Título: Aliados do Planalto querem votar emenda até o final do ano
Autor: Paulo de Tarso Lyra
Fonte: Gazeta Mercantil, 31/08/2004, Política, p. A-11

O cronograma para votação da emenda da reeleição para as Mesas diretoras do Congresso já está desenhado na cabeça dos aliados do presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), e do Senado, José Sarney (PMDB-AP). A idéia é votar a emenda original em dois turnos na Câmara, em outubro, e decidir a questão no Senado, também em dois turnos, até o fim do ano.

O problema não é o prazo, mas o xadrez político que precisa ser jogado até lá. O líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL), mantém-se irredutível no seu plano de presidir a Casa. O governo apóia a reeleição e pretende trabalhar por ela, mas teme complicar ainda mais a relação com o Senado. "A questão é como solucionar o impasse sem derrotados. Para o governo, não interessa aprovar a reeleição e levar Renan para os braços da oposição", diz um aliado governista.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva escalou o ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo, para sondar Renan. Defensores da reeleição afirmam que o líder do PMDB pode herdar um ministério - especula-se inclusive que poderia ser a pasta da Integração Nacional. "Se pensarmos que haverá a Transnordestina e a transposição das águas do São Francisco, esta pasta torna-se bastante atraente", confidenciou um aliado de Sarney.

Renan, no entanto, não parece atraído pela proposta. Em conversa com aliados, lembra que ministro ele já foi - durante o governo Fernando Henrique Cardoso, ocupou a pasta da Justiça. E que o grande avanço político seria, de fato, presidir o Senado antes dos 50 anos. Ele tem 48. "Eu vou até o fim nessa história. Se preciso for, vou até o Supremo Tribunal Federal", ameaça o peemedebista.

Esses argumentos foram expostos a Aldo. Renan deixou claro que não aceitava intermediários nesse debate. Avisou que só há duas saídas: ou se reúnem todos os envolvidos no acordo que elegeu Sarney presidente do Senado no ano passado ou o próprio Lula teria que conversar com ele sobre a questão. "Eu não posso recuar, pois seria um sinal de enfraquecimento", acrescentou. Ele lembra que já abriu mão para Sarney, no ano passado, quando o governo empenhou-se para eleger o preferido de Lula como presidente do Senado.

O cenário ainda está muito incerto. Tanto que os sinais políticos emitidos são vistos de forma diversa pelos dois lados envolvidos na disputa. A presença ostensiva de Aldo nas negociações é encarada como a certeza do convencimento de Lula quanto a reeleição de Sarney e João Paulo.

O presidente da Câmara cogitou tocar a emenda da reeleição ainda em setembro, durante a semana do esforço concentrado. Desistiu, com medo do quorum baixo inviabilizar a tentativa. "É preciso ter pelo menos 460 deputados em plenário, para que haja segurança na votação", diz um interlocutor de João Paulo.

Os números de votos no PMDB também são um fator de discórdia inflamável. Pessoas muito próximas de Sarney refutam com veemência as afirmações de que o atual presidente do Senado não tenha número para vencer a disputa interna na bancada. "Ele tem pelo menos 12 senadores, em um grupo de 23", contabilizam.

Na guerra de palavras, Renan não se intimida. Desdenha da contabilidade feita por Sarney e desafia. "Se ele tem maioria, por que não convoca a reunião da bancada? Se o governo acha que a reeleição passa, por que não vamos para o voto logo? Depois, a gente descobre quem estava mentindo".

A obsessão em torno do assunto é tanta que contaminou até a discussão do reajuste de 15% para os servidores do Legislativo. O Sindlegis, que representa a categoria, queria 28,81%, mas acabou contentando-se com um percentual menor. Por lei, reajuste para os servidores não precisa ser repassado aos parlamentares, embora existam rumores de que isto será feito, para agradar deputados e senadores indispostos com a reeleição.

O presidente do Sindlegis, Exequiel Nascimento, assustou-se com o episódio e decidiu adiar a reunião que teria hoje com Sarney. "Vamos deixar a poeira abaixar. Eu sou representante dos servidores, não de deputados e senadores", definiu.