Título: Custo da inércia é alto demais
Autor: Paulo Godoy
Fonte: Gazeta Mercantil, 22/10/2004, Opinião, p. A-3

O crescimento será limitado pela falta de investimento. Há riscos de o Brasil perder, novamente, uma cadeira em um novo ciclo de crescimento econômico mundial. A economia brasileira crescerá em 2004 e 2005, mas menos que os países emergentes. O crescimento será limitado porque a realidade de investimento, em queda, está distante da necessidade. O investimento não ocorre no volume adequado porque a solução dos problemas não avança no ritmo esperado. O País do futuro parece ainda amarrado aos insucessos do passado.

O clima para investimentos no Brasil foi considerado o pior entre 53 nações pobres ou em desenvolvimento em estudo do Banco Mundial, realizado junto a 30 mil empresários. O conjunto de defeitos faz parte da história do País há muito tempo: instabilidade de regras, carga tributária excessiva, insuficiência de financiamento e legislação trabalhista que onera demasiadamente os negócios.

Diante de outras nações, o Brasil está febril. Na visão dos empresários nacionais, há aqui um cenário muito ruim para os negócios: 87% consideram elevada a carga tributária. Esse item é um obstáculo para 36,8% dos chineses e para 27,9% dos indianos. Da amostra, 75,9% dos brasileiros vêem instabilidade nas regras (32,9% na China e 20,9% na Índia), 71,7% deparam com dificuldade em financiar projetos (22,3% na China e 19,2% na Índia) e 56,2% apontam custos trabalhistas excessivos (20,7% entre chineses, 16,7% entre indianos).

Se o ambiente para negócios é ruim, o investimento não ocorre no volume adequado. Os setores público e privado aplicaram, em infra-estrutura, US$ 20 bilhões em 2001. Desde então, os aportes despencaram para US$ 14,3 bilhões em 2002 e US$ 6,6 bilhões em 2003. Este ano a expectativa era que o setor recebesse US$ 10,1 bilhões. Infelizmente, não vai. A última previsão, mais realista em relação ao atual tempo econômico e político brasileiro, aponta para US$ 8 bilhões, quilometricamente distante dos US$ 20 bilhões anuais necessários.

A infra-estrutura é a locomotiva do crescimento econômico. Transformar tal certeza em ceticismo tem um preço. Se o Brasil tivesse uma malha de transporte e energia equivalente à média de sete países latino-americanos, a economia nacional seria 7,6% maior (R$ 198,5 bilhões a mais). Quando comparado à Coréia, exemplo de competitividade, o Brasil teria um PIB 16,7% maior (R$ 433,6 bilhões a mais). Os dados fazem parte de um amplo cálculo feito pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).

A letargia em agir resulta em crescimento menor. Segundo o FMI, o País deve crescer este ano e em 2005, mas menos que a média mundial, dos países africanos e dos emergentes. Enquanto a economia nacional deve ser incrementada em 3,5% em 2005, o mundo (4,3%), a África (5,4%), a Europa emergente (4,8%) e a Ásia emergente (6,9%) avançarão mais rápido. Em 2004, o crescimento de 4% daqui continua abaixo das médias esperadas para as economias de lá. O Brasil, crescendo menos que os pares, corre o risco de se tornar um país imergente. Sempre em comparação aos pares emergentes.

Chorar e rezar não leva a lugar nenhum. É preciso retomar a implementação dos consertos estruturais para melhorar o ambiente de negócios do Brasil. As reformas tributária e trabalhista são urgentes. Na infra-estrutura, a criação de um arcabouço regulatório estável, claro e atrativo à iniciativa privada para todos os setores faz hora extra na pauta de pendências. Os gastos públicos há décadas precisam ser alvo de um choque de gestão, eficiência e foco. Houve avanços importantes, mas a estrada é longa demais, com pedras demais. O custo de qualquer inação ou anomia é alto: expectativas de crescimento e de empregos menor.

kicker: O Brasil, em comparação aos emergentes, corre o risco de se tornar um país imergente