Correio braziliense, n. 19427, 03/08/2016. Política, p. 4

Leitura de relatório na segunda

O presidente da Câmara avisou que vai ler o parecer do Conselho de Ética que pede a perda do mandato de Eduardo Cunha no início da próxima semana. Aliados do peemedebista prometem esvaziar o plenário da Casa

Por: Paulo de Tarso Lyra

 

Depois de ser pressionado por parlamentares que defendem a cassação do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), marcou para a próxima segunda-feira a leitura do relatório do Conselho de Ética que condena o peemedebista à perda de mandato. Regimentalmente, isso significa que o processo entra na pauta de votações duas sessões depois. Mas, como não tranca a pauta, não precisará ser apreciado de imediato. Questionado se a votação acontecerá antes das eleições municipais, Maia foi taxativo: “Com certeza. Não tenho nenhuma dúvida, nenhuma disso”, frisou.

O problema é o quórum. Para ter uma margem de segurança, é prudente a presença de mais de 420 deputados em plenário. E os aliados de Cunha não fazem nenhuma questão de ajudar a fechar essa conta. “Eu tenho uma posição pessoal. Eu acho que a cassação do Cunha só pode acontecer após a votação do impeachment da presidente afastada, Dilma Rousseff. E não antes”, afirmou, taxativo, o líder do PTB e fiel escudeiro de Cunha, Jovair Arantes (GO). As lideranças dos partidos aliados a Cunha tendem a orientar os liderados a permanecerem nos estados. “Conclua como quiser, cada um traçará a sua própria estratégia”, ironizou o petebista.

Rodrigo Maia confirmou que vai ler, na próxima segunda, o relatório do Conselho de Ética. “Mas só vou votar ou analisar qualquer outra matéria após a votação do PLP 257 (que trata da renegociação da dívida dos estados), seja para derrotar, seja para aprovar o projeto”, resumiu Maia. Ontem, quase 400 deputados estavam na Casa, mas a ausência de consenso adiou a votação da matéria.

É com isso que os aliados de Cunha trabalham. “Tem muito deputado da Região Norte que, para estar em Brasília em plena segunda-feira, têm que pegar três voos e sair de casa às 4h de domingo. Se ele desconfiar de que não haverá votação, sequer deixará as suas bases eleitorais”, salientou um líder de uma legenda próxima a Cunha. “Muitos demonstraram profunda irritação por terem vindo a Brasília esta semana, na reta final das convenções municipais, para não votar nada”, completou o mesmo líder partidário.

Isso não significa, necessariamente, que os parlamentares deliberadamente deixem de vir para a capital federal na próxima semana. Mas, se o projeto da dívida dos estados for votado na segunda, a tendência é de que os parlamentares voltem para os seus estados para planejar a última semana antes da campanha eleitoral. Quando a corrida eleitoral começar para valer, as chances de um quórum cheio passam a ser menores ainda.

 

Estratégia

“Não vota nenhuma matéria antes de votarmos o Cunha. Fomos nós que esvaziamos a sessão de hoje (ontem), PSDB, DEM, estavam todos aí. Foi o primeiro capítulo dessa novela”, ameaçou um parlamentar ligado a Cunha. Protelar a cassação do peemedebista daria um gosto duplamente especial a esses parlamentares: além de garantir a sobrevida do mentor político, imporiam uma derrota a Rodrigo Maia, eleito com a ajuda do Palácio do Planalto.

O estranhamento entre os dois grupos ficou explícito na última segunda-feira. No primeiro dia após a volta dos trabalhos, Rodrigo Maia (DEM-RJ) marcou um almoço com os líderes da base aliada. Mas Jovair, o líder do PSD, Rogério Rosso (DF), o presidente do Solidariedade, Paulo Pereira da Silva (SD-SP), e o líder do PRB, Márcio Marinho (BA), estavam, no mesmo horário, em um almoço organizado por Paulinho. “Toda segunda-feira ou terça, quando chegamos à cidade, almoçamos juntos para atualizarmos as coisas. Como o Rodrigo não ligou para mim avisando que teria um encontro com os líderes, mantivemos a nossa agenda inalterada”, justificou Jovair.

O líder do PP, Aguinaldo Ribeiro (PB) — que também faz parte do grupo dos aliados a Cunh — almoçou na casa de Paulinho, mas depois foi se encontrar com os demais parlamentares no almoço com o presidente da Câmara. “Ele não foi celebrar nada, foi discutir o projeto da dívida dos estados, relatado pelo Esperidião Amin (PP-SC)”, rebateu Jovair.

 

Frase

"Eu tenho uma posição pessoal. Eu acho que a cassação do Cunha só pode acontecer após a votação do impeachment da presidente Dilma Rousseff. E não antes”

Jovair Arantes, líder do PTB na Câmara