Cabral nega taxa de propina em obras: ‘Que maluquice é essa?’

Juliana Castro

11/07/2017

 

 

Ex-governador reafirma que dinheiro usado era caixa 2 de campanha

 

“Nunca houve propina. Houve apoio. Vejo que o MP se refere a delatores que falam que pedi 5%. Nunca houve 5%.”

Sérgio Cabral

Ex-governador do Rio

No primeiro depoimento em que aceitou responder a questionamentos que não foram formulados pelos próprios advogados, o ex-governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB) negou a cobrança de 5% de propina em cima dos valores dos contratos do governo do Rio. Cabral prestou depoimento ao juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal , em ação que trata de irregularidades em obras públicas.

— Nunca houve propina. Houve apoio. Vejo que o Ministério Público se refere a delatores que falam que pedi 5%. Nunca houve 5%. Que 5% é esse? Que história é essa de que esses 5% era algo que vigia no governo? Que maluquice é essa? — disse ele, na audiência da Operação Mascate.

Dois ex-dirigentes da Andrade Gutierrez — Rogério Nora e Clóvis Primo — fizeram delação premiada e disseram que Cabral cobrava 5% de propina em cima dos valores das obras do estado. No conjunto de 12 ações nas quais o peemedebista figura como réu, o MPF sustenta que houve um esquema de cartelização de empresas e favorecimento em licitações, mediante pagamento de propina em todas as grandes obras públicas de construção civil.

Em depoimento ao juiz Sérgio Moro e em outra ocasião, com Bretas, o peemedebista só havia respondido às perguntas da própria defesa e dos advogados da mulher, Adriana Ancelmo. Agora, como já fizera na audiência com Moro, Cabral sustentou que, na verdade, houve uso de caixa dois de campanha:

— Essas práticas políticas de caixa dois foram disseminadas por todo o Brasil e por todos os partidos — alegou.

Cabral foi condenado por Moro a 14 anos e dois meses de prisão e responde ainda outros 11 processos que tramitam na 7ª Vara Federal Criminal do Rio. O ex-governador ainda vai depor a Bretas outras duas vezes esta semana.

 

OPERADOR CONFIRMA

Também em depoimento dado ontem, Ary Ferreira da Costa Filho, ex-assessor de Cabral e réu no processo da Operação Mascate, disse que recolheu dinheiro das cervejaria Itaipava e do supermercado Prezunic para campanha eleitoral. Cada empresa, segundo ele, apontado como operador do ex-governador, doou R$ 5 milhões. Cabral disse desconhecer os valores. O ex-governador afirmou que nunca houve contrapartida às empresas que faziam doações, legais ou por via de caixa dois.

— Basta o governante discernir e separar um assunto do outro, e isso eu fiz — declarou.

A assessoria da Itaipava afirmou que “todas as doações feitas pelo Grupo Petrópolis seguiram estritamente a legislação eleitoral e estão devidamente registradas”. O grupo Cencosud, proprietário do Prezunic, afirmou que assumiu a operação da rede no Rio em 2012 e “desconhece qualquer pagamento feito de forma irregular. A empresa acrescentou que “está à disposição das autoridades para qualquer esclarecimento adicional".

Ary, preso desde fevereiro deste ano, reconheceu que deu dinheiro para que Adriano Martins, delator e dono de uma rede de concessionárias, comprasse imóveis. Ele afirmou que os apartamentos ficaram em nome de uma empresa de Adriano. Os recursos para a compra dos imóveis vieram de sobras de campanha que, segundo Ary, Cabral dava a ele. O operador disse que juntou o dinheiro ao longo do tempo, somando algo entre R$ 9 milhões e R$ 10 milhões. O ex-governador nega ter dado esse valor ao antigo colaborador. Para o MPF, as transações são lavagem de dinheiro oriundo da corrupção.

 

ESPECIAL: TUDO O QUE PESA CONTRA SÉRGIO CABRAL

Ex-governador do Rio é réu em doze processos e já foi condenado em primeira instância glo.bo/2rqqiyH

 

O globo, n.30654 , 11/07/2017. PAÍS, p. 8