O globo, n. 30911, 25/03/2018. Rio, p. 23

 

Após denúncias, Facebook tira do ar 'fake news' contra Marielle

Gabriel Cariello e Marco Grillo

25/03/2018

 

 

Origem de notícias falsas sobre vereadora foi revelada em reportagem

Facebook exclui perfis que faziam parte de esquema para difamar vereadora morta, como revelou O GLOBO. Após reportagens publicadas pelo GLOBO, o Facebook tirou do ar ontem uma página e dois perfis associados à disseminação de “fake news” contra a vereadora Marielle Franco (PSOL), assassinada na semana passada. Os perfis Luciano Ayan e Luciano Henrique Ayan foram identificados como falsos e apagados, por contrariarem as normas da rede social. A mesma medida foi adotada contra a página Ceticismo Político, por ser administrada por um perfil falso, o de Ayan.

Na sexta-feira, reportagem do GLOBO revelou que uma publicação do Ceticismo Político tinha sido a principal responsável por impulsionar a onda de acusações falsas contra Marielle, ao usar o post feito por uma desembargadora, que tratava de uma relação que nunca existiu entre Marielle e um traficante. Na mesma mensagem, também era citada uma ligação mentirosa da vereadora com o crime organizado.

A publicação do Ceticismo Político foi compartilhada mais de 360 mil vezes no Facebook. Também foi replicada pelo Movimento Brasil Livre (MBL) — que depois retirou de sua página —, ampliando ainda mais o alcance das falsas acusações.

“Nossos padrões da comunidade não permitem perfis falsos, e contamos com nossa comunidade para denunciar contas assim. Páginas administradas por perfis falsos também violam nossas políticas”, informou o Facebook ao GLOBO, em comunicado.

Uma página antiga do Ceticismo Político, que deixou de ser atualizada em fevereiro e tem menos alcance que a página apagada, ainda permanece no ar.

Diretor da Bites, empresa de consultoria tecnológica, Manoel Fernandes disse ser improvável que o Ceticismo Político tenha feito uso de robôs para criar a repercussão alcançada. O especialista observou que a publicação foi distribuída por pessoas e grupos com alta influência nas redes, como o próprio MBL e Kim Kataguiri, um de seus líderes.

 

AUTOR DE TEXTO SE IDENTIFICA

Segundo uma análise da Bites, o Ceticismo Político tem uma média mensal de 460 mil visitantes únicos por mês, sendo que 93% de seu tráfego de leitores têm origem nas redes sociais. Oitenta por cento dos acessos são feitos pelo Facebook. O domínio do site, registrado por uma empresa da Dinamarca, pertence a Luciano Henrique Ayan.

Também ontem o autor do perfil Luciano Ayan revelou sua verdadeira identidade. Em texto publicado no site Ceticismo Político, Carlos Augusto de Moraes Afonso assumiu a autoria dos textos que até então eram assinados por Ayan. Ele admitiu, pela primeira vez, que Luciano Ayan é um “pseudônimo”. Disse que o Ceticismo Político foi criado por ele, e hoje tem outros colaboradores, cujos nomes não foram revelados. Afonso afirmou que editou o post “Desembargadora quebra narrativa do PSOL e diz que Marielle se envolvia com bandidos e é ‘cadáver comum’”.

Na postagem, Carlos Afonso confirmou que atua para influenciar o debate político na internet. Ele afirmou que, desde 2011, desenvolveu “um método para a guerra política”. A atuação do perfil Luciano Ayan nas redes sociais endossou movimentos de apoio ao impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Um dos grupos que organizaram atos contra a petista foi o Movimento Brasil Livre. Nas redes sociais, o MBL compartilha conteúdos do Ceticismo Político e já publicou em seu blog textos assinados pelo pseudônimo Luciano Ayan. Um dos coordenadores do movimento, Renato Battista, disse ao GLOBO que não conhecia a identidade de Ayan, mas que isso não o impedia de compartilhar seus conteúdos.

Ontem, artistas grafitaram o rosto de Marielle em diversos pontos da cidade.