Seminário debate novas formas de censura à imprensa no país

Decisões judiciais e uso de verbas oficiais são citados por debatedores 

BRASÍLIA- Em evento realizado ontem na Câmara, especialistas, professores, parlamentares e jornalistas defenderam a liberdade de expressão e criticaram manifestações de censura à imprensa, como iniciativas da Justiça de suspender publicações jornalísticas e ameaças a profissionais da comunicação. Durante a “10ª Conferência Legislativa sobre Liberdade de Expressão — censura na atualidade: do politicamente correto à intolerância”, profissionais disseram que a censura persiste, ainda que não nos padrões dos anos de ditadura militar, quando textos eram submetidos a censores e redações, fechadas.

— O debate sobre censura nos remete ao censor militar, fardado numa redação de jornal nos anos 60 e 70. Assistimos hoje a diferentes formas insidiosas de censura, algumas presentes no cenário latino-americano e aqui no Brasil. Vão desde o uso de verbas publicitárias oficiais, para pressionar veículos de comunicação e favorecer aliados, à criação, em órgãos de governo, de perfis falsos de jornalistas — disse o jornalista Marcelo Rech, do sistema RBS, um dos mediadores dos debates.

A professora Maria Cristina Castilho Costa, do Observatório de Comunicação e Liberdade de Expressão, da Universidade de São Paulo ( USP), disse que a censura clássica e estatal acabou, mas foi substituída por outra, patrocinada não só por órgãos públicos, mas também privados, e em vários setores:

— Não é o regime (civil ou militar) que define a existência de censura, mas o que é cortado. Que consequência tem para a sociedade aquele veto, aquela intervenção? Nos anos de Juscelino Kubitschek, houve muita censura, foi a época de maior veto em peças teatrais. A censura sempre existiu no Brasil. Antes do teatro, antes do jornalismo, antes da imprensa, das bibliotecas, das universidades. Seja nos governos militares e nos civis, nas ditaduras, nos reinos e nas cidades. Sempre o poderoso teve interesse em controlar e calar a crítica, a informação, o diálogo e a oposição — disse a professora Maria Costa.

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), voltou a afirmar que qualquer tentativa de controle dos meios de comunicação não irá prosperar no Legislativo:

— Praticamos todos os dias o direito constitucional à manifestação livre, que é da atividade parlamentar. A Câmara é um ambiente propício à discussão. É inaceitável a censura travestida de regulação. Essa Casa jamais dará acolhida e repudiará qualquer tentativa que possa resvalar em atitude autoritária — disse Cunha.

O jornalista Mauri Koening, da “Gazeta do Povo”, do Paraná, que já foi alvo de perseguição e ameaça por reportagens com denúncias de esquemas de corrupção que envolviam as polícias Civil e Militar do estado, disse que, se comparado com a ditadura, hoje não se conhecem os inimigos, que enviam ameaças sem se identificar ou aparecer.

— Naquela época (da ditadura) sabia-se muito bem quem era o censor. Era muito bem caracterizado. Hoje, há várias maneiras de censura. Estamos lidando com um inimigo invisível, que sabe quem você é, conhece sua rotina, sua família, sabe onde você anda, sua rotina. Mas você não sabe nada sobre ele. Há um problema sintomático que é a impunidade — disse Koening, que chegou a deixar o país devido a ameças que recebeu por suas reportagens.

“CENSURA GANHA FORMAS SUTIS”

O evento foi realizado pelo Instituto Palavra Aberta e teve apoio de várias associações ligadas a jornais, rádios, TVs e agências de publicidade. A presidente da entidade, Patricia Blanco, disse que, em tempos de efervescência democrática, a censura passa por uma metamorfose e se manifesta de outras formas.

— No regime militar, a censura era ostensiva e truculenta. Hoje, com direito à livre expressão garantida pela Constituição, a censura ganha formas sutis e se impõe via censura judicial, que impede jornais de publicarem matérias. Sem contar ameaças a jornalistas e veículos que, muitas vezes, são impedidos de trabalhar, de cobrir fatos que interessam a toda a população — disse Patricia.