BRASÍLIA - A estratégia do núcleo político do governo para conduzir a pauta econômica no Congresso contribuiu para a disparada do dólar esta semana e foi considerada desastrosa pela própria presidente Dilma Rousseff. Na quarta-feira, durante uma sessão para a votação de uma série de vetos da presidente, ministros ligaram para senadores afirmando que a derrubada de decisões do Planalto poderia comprometer o plano de ajuste fiscal. Um deles chegou a sugerir que Joaquim Levy deixaria o cargo se o ajuste não passasse no Congresso.

As conversas chegaram ao mercado de câmbio trazendo de volta rumores de que o ministro da Fazenda estaria demissionário — o que contribuiu para pressionar ainda mais as cotações.

‘NOME DE LEVY FOI USADO EM VÃO’

Segundo fontes do governo, esses rumores preocupam a Fazenda, pois têm obrigado Levy a reafirmar em conversas nos bastidores que não está demissionário. Fontes da área econômica afirmaram ontem que nada disso foi combinado com o ministro, e a estratégia acabou sendo um tiro no pé, pois começaram a circular no mercado rumores de que Levy teria pedido para deixar o cargo, o que aumentou a pressão sobre o câmbio. Interlocutores dizem que o ministro teme os efeitos desse cenário sobre a economia. Mesmo assim, por enquanto, não deve haver mudanças na condução da política cambial pelo Banco Central (BC).

 

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Nas conversas com parlamentares, a demissão de Levy teria sido mencionada pelo ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, ao apontar os riscos de o governo não conseguir aprovar o ajuste. A presidente Dilma Rousseff foi avisada das ameaças sobre a demissão de Levy e não gostou. Segundo um ministro próximo à presidente, “o nome de Levy foi usado em vão”, e ela cobrará a atuação de seus ministros.

 

O clima mais tenso entre os emissários do governo e os senadores da base ocorreu na votação do veto de Dilma à prorrogação até 2042 dos subsídios sobre energia elétrica para grandes empresas do Nordeste e também à correção de 6,5% da tabela do Imposto de Renda (IR).

O próprio Joaquim Levy e os ministros Eduardo Braga (Minas e Energia) e Pepe Vargas (Relações Institucionais) lideraram as negociações no Congresso pela manutenção do veto da presidente. Quando o governo percebeu as movimentações de deputados e senadores, mobilizou Braga, que foi para o gabinete do vice-presidente Michel Temer.

Levy telefonou para o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e ambos tiveram uma conversa dura, segundo fontes do governo. Levy cobrou “responsabilidade” de Renan por telefone. Braga entrou no circuito e ligou para Renan, para o líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE), e para o senador Romero Jucá (RR). As conversas também foram tensas. Braga teria dito que a derrubada do veto seria uma “traição” ao governo, que eles estavam agindo de forma “irresponsável” e que todos combinaram que manteriam o veto para, depois, negociar alternativas às empresas.

SEM INTERVENÇÃO NO CÂMBIO

Ao GLOBO, Pepe Vargas contou ter sido acionado pelo líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), quando o PT foi avisado pelo líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani (RJ), de que o partido estava mudando de posição e votaria pela derrubada do veto. Vargas afirmou que jamais falou em demissão do ministro da Fazenda nas negociações do veto com parlamentares. O ministro Eduardo Braga também negou, por meio da assessoria, que tenha levantado a possibilidade de demissão de Joaquim Levy durante as negociações com o Congresso. Mas a informação foi confirmada por interlocutores do ministro.

E, mesmo diante da nova alta do dólar ontem, a equipe econômica considera que seria ineficiente uma intervenção mais efetiva do BC no mercado de câmbio, uma vez que a moeda americana está se valorizando no mundo todo. Por isso, a tendência continua sendo manter o atual programa de leilões de swap cambial, a chamada ração diária, com uma oferta de US$ 100 milhões até 31 de março, quando essa estratégia será reavaliada.

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— O dólar está subindo no mundo todo. Aumentar a ração não adiantaria. Não vai mudar o quadro — disse uma fonte.

Há uma preocupação quanto à escalada do dólar por causa dos impactos na inflação a curto prazo, mas os técnicos lembram que também há efeitos positivos, como melhorar o balanço de pagamentos. Há um certo consenso de que primeiro é preciso estabilizar as contas externas, diante da situação política nebulosa criada com a Operação Lava-Jato, as desconfianças envolvendo a Petrobras e o risco de contaminação para a economia da crise política. Nesse cenário, o Brasil precisa ficar menos dependente do capital externo.

— O dólar mais alto ajuda a melhorar o resultado da balança comercial e a reduzir o déficit da conta de serviços — disse uma fonte da equipe econômica..