Título: Apuração na Bolívia deve demorar mais de uma semana
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Fonte: Gazeta Mercantil, 11/08/2008, Internacional, p. A12

A apuração dos votos do referendo revogatório de ontem na Bolívia vai demorar pelo menos uma semana, informou o chefe da Justiça eleitoral, acrescentando que será impossível interpor recurso contra o resultado. "Não deveria haver confusão nem incerteza, há regras claras", disse o presidente da Corte Nacional Eleitoral (CNE), José Luis Exeni, em entrevista coletiva. Por lei, a CNE tem até 21 dias para publicar os resultados oficiais, mas acha que pode fazer isso em "7 a 10 dias", e espera divulgar boletins parciais a partir dos dados totalizados pelos tribunais eleitorais departamentais. A continuidade dos mandatos do presidente Evo Morales e de oito dos nove governadores está em jogo na votação, para a qual foram chamados cerca de 4,4 milhões de eleitores. Uma vitória expressiva de Morales lhe daria legitimidade para superar a crise política e promover uma nova Constituição e outras reformas de caráter socialista. Mas na Bolívia tomada por protestos pró e contra o governo, intensificados por divisões raciais e econômicas, poucos acreditam que o referendo vá restaurar a tranqüilidade no país. A campanha tem sido tensa e observadores - cerca de 300 observadores internacionais e mais de 4 mil nacionais - temem que polêmicas sobre as regras da votação possam gerar protestos violentos. Morales precisa de 46,3% dos votos, mas oito governadores regionais precisam de mais de 50% para manter seus cargos. Pesquisas mostram que Morales mantém a popularidade alta e deve conseguir os votos suficientes para permanecer no poder, o que legitimaria suas reformas socialistas, que incluem reforma agrária e estatização parcial da economia. "Se eles nos ratificarem, a primeira coisa que eu vou fazer é marcar uma reunião com todas as autoridades que foram ratificadas, ou novas autoridades, para chegar a um consenso", disse Morales no sábado. Primeiro indígena a presidir a Bolívia, Morales tenta aprovar uma Constituição que dará mais poderes ao seu povo, após séculos de discriminação. Com o referendo, ele espera enfraquecer os governadores que exigem mais autonomia e uma maior parcela dos impostos que vão a La Paz, especialmente sobre a extração de gás. ""Meu desejo, meu sonho é que haja uma grande unidade do povo boliviano, frente às intenções separatistas, saúdo a esse povo boliviano, que luta por sua igualdade, por sua identidade e sobretudo pela unidade", disse ontem, em alusão aos movimentos de autonomias regionais alimentados pela oposição direitista, depois de votar em uma escola da Vila 14 de Setembro, na região cocaleira central de Chapare, onde nasceu para a vida sindical e política. Em Cochabamba, um dos governadores de oposição, o governador local, Manfred Reyes Villa criticou a consulta. O referendo revogatório sobre os mandatos do presidente Evo Morales e de oito governadores regionais da Bolívia "vai polarizar o país e é inconstitucional", disse Villa, que promete contestar o pleito se o resultado lhe for negativo. Oito dos nove governadores foram submetidos ao referendo. A maioria deve permanecer no cargo, inclusive alguns direitistas. A oposição a Morales se concentra em quatro regiões com vastos campos de gás natural e rica agricultura. "Este evento é totalmente inconstitucional. Vou continuar sendo governador a despeito do resultado", disse Reyes Villa, um dos dois ou três que as pesquisas apontam como ameaçados de perder o cargo. Eleito em 2005, Reyes diz que só a convocação de uma eleição geral resolveria os problemas do país.