Correio braziliense, n. 19314, 12/04/2016. Política, p. 2

Dilma perde e fica na mão do plenário

Paulo de Tarso Lyra

Marcella Fernandes

Julia Chaib

Naira Trindade

O placar final da comissão especial do impeachment — 38 votos favoráveis e 27 contrários ao afastamento da presidente — manteve em aberto a votação decisiva do próximo domingo, no plenário da Câmara. Aliados do Planalto calculam que, a fim de obter os 342 votos necessários para afastar a presidente Dilma Rousseff, a oposição teria de ter obtido, ontem,  ao menos, 43 votos, para que a proporção se repita no fim de semana. Já os oposicionistas apostam em um plenário mais heterogêneo que a comissão montada, segundo eles, “para que o governo não perdesse a primeira batalha do impeachment”.

Proporcionalmente, a oposição obteve pouco mais de 58% dos votos válidos na comissão ontem. A guerra no plenário será mais intensa, já que o processo de Dilma só segue para o Senado se o impeachment for aprovado por dois terços dos deputados. A estratégia passa, também, pela necessidade de um quórum mais elevado. Para se ter uma ideia, parlamentares experientes calculam que, na aprovação de emendas constitucionais por 308 votos, a margem de segurança é de, no mínimo, 490 deputados em plenário. Processos de impeachment são aprovados com 342 votos.

Para aliados do vice-presidente Michel Temer, o resultado expressou quase que fielmente os cálculos internos feitos antes da votação. “Foi o melhor resultado entre aqueles que esperávamos conseguir. É bom lembrar que essa comissão foi montada com base nas regras, definidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que beneficiavam o Planalto”, disse o deputado Jutahy Júnior (PSDB-BA).

O tucano estima que a oposição tenha, hoje, aproximadamente, 330 votos em plenário, em um universo de 60 parlamentares ainda indecisos. “O resultado demonstra a fragilidade da defesa da presidente da República. Ela cometeu crime de responsabilidade previsto na Constituição e terá a admissibilidade de seu processo de afastamento aprovado, segundo determina a mesma Constituição”, afirmou o presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves (MG).

Já o chefe do gabinete da presidente Dilma, ministro Jaques Wagner, que, ao lado do ministro Ricardo Berzoini (Secretaria de Governo) e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tem sido um dos principais estrategistas para salvar Dilma, também afirmou que o resultado de ontem estava dentro do esperado. “Nossa conta era de 27 a 31, 32. Mas os 27 eram dentro até porque representam 41,5% da comissão. No plenário, dariam 213 votos. Em alguns momentos, tenho falado que nossa conta varia entre 207, 208”, calculou Wagner. “Eles pregam o golpe dissimulado e podem comemorar número, mas não dá o resultado que gostariam. Vamos continuar trabalhando até o dia da votação em plenário”, afirmou.

Wagner afirmou que a presidente Dilma Rousseff recebeu com tranquilidade o resultado e que “agora é hora de trabalhar”. “Os 27 deputados que considero heróis da democracia porque reconheço mais que defensores governo”, afirmou Jaques Wagner.

 

QG em hotel

O resultado aumenta ainda mais a pressão nos três dias que antecedem o início dos debates do impeachment, previstos para começar na próxima sexta-feira (leia mais na página 4). O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva montou um quartel-general no Hotel Royal Tulip e, quando não está participando de atos públicos como os realizados na noite de ontem, no Rio, se entrincheira para conversas individuais com parlamentares de diversas legendas na expectativa de garantir o mínimo de 171 votos favoráveis a Dilma.

Já a oposição seguirá pressionando os indecisos. Mas o vazamento de um áudio ontem (leia mais na página 5) na qual o vice-presidente já discursou como se o impeachment tivesse sido aprovado pode embolar os planos. “Vamos evitar usar o WhatsApp para divulgar nossa estratégia”, ironizou um aliado do vice-presidente.

Além da batalha pelos votos em plenário, ainda paira no ar o risco da judicialização, já que o advogado-geral da União, ministro José Eduardo Cardozo, apontou uma série de irregularidades que teriam sido cometidas ao longo do processo de impeachment.

O presidente da comissão especial, deputado Rogério Rosso (PSD-DF), defendeu o trabalho do colegiado. “Diferentemente de 1992 (impeachment do ex-presidente Fernando Collor de Mello), em que a comissão se reuniu apenas nove horas e não promoveu debates e esclarecimentos, fizemos mais de 50 horas de reuniões e debates, dando oportunidade de ampla defesa à presidente”, afirmou.

 

342

Quantidade de votos necessários para que o pedido de afastamento de Dilma seja aprovado em plenário

 

Frases

"Eles pregam o golpe dissimulado e podem comemorar número, mas não dá o resultado que gostariam. Vamos continuar trabalhando até o dia da votação em plenário”

Jaques Wagner, ministro da chefia de gabinete de Dilma

 

"Diferentemente de 1992 em que a comissão se reuniu apenas nove horas e não promoveu debates e esclarecimentos, fizemos mais de 50 horas de reuniões e debates, dando oportunidade de ampla defesa à presidente”

 

Rogério Rosso (PSD-DF), presidente da comissão especial

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Eleições em pauta

 

Animados com o resultado da pesquisa Datafolha divulgada no último domingo mostrando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à frente nas pesquisas de intenção de voto para o Palácio do Planalto em 2018, o governo começou a reconhecer ontem a hipótese da realização de eleições gerais após a batalha contra o impeachment da presidente Dilma Rousseff.

“O governo não pode ignorar a proposta”, confirmaram aliados da presidente Dilma. Porém, se a ideia avançar, ela será distinta da proposta feita pela presidente da Rede, Marina Silva, que defende eleições apenas para presidente. A própria Dilma já se manifestou sobre isso, afirmando que, “se deputados, senadores e governadores toparem também encurtar os próprios mandatos, ela concordaria em discutir o assunto”.

O Correio mostrou, no domingo, que o Presidente do SenadoRenan Calheiros (PMDB-AL), pediu ao senador Walter Pinheiro (sem partido-BA) que estudasse a elaboração de um projeto de lei para a convocação de um plebiscito sobre o tema. A ideia é que, no primeiro turno das disputas municipais deste ano, a população seja consultada sobre a viabilidade de uma eleição geral. E, no segundo turno, qual a extensão do pleito — se incluindo apenas a Presidência da República ou todos os demais níveis eletivos.

Adversários de Renan lembram que o desembaraço do peemedebista em fazer a proposta tem duas razões. A primeira é que o filho dele está bem avaliado em Alagoas e poderia se reeleger governador com facilidade. E, no caso do próprio Renan, ele poderia disputar a presidência do Senado, alegando ser uma nova legislatura. (NT e PTL)