Título: À espera de ajuda
Autor: Silveira, Igor; Kleber, Leandro; Rizzo, Alana
Fonte: Correio Braziliense, 03/06/2011, Política, p. 2/3

A menos de um quilômetro do Palácio do Planalto, onde a presidente Dilma Rousseff lançou o Brasil sem Miséria, dezenas de pessoas vivem sem a renda mínima exigida para receber os benefícios do programa. A pobreza é tão extrema que nem mesmo sabem se ganharão algum dinheiro para garantir a comida do dia seguinte. Eles estão atrás do Congresso, próximos à Universidade de Brasília (UnB) ou espalhados por entre barracos na periferia, não muito longe do poder. Não sabem nada sobre a nova iniciativa de governo. Mas esperam ser atingidos pela medida, de preferência no curto prazo.

"A situação é feia", diz Viviane Lau de Araújo, moradora de uma invasão atrás da garagem do Senado. Com 30 anos e cinco filhos, ela lamenta a situação em que vive desde 1988, quando deixou Irecê (BA) e veio com a família para Brasília. Moradora de um dos barracos existentes no local, ela também lamenta ter perdido o Bolsa Família por uma "causa desconhecida", cuja renda dava para comprar alguma coisa para a garotada, que, como os outros vizinhos, vive de catar objetos recicláveis. ¿A renda das pessoas aqui varia de R$ 10 a R$ 500, dependendo do que conseguir no dia¿, explica a presidente da Associação dos Catadores da Garagem do Senado, Maria do Socorro Celestino de Souza.

O mesmo problema é vivido por três mulheres que, apesar da dura vida que levam, fazem questão de esconder a tristeza. Francinete da Conceição, Maria das Dores Figueiredo e Luzineide de Moraes contam que tiram mensalmente entre R$ 30 e R$ 300, dinheiro que muitas vezes é gasto com os serviços públicos. "Tudo que ganho é para pagar a luz e água da casinha que tenho em Brazlândia¿, comenta Maria das Dores. "A sorte é que sempre aparece um filho de Deus para dar alguma ajudazinha¿, acrescenta ela, que por causa dos problemas de coluna, fica "no barraco, próximo a UnB, cuidando do material reciclável recolhido pelo marido Cosme Almeida dos Santos e pelas duas amigas.

Luzineide deixa as brincadeiras de lado e chora quando começa a lembrar do passado. "Cheguei a guardar o pó de café usado para poder coar no dia seguinte", lamenta a cearense, uma das poucas pessoas que reconhece que vive na miséria. Já Francinete fala pouco, mas faz questão de mostrar as mãos calejadas de tanto puxar os carrinhos com material recolhido na cidade. Assim como as outras, ela lamenta a vida que levam e do baixo valor que ganham, além da falta de perspectivas. Mas as três têm esperança de serem incluídas no programa Brasil sem Miséria. Sem saber se poderão contar com algum dinheiro para comer no dia seguinte, elas e várias pessoas que vivem de rendimentos inconstantes, em Brasília só tem um desejo: voltar para a terra natal e melhorar de vida.

Para sobreviver com pouco dinheiro vale tudo, como vender boró, uma larva que é usada como isca em pescarias. Em períodos de calor, Antonio Pereira da Silva consegue algum dinheiro com pescadores que aparecem em seu barraco, na L4 Norte, onde também junta material reciclável. O cearense de 68 anos trabalhava em uma fazenda, mas há dois anos veio para a cidade à procura da aposentadoria que ainda não conseguiu. Manuel Barbosa da Silva, de 76 anos, teve mais sorte. Ele recebe um salário mínimo como aposentado, mas o dinheiro mal dá para comprar os remédios que precisa para controlar o diabetes e a pressão.