitiu bens de R$ 2,6 milhões

Hudson Corrêa

29/09/2018

 

 

Imóveis estão em declaração de patrimônio anexada pela ex-mulher de candidato em ação de partilha. Ana Cristina Valle afirma que fez acusações movidas por mágoa, e presidenciável diz que ‘cotoveladas’ são comuns em separação

O presidenciável Jair Bolsonaro (PSL) omitiu das declarações de bens entregues à Justiça Eleitoral, nas disputas de 2006 e 2010, ao menos duas casas avaliadas em R$ 2,6 milhões. Em ambas as campanhas, ele concorria à Câmara dos Deputados. Os imóveis constam da lista de bens apresentada pela ex-mulher de Bolsonaro Ana Cristina Siqueira Valle em processo de partilha, movido após a separação do casal em 2007.

O processo foi publicado pela revista “Veja” na edição de ontem. A ação judicial trata de detalhes da separação entre o deputado federal e Ana Cristina. E revela que Bolsonaro e a ex-mulher detinham, em 2009, um patrimônio que somava R$ 4 milhões. Na listagem apresentada à Justiça estão os dois imóveis registrados em cartório no Rio de Janeiro. Procurados, Bolsonaro e Ana Cristina não responderam ao GLOBO. Para a “Veja”, a ex-mulher do presidenciável sustentou que foi movida pelo sentimento de mágoa ao fazer acusações contra o exmarido no processo judicial, onde também afirmou que Bolsonaro teria furtado um cofre de sua propriedade e que tinha comportamento agressivo. Ela disse que, “brava”, fala “besteira”. Informou também que chegou a um acordo com o ex-marido para dar fim ao litígio. Em entrevista ao apresentador José Luiz Datena, da Band, Bolsonaro afirmou que a própria Ana Cristina desmentiu as acusações. Na entrevista, o candidato afirmou que, em processos de separação, “é comum ter problemas” e “as cotoveladas acontecem de ambas as partes”.

LISTA DE BENS

Na lista de 17 itens que aparecem na declaração de bens anexada ao processo judicial, o de maior valor é uma casa avaliada em R$ 1,66 milhão, localizada na rua Maurice Assuf, na Barra da Tijuca. Bolsonaro comprou a casa em 22 de novembro de 2002. O imóvel foi vendido em 2009, porém não aparece na declaração de patrimônio entregue à Justiça Eleitoral em 2006, três anos antes. O levantamento do GLOBO mostra que a casa foi adquirida por R$ 500 mil. O preço da compra, registrado em cartório, difere do valor de mercado, utilizado para o cálculo para a cobrança do Imposto sobre Transmissões de Bens Imóveis (ITBI), que apontava na época que o imóvel era avaliado em R$ 1,66 milhão. Na campanha de 2006, Bolsonaro listou apenas uma sala comercial, três veículos, duas aplicações no banco e um lote, que somavam R$ 433,9 mil.

Em 21 de janeiro de 2009, Bolsonaro comprou outra casa, em um condomínio de frente para o mar, também na Barra da Tijuca. A residência, no entanto, não foi declarada à Justiça Eleitoral nas eleições de 2010. Bolsonaro registrou no cartório a transação por R$ 400 mil. Aguia de pagamento deITBIdaé poca revela, no entanto, que o preço de merca doer ade R$ 1,05 milhão. O presidenciável só declarou este imóvel nas eleições de 2014. Além dos dois imóveis, o processo judicial traz outros bens que entraram na partilha, como um apartamento na Barrada Tijuca, uma sala comercial no Centro do Rio, uma casa e uma sala em Resende, além de cinco lotes no mesmo município do sul fluminense.

ROUBO DE COFRE

Também constam uma variedade de veículos: a caminhonete Land Rover, ano 2007; um veículo tipo reboque, ano 2006; uma Pajero 2006, além de um Jet Ski Yamaha, ano 2006. Como o presidenciável pode ter comprado os bens após a eleição de 2006 e parte deles está somente em nome de Ana Cristina, não é possível afirmar que o deputado também omitiu este patrimônio da Justiça Eleitoral, sema confirmação porme iode certidões de compra e venda. A reportagem da“Veja” também traz os rela tosque Ana Cristina fez à Justiça sobre a situação financeira do deputado. Ela afirmou que o casal vivia com renda mensal de R$ 100 mil, acima dos ganhos do parlamentar e dos vencimentos do capitão da reserva. “Outros proventos" garantiriam a vida de conforto, mas Ana Cristina não explicou quais seriam estas fontes de renda. Segundo a reportagem, Ana Cristina acusou o ex-marido de ter roubado o cofre dela numa agência do Banco do Brasil, no Centro do Rio, onde estariam guardados US$ 30 mil, R$ 200 mil e joias avaliadas em R$ 600 mil. Ela chegou a prestar queixa na delegacia. À “Veja”, Ana Cristina disse que não levou a queixa sobre o roubo do cofre adiante porque “não se sentia à vontade”. “Iria dar um escândalo para ele e para mim”. “Nós dois tínhamos um acordo de abrir mão de qualquer apuração porque não seria bom”. O motivo da separação seria o “comportamento explosivo” e “desmedida agressividade” do ex-marido.

Nas eleições deste ano, Bolsonaro declarou patrimônio de R$ 2,28 milhões. Entre seus principais bens, estão a casa de R$ 400 mil, adquirida em 2009, e outra comprada no mesmo condomínio, em dezembro de 2012, por R$ 500 mil, segundo registro no cartório. O imóvel comprado há seis anos tem valor de mercado de R$ 2,2 milhões, conforme guia do ITBI. Ontem, o candidato também se manifestou nas redes sociais. Disse que responde “qualquer acusação sem problema nenhum, no momento oportuno. Estamos na reta final de uma campanha”. “A revista fez uma matéria (sobre fato) ocorrido há mais de 10 anos, que correu em segredo de Justiça. O objetivo? Tentar me desconstruir”.

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Chaveiro que arrombou cofre diz que ex-mulher atribuiu furto a candidato

Bruno Abbud

Carolina Heringer

29/09/2018

 

 

Jalmir de Azevedo conta que viu o presidenciável em agência do Banco do Brasil no Centro do Rio

No fim de outubro de 2007, o chaveiro Jalmir Araújo de Azevedo recebeu um telefonema. Deveria socorrer uma cliente na agência do Banco do Brasil da Rua Senador Dantas, no centro do Rio. A cliente, a advogada Ana Cristina Valle, ex-mulher de Jair Bolsonaro, não conseguia abrir seu cofre com a chave de que dispunha. Quando Jalmir concluiu o serviço, a surpresa foi geral: o cofre estava vazio. Segundo o chaveiro, a advogada creditou o sumiço de seus pertences — R$ 200 mil em espécie, 600 mil reais em joias e US$ 30 mil, conforme revelou em depoimento na 5ª DP (Mem de Sá), em 26 de outubro de 2007 — a Bolsonaro. A informação foi primeiramente revelada pela revista “Veja”. —Quando viu que não tinha nada lá, a mulher do Jair Bolsonaro disse que foi roubada e chamou todo mundo de ladrão. Ela endoideceu e começou a gritar que o ex-marido, mancomunado com o Banco do Brasil, foi lá e tirou tudo dela —diz Jalmir. Recuperando-se de chikungunya, o chaveiro foi encontrado pelo GLOBO em sua casa em São Gonçalo, no Grande Rio. Ele conta que foi o responsável pela instalação e manutenção de 2.224 cofres abrigados no 6º andar do prédio do banco no centro do Rio. Jalmir reclama que até hoje não foi pago pelo serviço, que segundo ele teria custado, à época, R$ 300. —Abri o cofre dela e ela não me pagou. Até hoje não recebi. Teria que me pagar, mas fez um escarcéu e foi embora. Jalmir conta que , em duas ocasiões, viu Bolsonaro dentro da sala dos cofres ou de saída do prédio.

O serviço de armazenamento de pertences na agência bancária foi contratado por Ana Cristina em 2005, de acordo com uma ação de indenização por danos morais que ela moveu contra o banco em 2009. Na ação, julgada improcedente, ajuíza Lindalva Soares Silva, da11ªV ara Cível, ressaltou que “em momento algum a autora especificou nos autos quais eram os pertences lá guardados”. O cofre só pode ser aberto com uso simultâneo de duas chaves, uma delas em poder do banco, a outra com o locatário. Na ocasião em que arrombou o cofre, o chaveiro constatou que a chave da ex-mulher de Bolsonaro não correspondia ao cofre 2140, do qual ela era locatária.

NEGATIVA EM DEPOIMENTO

Em depoimento à Polícia Civil, Gelson Gomes da Silva, responsável por dar acesso aos titulares dos cofres na agência, afirmou que ao perceber que não havia nada dentro da caixa metálica, Ana disse que isso seria “coisa de seu ex-marido”.

Em seu depoimento à polícia, contudo, Ana Cristina não atribuiu o suposto furto a Bolsonaro.