Tem sido bastante discutida na imprensa a “estagnação secular” por que estariam passando os países desenvolvidos. Menor atenção tem sido dada para o fato de a economia brasileira estar semiestagnada há 33 anos, apesar de ter uma renda per capita de apenas um terço da média dos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). 

Entre 1981 e 2014, a taxa média de crescimento da produtividade do trabalho no Brasil foi de apenas 0,3% por ano. A conclusão pouco difere se excluirmos da conta, por serem períodos excepcionais, a década perdida de 1981 a 1992 e os anos da bonança externa entre 2004 e 2010: há muito tempo a produtividade do trabalho cresce a não mais do que 0,4% por ano. 

Com essa taxa minúscula de crescimento da produtividade, jamais deixaremos de ser um País de renda média, jamais atingiremos a renda per capita dos países da OCDE. 

Crescimento da produtividade requer empresas com tecnologia, escala, especialização e concorrência. Esses ingredientes somente se conseguem com a integração do país às correntes internacionais de comércio. Pois, apesar de o Brasil ser o sétimo maior PIB (Produto Interno Bruto) do mundo, tem apenas 3,3% do PIB mundial: 96,7 % do mercado global está fora das fronteiras brasileiras.

Os países que conseguiram entrar no primeiro mundo após a 2.ª Guerra Mundial o fizeram integrando-se com a economia mundial. Os tigres asiáticos e Israel se desenvolveram com exportações industriais; os países da periferia europeia com exportações de serviços inclusive de mão de obra; Austrália, Noruega e Nova Zelândia com a exportação de commodities. 

Cada grupo a sua maneira, explorando suas respectivas vantagens comparativas, mas todos com uma característica comum - uma forte integração ao comércio internacional. 

Em contraste, o Brasil é uma das economias mais fechadas ao comércio exterior do mundo. Grandes economias são grandes exportadoras. Os seis países com PIB maior do que o Brasil - Estados Unidos, China, Japão, Alemanha, França e Reino Unido - são também os seis maiores exportadores mundiais. O Brasil é apenas o vigésimo segundo. Um gigantinho em termos de PIB, somos um anão em termos de exportações - apenas 1,3% do total mundial.

O que se observa nas exportações nacionais repete-se nas importações. A participação das importações no PIB brasileiro é de apenas 13% (dados de 2012). Trata-se do menor valor entre todos 176 países considerados pelo Banco Mundial. Apenas não podemos dizer que o Brasil é o país mais fechado do mundo porque não há dados para a Coreia do Norte - que aparenta ser mais fechada ao comércio do que o Brasil! 

Investimento. O curioso é que, sendo fechado para o comércio, o Brasil é extremamente aberto para o investimento externo direto. Éramos até há pouco tempo a 4ª destinação mais preferida pelas multinacionais, atrás somente dos EUA, China e Hong Kong. 

O problema é que as multinacionais vêm aqui não para exportar como o fazem na Ásia, mas para substituir importações aproveitando-se do mercado interno protegido. Elas lucram com isso, mas a economia como um todo pode sair perdendo, pois a substituição de importações faz o câmbio apreciar e, assim, tende a reduzir as exportações do país. Paradoxalmente, a abertura para o investimento estrangeiro, na forma em que ela é feita no Brasil, pode estar contribuindo para diminuir o volume de comércio exterior do país. 

A política industrial do governo vai na contramão da integração do País ao comércio mundial. Tarifas elevadas sobre bens de produção. Barreiras difíceis de transpor aos serviços importados complementares à produção industrial. 

Ausência de acordos comerciais com os principais parceiros no primeiro mundo. Requisitos exagerados de conteúdo local, que aumentam os custos da indústria. Preferências excessivas para compras do governo no mercado local. A lista poderia continuar. 

Mas há esperança que essa política de avestruz possa ser revertida no futuro próximo. A esperança vem de três constatações incontornáveis. 

A primeira é o desempenho econômico pífio no último quadriênio, em que houve uma diminuição de 2% na produtividade total do trabalho e do capital. Os “pibinhos” não se deveram à falta de demanda, pois há pleno emprego. Também não foi por falta de capital, pois o investimento apesar de baixo esteve dentro da média histórica. O que houve foi a destruição da produtividade pelas políticas econômicas introvertidas e intervencionistas do último quadriênio. 

Em segundo lugar, corremos o risco de nos isolar ainda mais do mundo. Além do Acordo do Transpacífico, está em curso a proposta de um amplo entendimento comercial entre os EUA e a União Europeia. Esses acordos nos deixarão à margem dos principais mercados mundiais.

Em terceiro lugar, há o escândalo da Petrobrás. À parte de suas implicações éticas e políticas, esse escândalo desvenda o extraordinário potencial de corrupção de uma política industrial fundada no monopólio estatal, na reserva de mercado e nos requisitos exagerados de conteúdo nacional.

O Brasil está numa encruzilhada. Ou mantemos o protecionismo e continuamos a retroceder como ocorreu nos últimos quatro anos. Ou nos integramos ao resto do mundo e contemplamos a possibilidade de nos tornar um país plenamente desenvolvido. 

 

Está na hora de o Brasil acordar

 

A recente crise da Rússia deveria soar como sinal de alerta para o atual governo, que, nas últimas semanas, tem sido refém de uma comunicação esquizofrênica decorrente de dois projetos conflitantes. O anúncio do novo ministro da Fazenda sinalizou uma ruptura com o discurso da campanha, e a opção por um forte ajuste fiscal. Por outro lado, diariamente, fontes oficiais garantem o cumprimento de compromissos assumidos que agravam o quadro fiscal. 
 
O equilíbrio das contas públicas e o controle da inflação são essenciais para retomar o crescimento econômico e reduzir os riscos de uma grave crise econômica. 
 
Em 2003, o País viveu um momento difícil, com baixa credibilidade da política econômica, e optou por um severo ajuste fiscal, uma política monetária voltada à convergência da inflação ao centro da meta, seguida de reformas destinadas a melhorar o ambiente de negócios.
 
À época, muitos defendiam fazer exatamente o oposto. O ajuste fiscal seria danoso para o crescimento, e a taxa de juros deveria ser reduzida para estimular a atividade. Vários, inclusive, utilizavam os exemplos da Argentina e da Venezuela para exemplificar a possibilidade de uma via alternativa, que evitasse os ajustes e retomasse o crescimento.
Ao contrário do previsto pelos críticos, em poucos meses, a economia se recuperou e voltou a crescer. A política econômica foi essencialmente preservada até a crise de 2008, e o País, beneficiado pelo cenário externo, experimentou anos de elevado crescimento e queda da desigualdade de renda. 

 

Argentina e Venezuela, por outro lado, ainda mais beneficiadas pelo cenário externo do que o Brasil, assistiram a lenta degradação da estrutura econômica, resultando em graves retrocessos sociais e o comprometimento da capacidade de crescimento e geração de renda para os próximos anos. O experimentalismo da via alternativa condenou-os a terminarem mais pobres do que começaram.
 
A partir da crise de 2008, o Brasil alterou a política econômica, fragilizando a política fiscal e o compromisso com o centro da meta de inflação, cujo resultado tem sido desapontador.
O Brasil tem crescido menos do que o resto do mundo, menos do que a média dos países emergentes e da América Latina, e, no último ano, menos do que os Estados Unidos, onde a crise começou. A atual política econômica prejudicou o crescimento, a redução da desigualdade de renda, estagnada desde 2011, e coloca em risco os ganhos sociais das últimas duas décadas.
 
Entre os principais países emergentes, crescemos apenas mais do que a Rússia, que enfrenta um grave conflito militar, estagnação da economia e, nesta semana, uma grave crise, com forte desvalorização do câmbio, e escalada das taxas de juros. 
 
Brasil e Rússia têm em comum o fato de serem duas grandes economias emergentes estagnadas. Existem, no entanto, diferenças importantes entre os dois países. A Rússia tem sido bem mais afetada pela piora dos termos de troca, enquanto a nossa elevada dívida bruta, em parte indexada à Selic, e o desequilíbrio fiscal implicam grandes desafios para a política econômica. A crise desta semana apenas ilustra o risco de uma súbita piora em uma economia fragilizada.
 
Na década passada, o equilíbrio fiscal e a inflação no centro da meta garantiram maior solidez à nossa economia, que se tornou menos vulnerável às oscilações dos mercados externos em comparação com os anos 1990. 
 
A política econômica adotada no atual governo reverteu os ganhos do passado. A opção por negar as dificuldades, evitando o ajuste quando necessário, agravou as dificuldades, a magnitude da correção de rumo e os riscos de fracasso. As taxas de juros, o mercado de ações, e a taxa de câmbio têm se tornado cada vez mais sensíveis ao cenário externo e a possibilidade de uma crise tem sido ampliada pela crescente fragilidade da nossa economia.
 
Um ajuste fiscal crível reduz a chance de que passemos por dificuldades semelhantes às enfrentadas pela Rússia, além de contribuir para o controle da inflação e auxiliar na melhora das contas externas. 
 
O forte ajuste que deve ser realizado, em decorrência da deterioração das contas públicas e dos indicadores econômicos, requer um projeto claro de governo, até porque vai na contramão do que tem sido feito pelo atual governo e do prometido na campanha.
 
A alternativa seria continuar com a esquizofrenia atual e esperar os resultados. Afinal, já estamos a fazer o mesmo com a oferta de água e de energia. O populismo garante ganhos fáceis no curto prazo. As consequências, porém, eventualmente se manifestam, e seus efeitos podem ser graves e duradouros.