Valor econômico, v. 18, n. 4486, 19/04/2018. Brasil, p. A2.

 

TCU adia decisão sobre uso de fundo para cumprir 'regra de ouro' neste ano

Murillo Camarotto/ Fábio Pupo

19/04/2018

 

 

A pedido do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), foi retirada de pauta a análise de um pedido de governo para desvincular recursos do Fundo de Fiscalização das Telecomunicações (Fistel). Além disso, já começam a surgir divergências sobre o tema entre os ministros do órgão de controle.

O movimento é um revés para o governo, que conta com os recursos para cumprir a chamada "regra de ouro" das contas públicas neste ano.

Conforme antecipou o Valor, o pedido já foi aprovado pela área técnica do tribunal e pelo ministro relator, Vital do Rêgo, restando apenas a confirmação pelo plenário. O MP-TCU, no entanto, pediu para analisar a matéria antes de uma votação.

A procuradoria não tem prazo definido para devolver o assunto à pauta, mas Vital pediu que seja feita com celeridade. O ministro-substituto André Luis de Carvalho adiantou que abrirá uma posição divergente da do relator quando a matéria retornar.

O Fistel, que renderia R$ 10,6 bilhões ao Tesouro no caso de um aval do TCU, foi alvo da primeira de três consultas ligadas à regra de ouro feitas pela equipe econômica a chegar ao plenário do tribunal. Nos bastidores da equipe econômica, essa medida não era vista com dificuldades de aprovação no órgão de controle. Outra das consultas feitas ao TCU foi sobre o uso de receitas obtidas pela União com royalties de petróleo e gás. Nas contas do Tesouro, essa rubrica renderia R$ 27 bilhões.

Um terceiro pedido de análise foi sobre o uso de forma mais ampla do dinheiro que está no caixa do Tesouro decorrente do chamado superávit financeiro (receitas de diversas fontes que não foram usadas para suas destinações nos exercícios em que entraram nos cofres).

A operação ligada ao superávit financeiro, se autorizada, teria um potencial de recursos de quase R$ 300 bilhões, mas a própria equipe econômica vinha considerando ter mais dificuldades de obter a autorização do tribunal.

Além de aguardar a análise do TCU sobre essas iniciativas, o governo quer buscar recursos do Fundo Soberano do Brasil (FSB). Criado em 2008, no governo do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, era uma espécie de poupança do governo em um momento de superávit primário.

O atual governo quer extinguir o fundo e usar seus recursos, estimados em R$ 26 bilhões pelo Tesouro, para cumprir a regra de ouro. Para isso, afirmou que mandaria um projeto de lei ao Congresso - o que até agora não foi feito.

Além das medidas que demandam aval do Congresso ou do TCU, o governo anunciou o uso dos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento (FND). Extinto em 2010, o FND ainda passa por um levantamento de inventário que deve ser concluído até o mês que vem, prazo dado por um decreto do presidente Michel Temer. O Tesouro estima que poderá usar R$ 16 bilhões dessa fonte de recursos. Somados, portanto, o FND e as medidas à espera de aval poderiam levantar R$ 380 bilhões - considerando as estimativas preliminares feitas pela equipe econômica.

Paralelamente, ajudará no cumprimento da regra de ouro a devolução antecipada de R$ 130 bilhões neste ano do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) ao Tesouro por empréstimos feitos nos últimos anos. Ainda pode auxiliar nas contas a anunciada revisão em restos a pagar.

Caso obtenha sucesso em todas as iniciativas, o governo cumpriria com certa folga o buraco de R$ 208,6 bilhões na regra de ouro em 2018. Para 2019, o rombo é estimado oficialmente em R$ 254,3 bilhões.

A regra de ouro das contas públicas impede o endividamento para pagamento de gastos correntes (como salários e aposentadorias, por exemplo).