O globo, n. 29838, 17/04/2015. Economia, p. 19

Empréstimo menor e mais caro

Geralda Doca e João Sorima Neto

Caixa volta a aumentar juros do SFH e passa exigir entrada de até 50% do valor do imóvel

A Caixa Econômica Federal reajustou os juros do financiamento à casa própria pela segunda vez este ano. O juro mais alto da Caixa ficou em 9,45% ao ano. O banco também reduziu o limite de empréstimo, o que vai exigir do mutuário uma entrada maior, de até 50% do valor total do imóvel.

Pela segunda vez neste ano, a Caixa Econômica Federal aumentou a taxa de juros do financiamento habitacional. O reajuste de 0,3 ponto percentual, anunciado ontem para todas as linhas, entrou em vigor no início desta semana e atinge os novos contratos enquadrados no Sistema Financeiro da Habitação (SFH) com  recursos da poupança. Segundo o banco, o aumento está em linha com a alta da taxa básica de juros (Selic), atualmente em 12,75% ao ano.

A Caixa também reduziu o limite do empréstimo, o que vai exigir do mutuário uma entrada maior: nos contratos que seguem o Sistema de Amortização Constante (SAC), em que o valor das parcelas começa mais alto e vai caindo ao longo do tempo, o percentual máximo financiado baixou de 90% para 80%Íž quando for aplicada a Tabela Price (em que as prestações iniciais são menores), esse limite foi reduzido ainda mais, de 70% para 50%.

O banco informou que não houve alteração nas taxas e nas condições dos financiamentos com recursos do FGTS, que também fazem parte do SFH, nem do programa Minha Casa Minha Vida. No SFH, os juros são limitados a 12% ao ano e o valor máximo dos imóveis é de R$ 750 mil. “A Caixa reforça que, mesmo com este ajuste, continuará oferecendo as melhores taxas do mercado para imóveis enquadrados no SFH”, informou o banco em nota.

ALTA DE ATÉ R$ 46 MIL NO PREÇO FINAL

Em janeiro, a Caixa já havia reajustado os juros do crédito imobiliário com recursos da poupança e próprios. Com o aumento desta semana, a taxa de balcão (para pessoas que não são clientes do banco) subiu de 9,15% para 9,45% ao ano. O número parece pequeno, mas tem impacto relevante no bolso de quem está fazendo um financiamento imobiliário. Numa simulação feita pelo diretor executivo de Estudos e Pesquisas Econômicas da Anefac, Miguel de Oliveira, para um imóvel de R$ 600 mil, com 20% de entrada (R$ 100 mil) e financiamento de R$ 500 mil pelo prazo de 30 anos, a diferença no valor total pago é R$ 46 mil. É o preço de um automóvel Fox, zero quilômetro, ano 2015. A prestação sobe de R$ 3,9 mil para R$ 4 mil, e o valor total passa de de R$ 1,417 milhão para R$ 1,463 milhão.

— Como são financiamentos elevados e prazos de pagamentos longos, qualquer pequena alteração na taxa de juros tem um impacto forte no valor total pago — disse Oliveira.

Segundo ele, o movimento da Caixa, que atende 70% do mercado de crédito imobiliário, tende a ser seguido pelos concorrentes. Na sua avaliação, a alta na Selic e a pressão inflacionária são os principais motivos para o ajuste nos juros.

A taxa de juros da Caixa mais baixa na modalidade de crédito imobiliário é destinada aos servidores públicos que recebem o salário pelo banco. Neste caso, o percentual subiu de 8,50% para 8,80% ao ano. Para Oliveira, a tendência é que os juros do financiamento imobiliário subam um pouco mais nos próximos meses, já que o BC deverá promover novas altas da Selic, numa tentativa de estancar a alta da inflação. Assim, tanto a Caixa quanto os demais bancos deverão fazer novas elevações por causa da Selic, bem como pela alta da inflação.

— Se os bancos acreditam que a Selic subirá por um período curto e depois retrocederá, não repassam essa elevação ao crédito imobiliário, que é um empréstimo de longo prazo. Mas atualmente a expectativa é que a Selic continue subindo, então haverá o repasse. Além disso, a inflação também acaba fazendo com que os bancos elevem suas taxas — explicou o diretor da Anefac.

O movimento de alta de juros iniciado pela Caixa em janeiro foi repetido pelos bancos privados em fevereiro. Para o analista de bancos da consultoria Lopes Filho & Associados, João Augusto Salles, como a Caixa acaba sendo uma espécie de balizador dos juros do crédito imobiliário, a tendência é que as demais instituições financeiras também elevem suas taxas em breve:

— Desde 2013, quando a Selic começou a subir, a Caixa vinha represando a atualização dos juros do crédito imobiliário, dentro da política anticíclica do governo (feita para estimular a atividade econômica em tempos de crise). O objetivo era evitar queda nos financiamentos, prejudicando um setor que emprega muita gente, como a construção civil. Como as margens são muito apertadas nos financiamentos imobiliários, a pressão de alta da Selic fez com que o banco tivesse que se realinhar ao restante do mercado.

BANCOS NÃO MUDARAM TAXAS

O Bradesco informou que não há alterações nas taxas de juros praticadas atualmente. No banco, a taxa de referência em março para financiamentos do SFH varia de 9,2% a 9,6% ao ano, mais Taxa Referencial (TR). O HSBC informou que os juros dependem do relacionamento com o cliente. No Banco do Brasil, segundo a instituição, a taxa cobrada nos financiamentos do SFH está em 9,9% e não há definição sobre novas alterações. Em janeiro, essas taxas no BB variavam entre 9,4% e 9,6% ao ano.

O Santander relatou que as condições de financiamento imobiliário variam de acordo com o perfil do cliente e seu relacionamento com o banco. Hoje as taxas começam 9,6% ao ano mais TR. Em fevereiro, estavam em 9,1%. O Itaú Unibanco não respondeu. No CrediPronto, uma financeira que é resultado de uma parceria entre o Itaú Unibanco e a imobiliária Lopes, as taxas variam entre 9,2% a 9,6%.

Segundo a analista da agência de classificação de risco Fitch Fernanda Rezende, especializada em construção imobiliária, o cenário para o setor em 2015 é bastante negativo, com o maior endividamento das famílias, resultando em queda na velocidade de vendas de imóveis. Isso já aconteceu em 2014, quando o ritmo de vendas caiu 11%, e deve se repetir em 2015. Além disso, diz, os estoques das incorporadoras estão elevados.

— Num cenário macroeconômico ruim (de inflação alta, juros elevados e crédito mais caro), a demanda por imóveis será mais seletiva — diz Fernanda Rezende.

Ela lembra que o total de distratos (devolução de imóveis comprados na planta, entre outras razões, porque o financiamento é negado) chegou a R$ 7 bilhões em 2014, volume muito elevado.