O globo, n. 30923, 06/04/2018. País, p. 6

 

Promessa de resistir - Militantes fazem ato no ABC, e Lula considera ‘absurda’ ordem de Moro

Sérgio Roxo e Dimitrius Dantas

06/04/2018

 

 

Equipes do ‘Correio Braziliense’ e do SBT são atacadas em Brasília

-SÃO BERNARDO DO CAMPO- O decreto de prisão de Lula pelo juiz Sergio Moro provocou uma reação imediata dos aliados e de movimentos sociais que prometem se contrapor à ordem do magistrado. Até as 22h, a ideia era aumentar cada vez mais o número de militantes na porta do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC paulista, em São Bernardo do Campo, para fazer um cordão humano em torno de Lula. Dentro do PT, segundo interlocutores, havia quem defendia a tese de que Lula deveria resistir à prisão. O ex-presidente, no entanto, não teria dado nenhum sinal de que pretenda enfrentar Moro.

Grupos dos movimentos dos Sem Terra e dos Sem Teto, além de militantes, seguiram em caminhada de diferentes pontos de São Bernardo do Campo para um grande ato de apoio ao expresidente em frente ao sindicato, para onde ele foi depois de receber a notícia de que havia um mandado de prisão a ser cumprido até as 17h de hoje. Menos de uma hora depois da decisão, o líder petista se refugiou numa das salas do sindicato, de onde acenou pela janela para os manifestantes pouco depois das 21h.

DIVERGÊNCIA ENTRE SE ENTREGAR OU ESPERAR PF

Em Brasília, manifestantes contrários à prisão, que protestavam em frente à sede da Central Única dos Trabalhadores (CUT), quebraram com socos o vidro traseiro de um carro da reportagem do jornal “Correio Braziliense”, no momento em que uma repórter, uma fotógrafa e o motorista estavam dentro do veículo. Uma equipe do SBT também foi hostilizada e acabou expulsa do local. Segundo o “Correio Braziliense”, 30 pessoas partiram para cima do veículo. O jornal informou que nenhum dos três profissionais ficou ferido. O caso foi registrado na Polícia Civil do DF. O jornal afirmou que “repudia veementemente esse tipo de violência e de cerceamento à imprensa”.

Ao jornalista Kennedy Alencar, da rádio CBN, Lula classificou de “absurdo” o decreto de prisão e disse que tal medida era o “sonho de consumo de Moro”, referindo-se ao juiz responsável por decretar sua prisão ontem. Ele afirmou que o magistrado ainda deveria esperar ainda um último embargo pendente no TRF-4.

Enquanto Lula discutia dentro do sindicato com dirigentes e advogados o que fazer diante da decisão de Moro, do lado de fora cerca de 2 mil apoiadores gritavam palavras de ordem e levavam faixas que diziam: “Não à prisão de Lula”. Na noite de ontem, o público era maior do que o reunido para acompanhar o julgamento do habeas corpus pelo STF, na última quarta-feira.

Na expectativa de ser beneficiado por uma medida liminar, Lula deve esperar até o prazo final dado por Moro para se apresentar à Polícia Federal. Uma outra hipótese defendida por petistas é que o ex-presidente não se entregue e sim aguarde os agentes irem prendê-lo, o que pode contribuir para acirrar ainda mais os ânimos. Nesse caso, o ex-presidente se entregaria após caminhar no meio dos seus apoiadores.

A grande aposta dentro do partido é que as ações declaratórias de constitucionalidade (ADCs) sejam colocadas em votação no STF já na próxima semana, para que Lula fique pouco tempo preso. O entendimento é que, se o caso for ao plenário, Rosa Weber se posicionará contra a prisão antes de esgotados os recursos.

O clima de ânimos acirrados teve reflexo na porta do Instituto Lula. Na noite de ontem, um homem se aproximou de dirigentes do PT que deixavam o prédio, e os xingou de “ladrão”. Os dirigentes responderam. Nesse momento, um outro homem não identificado partiu para agressão ao manifestante, que levou um empurrão e bateu a cabeça no para-choque de um caminhão.

A decretação da prisão de Lula atropelou a organização do PT. O partido preparava uma vigília em São Bernardo do Campo a partir das 18h de hoje. Lula falaria, pela primeira vez publicamente, sobre a decisão do STF. Antes de sair a ordem de Sergio Moro, petistas cogitavam a possibilidade de uma prisão rápida, mas tratavam a hipótese como improvável. Em uma reunião da Executiva da legenda na tarde de ontem, alguns parlamentares chegaram a alertar que a prisão poderia ser antecipada, mas não houve mobilização.

Outro ponto de preocupação é como ficará a candidatura ao Planalto do ex-presidente. Correntes do partido defendem que Fernando Haddad seja anunciado como cabeça da chapa, mas esse caminho está longe de ser consenso.