Câmara paralisada com Maranhão

 
05/07/2016
Julia Chaib

 

Em mais um recuo desde que assumiu a presidência interina da Câmara dos Deputados, o deputado Waldir Maranhão (PP-MA) cancelou a primeira sessão da Casa que faria ontem para votar matérias como parte de um esforço concentrado que havia anunciado para esta semana. É a segunda semana seguida sem votações na Casa. A última foi no dia 21. A medida revoltou a base do governo do presidente em exercício, Michel Temer. Com a previsão do recesso branco, marcado para começar em 13 de julho e durar duas semanas, parlamentares temem que os projetos importantes para o governo se arrastem ainda mais. Deputados da base passaram a defender que a suspensão da pausa na Casa.

Enquanto as votações não andam, o processo de cassação do mandato do deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) também é prolongado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), e a matéria corre o risco de chegar ao plenário somente em agosto, se houver o recesso. Na última semana, Maranhão cancelou as votações da Casa para liberar parlamentares a irem para seus estados por causa das festividades juninas e de São Pedro, no último dia 29. Por isso, anunciou, na semana passada, que faria um esforço concentrado a partir do dia 4. “Como seria necessária a presença de 257 parlamentares para deliberar sobre matérias que tramitam na Câmara, e para evitar o desgaste de abrir e encerrar uma sessão sem votações, o presidente decidiu remarcar a sessão para terça-feira, às 14 horas”, disse Maranhão, em nota.

 

“É péssimo”

Após se encontrar com o pepista, o líder do governo, André Moura (PSC-SE), criticou o argumento de que não havia quórum para seguir com as votações. Maranhão começou o dia chamando uma reunião de líderes que deveria ocorrer ontem e teve que remarcar para hoje o encontro. O presidente havia prometido realizar sessões de segunda a quinta-feira, para votar as medidas de interesse do governo. Nesta semana, porém, só deve ocorrer sessão hoje à noite, amanhã e na quinta-feira. “Todo mundo sabe que, às segundas, começa a dar quórum a partir das 18h. Ele poderia ter esperado”, disse. “Isso é um boicote não só ao Temer, mas ao país”, afirmou Moura.

Há duas Medidas Provisórias (MP), 716 e 718, que trancam a pauta da Casa: a primeira destina recursos para o combate ao mosquito Aedes aegypti, responsável por transmitir o zika vírus, que causa microcefalia, e a outra altera normas tributárias e de controle de dopagem. Há outros cinco projetos de lei em regime de urgência que aguardam votação. Moura levará hoje para a reunião de líderes uma proposta para que o recesso branco ocorra, mas na última semana de setembro, quando uma parte dos parlamentares estará em campanha para as eleições municipais.

O líder do DEM na Casa, Pauderney Avelino (AM), reclamou do recuo. “É péssimo para a imagem da Casa”, disse. O primeiro-secretário da Mesa, deputado Beto Mansur (PRB-SP), também criticou a decisão e defendeu que não ocorra recesso na Casa, nem em setembro, para que se vote as medidas e também não se postergue o processo de cassação do deputado afastado Eduardo Cunha. Embora a decisão sobre o processo de cassação do peemedebista ainda não tenha sido tomada, parlamentares já iniciaram conversas sobre a sucessão do deputado. A avaliação é a de que Maranhão não pode ser mantido no comando da Casa. Mansur e outros aliados de Cunha na Câmara esperam a renúncia do peemedebista. Um dos deputados que lançará campanha à presidência, Milton Monti (PR-SP) condenou a decisão do Maranhão e disse que é candidato para mudar a imagem da Casa na sociedade.

O presidente em exercício já recuou ao menos quatro vezes de decisões tomadas. A primeira grande reconsideração foi sobre o processo de impeachment, o qual Maranhão havia mandado suspender e depois voltou atrás. Outro recuo foi ter feito e depois retirado uma consulta à CCJ sobre a possibilidade de se fazer um projeto de resolução passível de emendas no lugar do parecer do Conselho de Ética, o que poderia beneficiar Cunha.

 

Sigilo quebrado

O Supremo Tribunal Federal (STF) determinou a quebra do sigilo bancário do presidente em exercício da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA). A Corte mandou quebrar o sigilo para apurar “fortes indícios” de participação do deputado em fraudes relacionadas a fundos de pensão municipais, segundo antecipou ontem o jornal Folha de S.Paulo. As suspeitas têm como base uma delação premiada mantida em sigilo, obtida no âmbito da Operação Miqueias. Maranhão teria participado de um esquema paralelo de corrupção, comandado pelo doleiro Fayed Traboulsi.

 

Frase

“Todo mundo sabe que, às segundas, começa a dar quórum a partir das 18h. Ele poderia ter esperado. Isso é um boicote não só a Temer, mas ao país”

André Moura, líder do governo na Câmara

 

Correio braziliense, n. 19398, 05/07/2016. Política, p. 3