Correio braziliense, n. 19967, 23/01/2018. Política, p. 4

 

À espera das leis

Natália Lambert 

23/01/2018

 

 

FAKE NEW, A VERDADE SOB ATAQUE

Em ano eleitoral, a preocupação com a fake news é uma das prioridades no Brasil, assim como ocorre em grande parte do mundo. Além do grupo de trabalho coordenado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que montará um protocolo de atuação, o Congresso Nacional promete se debruçar sobre o tema. E um dos principais motivos é a influência no resultado das urnas. O Correio mostrou na série de reportagens Fake News, a verdade sob ataque, publicada desde o último sábado, que especialistas em tecnologia e marketing político chegam a ganhar mais de R$ 500 mil por candidato em período eleitoral para destruir a imagem de adversários.

O primeiro passo no Congresso é entender a legislação que precisa ser feita. Atualmente, quatro leis amparam as punições sobre fake news e todas carecem de atualizações. Primeiro, o Código Eleitoral, que trata da divulgação de informações inverídicas. Ele é da década de 1960 e não tem qualquer referência à internet. O Código Penal, que prevê a injúria, calúnia e difamação, é dos anos 1940. A Lei de Segurança Nacional, de 1980, estabelece punições por difundir boatos que causem pânico. Por fim, o Marco Civil da Internet (Lei  nº12.895/15) tampouco se aprofunda no tema.

Pensar essa lei será prioridade para o Conselho de Comunicação Social, órgão auxiliar do Congresso. Formado por integrantes da sociedade civil e por representantes de meios de comunicação, o órgão reuniu as propostas que tramitam com assuntos relacionados à fake news: 371, sendo 262 na Câmara e 109 no Senado. A maioria delas trata somente de aumento de punições e cerceamento de sites e aplicativos, o que fere o Marco Civil. “A intenção é analisarmos esses projetos e elaborar pareceres para identificarmos o caminho mais adequado para lidar com a questão e orientar os parlamentares”, conta o jornalista Davi Emerich, um dos representantes da sociedade civil do Conselho.

A primeira reunião do ano está na marcada para o próximo dia 5 e um dos itens da pauta é a análise do Projeto de Lei 5130/16, que propõe a exclusão da proibição ou da suspensão temporária de atividades de provedores de acesso à internet como forma de sanção. Diversas propostas tratam da possibilidade ou não do bloqueio de sites e aplicativos, inspirados, em decisões judiciais que determinaram a retirada do ar do YouTube ou do WhatsApp, por exemplo. “Esse é o problema. As ideias são focadas em situações específicas e periféricas, quando uma das questões mais complicadas é a da territorialidade. Precisamos entrar nisso de verdade”, comenta Emerich.

O problema que envolve sites hospedados fora do Brasil também é uma das prioridades da força-tarefa criada pelo ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), com a Polícia Federal e o Ministério Público Federal (MPF). Até agora, o grupo se reuniu três vezes de maneira informal, mas aguarda a posse de Fux como presidente do TSE, no próximo dia 6, para começar oficialmente. Enquanto isso, a Polícia Federal tem mantido encontros com representantes do FBI, a agência norte-americana responsável por crimes federais. A corporação atua nas investigações sobre os ataque dos russos na última eleição que elegeu Donald Trump à Presidência dos Estados Unidos e compartilhará informações com investigadores brasileiros.

Críticas

Acusado de censura no fim do ano passado por ter tentado incluir na reforma política emenda que previa a suspensão sem autorização judicial de conteúdo considerado difamatório — trecho vetado por Michel Temer —, o deputado Áureo (Solidariedade-RJ) afirma que o Congresso perdeu a oportunidade de tomar a frente do problema. “O erro foi ter misturado o assunto com política. E fui mal interpretado. As pessoas precisam entender que o poder das notícias falsas é muito grande e a gente precisa de uma regulamentação”, afirma. “É um problema mundial e o Brasil precisa trabalhá-lo de forma efetiva. Só que como o Congresso não cumpre esse papel, mais uma vez, será decidido pelo Judiciário”, critica.

Relator da Comissão Parlamentar de Inquérito dos Crimes Cibernéticos, encerrada em 2016, o deputado Esperidião Amin (PP-SC) acredita que o Brasil hoje não tem capacidade de combater as fake news. “Ao fim da CPI, sugerimos 23 providências, entre elas, vários projetos de lei que já estão atrasados. A internet é rápida e devastadora. A legislação tem de acompanhar o que o cidadão sofre e a polícia tem de agir de acordo com a lei, só que a lei tem que ser atualizada. É uma avalanche”, ressalta. Para o deputado, só uma atividade permanente e prioritária dentro do legislativo pode controlar o mundo “fascinante e perigoso” da internet.

Propostas periféricas

Atualmente, tramitam no Congresso Nacional 371 propostas que podem se enquadrar de alguma maneira no tema fake news. Para agrupar os projetos, o Conselho de Comunicação Social os separou em temas e subtemas. Confira detalhes:

Projetos

Câmara: 262

Senado: 109

Temas selecionados

» Comunicação e projetos eleitorais

» Tecnologia de informação, internet e redes sociais

» Conteúdos em meios de comunicação

» Liberdade de expressão e participação social

» Publicidade e propaganda