Título: Acer lidera em laptops sem fabricar no país
Autor: Borges, Andre
Fonte: Valor Econômico, 15/02/2008, Tecnologia & Telecomunicações, p. B2

A fabricante de computadores Acer, de Taiwan, não tem fábrica no Brasil. Também não tem um parceiro que produza suas máquinas localmente. Não tem um diretor ou gerente fixo que resida no país. Ainda assim, é ela a companhia que tem sacudido o mercado de computadores do Brasil e enfurecido os principais concorrentes do setor. A trajetória recente da companhia ajuda a entender por quê.

A Acer, há pouco mais de três anos, figurava em um apagado 5º lugar no ranking dos maiores vendedores de laptops no país. Esse papel de coadjuvante, porém, durou pouco tempo. De 2005 para cá a venda de seus portáteis explodiu. Mês a mês a empresa galgou uma nova posição até que, no terceiro trimestre do ano passado, conseguiu assumir a liderança da venda de notebooks no país, segundo a consultoria IDC. No quarto trimestre, conforme estudo que deve ser divulgado nos próximos dias, a companhia perdeu a liderança para a Positivo Informática por uma diferença desprezível, inferior a 1%, mas se considerado o balanço total de 2007, foi a Acer a empresa que mais vendeu portáteis no país.

A liderança chegou acompanhada de uma boa dose de indignação dos concorrentes. A Acer segue hoje um caminho exatamente oposto ao trilhado pelos demais. Há anos, companhias como Dell, HP e Lenovo - para citar apenas as multinacionais - montaram fábricas próprias no país ou, pelo menos, terceirizaram sua produção com fabricantes locais. A Dell, por exemplo, injetou R$ 130 milhões na construção de sua fábrica em Hortolândia, no interior paulista. Não há mistérios em iniciativas como essa, o objetivo é simples: ganhar agilidade no abastecimento ao mercado e gozar de benefícios fiscais garantidos por regras como o Processo Produtivo Básico (PBB) e a Lei do Bem. "É claro que produzimos aqui porque conseguimos chegar a um preço mais competitivo, senão importaríamos nossas máquinas, sem dúvida", diz um executivo do alto escalão de uma multinacional.

Hélio Rotenberg, presidente da Positivo Informática, afirma: "Não tem como ser competitivo nesse segmento sem fabricar no país, e ponto final." Segundo o executivo, a isenção de tributos como Imposto de Importação, IPI e ICMS ajuda a reduzir o preço entre 30% e 40% em relação à máquina importada.

Rotenberg não fala sobre as razões que garantem competitividade aos produtos da Acer. Executivos do setor, porém, argumentam que a Acer estaria se beneficiando principalmente do chamado mercado cinza, isto é, a entrada ilegal de máquinas no país, vindas principalmente do Paraguai. Como fabricante, a Acer é responsável apenas pela produção de suas máquinas. A distribuição é feita por terceiros, que compram seus PCs.

A consultoria IDC mede tanto as vendas do mercado formal de computadores quanto do informal. Dados da suas pesquisas obtidos pelo Valor mostram que, se por um lado a Acer liderou com a Positivo o quarto trimestre do ano passado em vendas totais de laptops - que inclui o mercado cinza -, por outro a fabricante de Taiwan amarga a nona posição do ranking quando contabilizadas apenas as transações formais.

A Acer explica o cenário de outra forma. Em entrevista por e-mail concedida ao Valor, a executiva Anne da Gama, diretora-geral da Acer no Brasil - que vive em Miami - afirma que a liderança da empresa em laptops se deve à agilidade no fornecimento de novas tecnologias. "As parcerias também têm sido ótimas e bem sucedidas, tanto da Acer com os distribuidores, quanto da dos distribuidores com as revendas e varejos, pois há sincronia nas negociações."

-------------------------------------------------------------------------------- Empresa defende que fabricantes locais têm benefícios, mas também têm custos de operação, o que a Acer não tem --------------------------------------------------------------------------------

Anne afirma que atualmente "a Acer tem um canal de distribuição sério e dedicado à marca, responsável pelas vendas no Brasil". A executiva prefere não falar sobre qual o real impacto que o mercado cinza teria trazido às vendas da companhia no país, mas é clara ao dizer que "não cabe a Acer o controle das fronteiras".

A companhia, que chegou ao Brasil em 1997, já teve fabricação própria no país, mas em novembro de 2001 decidiu eliminar definitivamente a produção local, passando a importar seus equipamentos. À época, a matriz decidiu centralizar em Miami as operações da América Latina. As razões que levaram à decisão estavam atreladas à demora do país em regulamentar a Lei de Informática, além da redução mundial na demanda por computadores.

Atualmente, porém, nem o crescente mercado interno ou os incentivos fiscais previstos para quem monta computadores no país convencem a Acer a ter uma operação direta. "Não temos intenção de voltar a fabricar no Brasil, pois a estratégia de não fabricar localmente tem funcionado muito bem até o momento", diz Anne. "A nossa principal estratégia para o Brasil está na maior aproximação com o varejo. A intenção é reforçar a relação com distribuidores e sua operação junto aos varejistas."

Segundo Anne, é preciso ressaltar que, enquanto o fabricante local importa os componentes para a montagem, a Acer já pode enviar o produto acabado. "Os fabricantes locais têm benefícios fiscais, mas também têm custos operacionais locais, o que a Acer não tem."

Hoje os laptops da Acer são encontrados em redes de varejo como Casas Bahia, FNAC, Ponto Frio e Carrefour, entre outras. Seus distribuidores no país são Bell Micro, Clac Importação, Solution TI, Travel, All Nations e, recentemente, a paranaense Aldo Distribuidora. O Valor conversou com um desses distribuidores, que pediu para não ser identificado. "O que a gente percebe é que a Acer faz vista grossa para o que acontece no mercado cinza", diz o executivo, responsável pela distribuição de laptops da companhia. "Como ela só fabrica, o que interessa mesmo é vender, não importa o destino do produto."

Segundo o executivo, o mercado cinza tem prejudicado seu negócios, forçando-o a se concentrar em máquinas de configuração mais sofisticadas e, logo, mais caras. "Hoje o laptop mais barato que eu vendo sai por R$ 1,9 mil, mas essa mesma máquina custa menos de R$ 1,5 mil no paralelo."

Em 2007, o consumidor brasileiro comprou 1,5 milhão de unidades de laptops, segundo a IDC. Deste total, 30% foi adquirido no mercado cinza (contra 38% da média dos PCs de mesa). Se multiplicadas por um valor médio de R$ 2 mil a máquina, tem-se um mercado de R$ 3 bilhões. Segundo a Secretaria de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC), as importações brasileiras formais de portáteis feitas com a Ásia não chegaram a US$ 57 milhões em 2007.