O globo, n. 30923, 06/04/2018. País, p. 4

 

Liminar pedida por advogados ainda pode tirar Lula da cadeia

Renata Mariz, André de Souza e Eduardo Bresciani

06/04/2018

 

 

Marco Aurélio quer rediscutir prisões em 2ª instância no plenário do STF

-BRASÍLIA- O ministro Marco Aurélio Mello pretende levar ao plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), na próxima quarta-feira, pedido para julgamento de liminar que pede suspensão das prisões em segunda instância. A análise do caso no STF pode acabar beneficiando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se a Corte rever o entendimento sobre o tema do cumprimento da sentença antes de decisão judicial sem direito a recurso.

Lula teve habeas corpus negado pelo STF e terá que se apresentar hoje à Polícia Federal em Curitiba.

O recurso foi apresentado ontem pelo advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, que atua em nome do Partido Ecológico Nacional (PEN). Como relator do caso, Marco Aurélio deve solicitar que o processo seja julgado “em mesa”. Com isso, a inclusão do caso na pauta não dependerá da presidente do STF, Cármen Lúcia.

NÃO SERIA AUTOMÁTICO

A soltura dos presos, caso o Supremo defira a liminar do PEN, também não se daria de forma imediata. Seria preciso que as defesas dos condenados em segunda instância acionem o Judiciário exigindo o cumprimento da decisão.

— Se deferido, haverá um efeito vinculante, válido para todos, mas os juízes não vão dar (a soltura) automaticamente — explicou Kakay.

Marco Aurélio indicou ontem que não vai tomar a decisão sozinho. O novo pedido de liminar foi apresentado na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC), que tem efeito judicial mais amplo. A ação já estava pronta para julgamento no plenário, mas não foi incluída na pauta por Cármen Lúcia. Ela acabou pautando o julgamento do habeas corpus de Lula por entender que o STF já havia definido uma jurisprudência sobre o tema em 2016. Marco Aurélio falou sobre a intenção de julgar o pedido de liminar na próxima semana, antes de saber da notícia da ordem de prisão contra Lula.

Se a liminar do PEN, que pede a proibição para prisões decretadas com base em condenação na segunda instância passar, todos os presos nessa situação poderão ser beneficiados em tese, sem importar quando a prisão ocorreu. No entanto, a própria Corte pode reconhecer a legalidade de detenções decretadas na segunda instância se o juiz achar necessário.

A decisão de Cármen de pautar o habeas corpus, mas não as ADCs que tratam do tema, foi importante para os rumos do julgamento. Rosa Weber votou em 2016 a favor da prisão apenas depois do trânsito em julgado, mas, ao analisar um caso específico, seguiu o entendimento vigente do STF, de execução da pena após condenação em segunda instância. Para Rosa, a mudança de composição do STF não constitui fator suficiente para mudança de jurisprudência. Se as ADCs tivessem sido julgadas, e a jurisprudência, alterada, o voto dela poderia ter sido outro, alterando o resultado.

CRÍTICA A PRISÕES “COMO REGRA”

Esse entendimento foi externado inclusive durante o julgamento do habeas corpus do expresidente Lula. Embora se estivesse analisando só o caso do petista, a questão de fundo sobre execução antecipada da pena apareceu nos debates.

O ministro Gilmar Mendes, que defendeu a prisão apenas após decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), afirmou em seu voto que não se trata de proibir a prisão na segunda instância, mas sim de não torná-la a regra. O ministro disse que ele próprio vem negando tais pedidos no caso de determinados presos, como criminosos reincidentes e pedófilos.

Questionado se uma prisão de Lula, quando a prisão em segunda instância ainda está pendente de julgamento, seria uma injustiça, Marco Aurélio disse:

— A pendência da matéria gera perplexidade. Claro que, como cidadão, eu seria favorável a não se ter tantos recursos e chegar-se realmente à definição do processo em tempo mais curto. Mas eu tenho um sistema que preciso observar. Agora vamos ver para que não haja açodamento.

Ele lembrou que Lula ainda tem muitos apoiadores, mas, questionado se o país se incendiaria com a prisão, disse não saber, e que é um otimista.