O globo, n. 31044, 05/08/2018. Economia, p. 36

 

Falta informação sobre coparticipação em planos de saúde

Luciana Casemiro

Pollyanna Brêtas

05/08/2018

 

 

Especialistas e consumidores reclamam da dificuldade de saber valor de procedimentos e parcela a ser paga por cliente

Uma cobrança de R$ 20.935, a título de coparticipação num tratamento oncológico, pegou de surpresa o empresário Marcos de Souza Costa, de 64 anos, morador de Palmas, no Tocantins. Além de considerar o valor abusivo, Costa conta não ter sido informado de quais eram os procedimentos e o cálculo que resultaram neste montante.

— A primeira cobrança foi de R$ 1.544. Depois veio essa demais de R $20 mil. Recorrià Justiça para questionar ambos os valores. Na hora em que você precisa do plano, ele passa a recusar atendimento ou fazer cobranças abusivas — queixase o empresário, que já havia ido ao Judiciário para garantir a cobertura do tratamento.

Procurada, a Unimed Palmas disse que não há lei que proíba a cobrança de coparticipação em tratamentos de doenças crônica seque garante ao beneficiário acessoà planilha de uso, tabela e cálculos de coparticipação em seu site.

Hoje não há limites para cobrança de franquia e coparticipação, nem obrigatoriedade de procedimentos isentos. Na semana passada, a Agência Nacional de Saúde (ANS) revogou a resolução normativa 433, que estabelecia teto de até 40% para cobrança por procedimentos médicos, que poderia chegara 60% nos planos empresariais. A resolução, que foi criticada por órgãos de defesa do consumidor por fixar um teto muito elevado para co participação sem um debate pré viomais amplo, determinava também que 250 procedimentos ficariam isentos dessa

cobrança. E previa ainda a prestação de informações obrigatórias pelas operadoras de planos de saúde, como um extrato mensal sobre coparticipação e franquia e dados sobre saldos remanescentes de cobrança.

O debate sobre as regras de coparticpação será reaberto no dia 4 de setembro, quando a ANS realizará audiência pública. Mas as regras vigentes, diz a agência, já obrigam a informar os percentuais nos contratos, bem como a apresentar extratos de utilização de serviços, entre outros dados, na área dedicada ao usuário no site das operadoras.

FALTA TRANSPARÊNCIA

Especialistas, porém, criticam a falta de informação prévia e de acompanhamento das contas para quem tem planos nessa modalidade. Em uma década, o número de usuários com contratos com coparticipação triplicou: de oito milhões, em 2007, para 24,7 milhões em abril de 2018, segundo dados

da ANS. Quase 70% dos contratos empresariais, informa a consultoria Mercer Marsh Benefícios, incluem essa forma de pagamento.

A disseminação do uso de coparticipação, diz Ana Carolina Navarrete, pesquisadora em saúde do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), torna cada dia mais premente a necessidade de informação. E não basta, diz, a empresa afirmar oferecê-la em seu site:

—Pelo Código de Defesa do Consumidor( CDC) e até pela resolução normativa 389 da ANS, o usuário pode solicitar discriminação detalhada em caso de dúvida. Se as informações são de difícil entendimento, o CDC está sendo desrespeitado, e isso deve ser registrado nos Procons.

Para Rafael Robba, advogado especializado em saúde do escritório Vilhena Silva, a ANS precisa criar mecanismos mais eficazes para garantira transparência:

—Dificilmente se tem acessoa cálculos e preços.

A falta de transparência também atinge os usuários que têm direito a reembolso. A agente de viagens Sheila Borges Pelúcio, de 69 anos, por exemplo, conta ter ficado chocada ao receber apenas 1% do valor pago pelo exame de mapeamento dermatológico corporal, pelo qual pagou R$ 800.

— Tive um câncer de pele e preciso fazer acompanhamento anual. Ao entregar o recibo, perguntei o valor do reembolso, masa atendente disse não ter acessoa essa informação. Cer cade 20 dias depois, depositaram R $8. Gastei mais doque isso par aira té ase dedo plano dar entrada no

reembolso —diz Sheila, acrescentando que lhe negaram informação sobre o cálculo.

A Unimed-Rio disse que reembolsará o valor integral do exame à cliente. A cooperativa alegou erro no cadastro do procedimento pelo médico, o que teria resultado no valor pago, e garantiu dar acesso às informações aos beneficiários.

Para saber o valor que receberia de reembolso de uma consulta da Golden Cross, o analista Alexandre Assumpção precisou fazer contas a partir de uma fórmula informada pela operadora.

— Liguei três vezes para a empresa, mas o serviço é automático,

e uma gravação encerra as ligações recomendando acessar o site. No portal, são exigidas informações que resultam numa fórmula de cálculo que eu mesmo tive que resolver —reclama Assumpção, que, em julho, trocou de operadora.

A Golden Cross informa que o beneficiário pode dar entrada e acompanhar o processo de reembolso pelo aplicativo e acrescenta que há no site ferramentas que permitem ao cliente obter prévias ou calcular o reembolso.

Segundo a Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) e a Associação

Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), os percentuais de coparticipação e franquia são informados em contrato e, no portal do beneficiário, no site das empresas, há extrato de utilização. A Abramge diz não ser viável fornecer uma lista com valores de procedimentos, pois esses variam segundo o prestador. A FenaSaúde, por sua vez, informa que algumas operadoras já disponibilizam tabelas com valores.

Wilson Scholnik, presidente da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica /Medicina Laboral, diz que o cliente pode pedir aos prestadores de serviço um orçamento prévio.