Título: Alta generalizada na importação reduz saldo
Autor: Galvão, Arnaldo
Fonte: Valor Econômico, 04/03/2008, Brasil, p. A4

O saldo da balança comercial caiu para US$ 882 milhões em fevereiro, pressionado pelo aumento de 56,2% na média diária das importações. É o pior resultado mensal desde janeiro de 2002. No mês passado, as exportações foram de US$ 12,80 bilhões e as importações chegaram a US$ 11,92 bilhões. Considerando os dois primeiros meses do ano, o superávit é de US$ 1,82 bilhão, valor 66,2% menor que o do mesmo período em 2007.

Em janeiro e fevereiro, as importações tiveram expressivas elevações em todas as categorias de produtos. Pelas médias diárias, as compras de bens de capital aumentaram 57,4% sobre as do primeiro bimestre de 2007. No grupo das matérias-primas e produtos intermediários, o crescimento foi de 53,4%. Nos bens de consumo, o salto foi de 46,2% e as importações de combustíveis e lubrificantes ficaram 37,2% maiores.

Na avaliação do secretário de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Welber Barral, o saldo dos primeiros meses do ano reflete, além do aquecimento da demanda interna e da renovação do parque industrial brasileiro, "oscilação momentânea" alimentada pelo aumento do preço do petróleo e pelas elevações das importações de automóveis e trigo da Argentina. Ele desconsidera a possibilidade de déficit comercial em 2008.

Barral confirma a elevação da meta de exportação do país de US$ 172 bilhões para US$ 180 bilhões. Se isso ocorrer, o crescimento será de 12,5% sobre o valor verificado em 2007.

Na perspectiva da equipe econômica do Bradesco, o ritmo de crescimento das importações está muito forte e poderá ultrapassar os 32% verificados no ano passado. A produção industrial está impulsionando a compra de bens de capital e intermediários. No lado das exportações, o banco também reconhece que os aumentos das cotações das commodities prometem bom desempenho neste ano, principalmente com minério de ferro, complexo soja, papel/celulose e carnes. O saldo comercial esperado é de US$ 29,3 bilhões.

Para o economista da RC Consultores, Fábio Silveira, os resultados comerciais dos dois primeiros meses do ano são "imprestáveis" para projeções, porque não contam com os significativos embarques das commodities agrícolas, cujas cotações internacionais estão cada vez maiores. A partir de março, começam a ser contabilizadas as vendas do complexo soja. Em maio, iniciam-se as exportações de açúcar. Além disso, ele comenta que há escassez de carnes no mercado, o que deve neutralizar as restrições da União Européia.

Como exemplo, Silveira cita as exportações de grão, óleo e farelo de soja, que devem render US$ 19,5 bilhões, valor bem superior aos US$ 12,8 bilhões do ano passado. Para ele, os reajustes do minério de ferro também vão acrescentar US$ 4 bilhões às contas da balança comercial. O saldo previsto pela RC para 2008 deve ser de, no mínimo, US$ 35 bilhões, resultado de exportações de US$ 173 bilhões e importações de US$ 138 bilhões.

Cenário mais pessimista é esperado pelo economista Marcelo Carvalho, do Morgan Stanley. Seus cálculos apontam para saldo de US$ 20 bilhões, metade do superávit em 2007. Ele pondera que as exportações vão bem, com expansão perto dos 20%, mas as importações elevam-se 56% nos dois primeiros meses deste ano. "Espero uma balança frustrando expectativas. Ainda não há sinal do desaquecimento mundial sobre as exportações, mas as importações estão surpreendendo com ritmo bastante forte puxado pela demanda doméstica e pelo real valorizado", justifica.

Carvalho ressalta que, três meses atrás, a projeção de saldo de US$ 20 bilhões estava totalmente fora do consenso, mas diz que isso está mudando. O economista do Morgan Stanley trabalha com uma cotação de R$ 2,00 para o dólar em dezembro, o que, segundo ele, revela o fim do ciclo extremamente favorável da economia mundial nos últimos cinco anos. Esse preço do dólar significa a volta ao patamar do segundo trimestre do ano passado, mas os "benefícios" para as exportações somente serão sentidos em 2009.

O cenário previsto por Carvalho considera recessão nos Estados Unidos e Japão e desaceleração na Europa. No Brasil, ele acredita que o atual aquecimento interno tende a convergir para esse ambiente internacional mais deteriorado.

Para o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), o maior crescimento da economia e um novo salto de investimentos estão na base dessa "explosão" das importações. Mas pondera que esse aumento das compras também foi muito estimulado pela magnitude e pela velocidade da valorização do real frente ao dólar. Em pouco mais de um ano a moeda brasileira valorizou-se cerca de 20%. Portanto, as reações dos empresários para defender sua competitividade levaram a uma forte e rápida substituição de produtos domésticos por importados.

O governo informa que as exportações das três categorias de produtos tiveram valores recordes para meses de fevereiro. Na comparação com o mesmo mês em 2007, os embarques de manufaturados cresceram 15,1%. Nos básicos, o aumento foi de 23,7% e, nos semimanufaturados, o salto foi de 20,9%. Entre os manufaturados, as maiores altas ocorreram nas vendas de gasolina (353,7%), aviões (128,6%) e álcool etílico (61%).