Eduardo Bresciani
31/02/2017
Na audiência, Moro criticou projeto que está sendo relatado pelo senador Roberto Requião (PMDB-PR), que deve ser votado nas próximas semanas no Senado, sem levar em conta sugestões apresentadas pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
Em sua proposta, Janot tentou deixar claro que juízes e investigadores não podem ser punidos por interpretações divergentes da lei.
Ele ressaltou que não há uma oposição à necessidade de se punir abusos, mas à forma como o tema vem sendo tratado no Senado. Moro destacou que tanto entidades da magistratura quanto o procurador-geral já apresentaram propostas para o tema.
— Se não for aprovada uma salvaguarda clara e inequívoca a esse respeito o grande receio é que o juiz passe a ter medo de tomar decisões que possam eventualmente interferir em interesses comerciais ou sobre pessoas poderosas. Se ameaçar a independência da magistratura, é o primeiro passo pra colocar em risco as nossas liberdades individuais. Nós precisamos ter juízes independentes nos processos — afirmou Moro.
— Ninguém é favorável a qualquer abuso de autoridade praticado por juiz, promotor ou autoridade policial, apenas o que se receia é que, a pretexto de se coibir abuso de autoridade, seja criminalizada a interpretação da lei — disse.
SOB ATAQUE
Na audiência, porém, Moro também virou alvo preferencial de deputados do PT.
O deputado Zé Geraldo (PTPA) chegou a afirmar que ninguém cometeu mais abuso de autoridade do que o juiz e que ele nem deveria mais ocupar o cargo de magistrado.
— Ninguém tem cometido mais abuso de autoridade do que você — disse.
O presidente da comissão, Danilo Forte (PSB-CE), interrompeu Zé Geraldo. Mas ele continuou.
— Se a Justiça do Brasil fosse séria ele não seria nem juiz mais.
Pelo formato da reunião, Moro só teve a palavra novamente no final da audiência e teve que ouvir os ataques.
O primeiro a fazer ataques foi Paulo Teixeira (PT-SP). Ele defendeu a aprovação do projeto de abuso de autoridade e citou como exemplo de abuso a divulgação por Moro de uma ligação entre os ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, o que ocorreu no ano passado. Teixeira questionou o magistrado se o objetivo dele com a divulgação era contribuir para a “derrubada de Dilma”.
O deputado Wadih Damous (PT-RJ), por sua vez, afirmou que há um novo Direito Penal em construção pela “república de Curitiba”.
— O que se percebe é um laboratório “punitivista” e esses eflúvios vêm centralmente lá do Paraná, em que nosso Direito, os fundamentos do estado democrático de direito estão sendo simplesmente pulverizados em nome de um chamado bem maior — disse Damous.
Ao final, Moro lembrou que suas decisões têm sido mantidas por instâncias superiores.
— Não cabe a mim responder sobre casos concretos e pendentes, não vim aqui para isso. Minhas decisões estão sujeitas a diversos controles jurisdicionais e os tribunais têm, em geral, mantido as minhas decisões, majoritariamente. Não me cabe ficar aqui respondendo aos parlamentares que fizeram perguntas ofensivas — afirmou Moro.
— O que acontece é que muitas vezes a aplicação independente e imparcial da lei é interpretada como ativismo e não é. É apenas o juiz cumprindo sua função — disse o magistrado.
O globo, n.30552 ,31/03/2017. País, p.6