Título: Pobreza persiste no DF
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Fonte: Correio Braziliense, 17/09/2011, Opinião, p. 22

Só depois que mais de 18 milhões de brasileiros foram resgatados da pobreza, o Distrito Federal ganhou um retrato da população de baixa renda que habita suas 15 regiões administrativas. E mesmo que apenas tenha sido obtida após a arrumação geral dos últimos anos, não é nada animadora a foto recém-revelada. Embora detenha a maior renda per capita do país, a capital da República ainda tem hoje cerca de 250 mil pessoas, quase 10% do total de moradores, compondo famílias que dispõem, no máximo, de R$ 1.090 (o equivalente a dois salários mínimos) para as despesas mensais.

A situação desses cidadãos é dramática. Apesar de o país estar menos desigual, de a renda média das famílias de menor renda ter crescido 28% acima da inflação entre 2004 e 2009, de a expansão econômica ter proporcionado a abertura recorde de empregos formais, de o governo apoiar os menos favorecidos com programas como o Bolsa Família, essa gente segue excluída. Desamparada, sofre as consequências, sobretudo, do analfabetismo e da baixa qualificação profissional, que se perpetuam de geração em geração.

O inédito Perfil da População de Baixa Renda do DF, traçado pela Companhia de Planejamento (Codeplan) do Distrito Federal, revela, por exemplo, que menos de um quarto (22,9%) dos jovens de 20 a 24 anos situados nesse nível social concluiu o ensino médio. Resultado: quase metade deles, 49%, não trabalha ¿ 38% dos quais tampouco estão em sala de aula. Na faixa dos 25 aos 29 anos, 58,4% não têm ocupação e só 27% estão matriculados em algum curso.

Ou seja, estão em jogo não só o presente e o futuro dessa juventude ¿ em cujo universo só 1,1% conseguiu concluir o ensino superior ¿ como também o de seus descendentes. O círculo vicioso é completo, com a baixa escolaridade e a dificuldade de encontrar emprego se estendendo da adolescência (15 anos) à terceira idade. Aliás, mais de um quinto (20,2%) da população idosa de baixa renda no DF é analfabeta e sobrevive com renda média de R$ 632 mensais.

Programas assistenciais são insuficientes para mudar a realidade. Aos 60 anos, a baiana Joana Pereira, desde 1983 em Brasília, diz ter corrido de colégio em colégio em Ceilândia e Samambaia até concluir o ensino médio. Apesar da superação pessoal, depende da solidariedade alheia para viver, pois a única fonte de renda são R$ 130 recebidos do Bolsa Família. A penúria é tanta que a dona de casa Itis Rocha, 38 anos, 20 dos quais em Ceilândia, revela jamais ter ido ao cinema e não ter dinheiro sequer para comparecer a eventos gratuitos, como ao desfile de 7 de Setembro.

Sem educação de qualidade, inclusive com cursos profissionalizantes, a dignidade das populações mais pobres seguirá precária. E o Distrito Federal está longe de ofertá-la. Prova disso é que somente emplacou uma instituição de ensino ¿ particular, ressalte-se ¿ entre as 100 mais bem colocadas do país na última edição do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), cujo resultado foi divulgado esta semana. Da rede pública local, só duas das escolas que participaram do teste alcançaram nota acima da média geral do DF. A solução para essa vergonha é que aplacará a outra: da pobreza persistente e em grande escala na capital da sétima economia do planeta.