O globo, n. 31014, 06/07/2018. Economia, p. 17

 

Ações da Embraer têm maior queda em 17 anos

Ana Paula Ribeiro

06/07/2018

 

 

Papéis desabam 14,28%, e empresa perde R$ 2,8 bi em valor de mercado. Mas analistas consideram acordo positivo

O anúncio do acordo entre a Boeing e a Embraer para a criação de uma joint venture na área de aviação comercial fez as ações da companhia brasileira despencarem 14,28%, a R$ 23,16, na B3 (antiga Bovespa). Foi o maior tombo desde setembro de 2001, quando o mundo ainda sofria os efeitos dos atentados do 11 de Setembro. Em valor de mercado, a empresa encolheu R$ 2,8 bilhões em apenas um dia e agora vale R$ 17,134 bilhões. Apesar da forte queda, analistas avaliam que o negócio é positivo para a fabricante brasileira.

Na avaliação de Rafael Passos, analista da Guide Investimentos, há três fatores por trás do tombo dos papéis da Embraer ontem: valor do negócio (a nova empresa foi avaliada em US$ 4,75 bilhões) abaixo do esperado, pontos ainda não esclarecidos do acordo e embolso de lucros.

— Apesar da desvalorização, a parceria pode dar um resultado melhor para a empresa no futuro. Com o dinheiro, a companhia também pode pagar um dividendo extraordinário, embora o valor não esteja definido. Ainda são muitas questões a serem esclarecidas, por isso o papel caiu tanto. Mas, de forma geral, é um negócio positivo — diz Passos.

A criação da joint venture não altera o controle acionário da Embraer, e os papéis continuarão a ser negociados normalmente na B3, sem a necessidade de fazer uma oferta aos acionistas. Com participação de 20% na nova empresa (que terá capital fechado), a expectativa é que a parceria eleve os ganhos da Embraer no futuro e isso se reflita na valorização das ações, com distribuição de dividendos maiores.

— Não foi a compra de uma empresa. E sim a criação de uma nova empresa, em que a Embraer entrará com o ativo da aviação comercial, e a Boeing, com o dinheiro — explica Pedro Galdi, analista da Mirae Asset.

O modelo de joint venture faz com que o controle da Embraer seja preservado, por isso não há necessidade de realizar uma oferta pública de ações (OPA). Essa operação ocorre quando uma empresa compra o controle de outra e precisa estender as mesmas condições de preço aos acionistas minoritários.

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'Negócio vai perenizar a fabricação de aviões no Brasil'

06/07/2018

 

 

Para o professor de economia do transporte aéreo Adalberto Febeliano, o tombo das ações da Embraer ocorreu porque o mercado considerou que o valor do negócio não foi justo. Mas ele vê a associação com a Boeing como positiva, pois deve garantir a permanência da Embraer na cadeia global de fornecedores do setor aeronáutico:

— O negócio também vai perenizar a fabricação de aviões no Brasil. Trata-se de um segmento muito caro e arriscado. Gastamse de US$ 2 bilhões a US$ 3 bilhões para desenvolver um novo modelo de avião, sem saber quantas unidades serão vendidas. Só gigantes como Airbus e Boeing podem fazer isso, agora ao lado de Bombardier e Embraer, respectivamente. Se a Embraer ficasse sozinha, como seria?

A expectativa é que os US$ 3,8 bilhões que a Embraer irá receber da Boeing sejam usados no pagamento extraordinário de dividendos (parte do resultado da empresa que é distribuída a acionistas).

Analistas da corretora Rico apontam que a parceria deve gerar, a médio e longo prazos, sinergias importantes. Segundo o comunicado divulgado pelas empresas, a sinergia anual de custos é estimada em cerca de US$ 150 milhões (antes de impostos) até o terceiro ano. Já a Coinvalores vê tendência de valorização para as ações da empresa brasileira.

QUEDA TAMBÉM EM NY: 10%

No mercado americano, os recibos de ações (ADRs, na sigla em inglês) da Embraer também tiveram forte queda: 10,34%, a US$ 23,50. Já as ações da Boeing na Bolsa de Nova York encerraram estáveis, cotadas a US$ 332,18. Mas, apesar da insatisfação com o valor atribuído ao negócio e da incerteza que ainda cerca vários pontos do acordo, os papéis da Embraer acumulam alta de 41,8% desde que as discussões com a americana vieram à tona, no fim do ano passado.

Apesar da forte queda das ações, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) não abriu nenhum novo processo em relação à Embraer. Os assuntos relacionados ao acordo com a Boeing já fazem parte de um processo iniciado no fim do ano passado. Caso a área de supervisão avalie que houve alguma falha na comunicação do acordo, o questionamento será enviado à companhia.