Título: Empresas mobilizam advogados, RHs e médicos para contestar SAT
Autor: Carvalho , Luiza
Fonte: Valor Econômico, 21/12/2007, Legislação, p. E1

Uma preocupação a mais tomou conta das empresas neste fim de ano: o trabalho de contestação dos benefícios previdenciários concedidos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) às empresas. Elas têm até o dia 2 de janeiro para apresentar as impugnações das concessões feitas no período entre 1º de maio de 2004 e 31 de dezembro de 2006 - e que servirão de base para o cálculo do novo Fator Acidentário de Prevenção (FAP), que definirá as novas alíquotas do Seguro Acidente de Trabalho (SAT) das empresas a partir de 2009. Advogados articulam diferentes linhas de defesa para evitar possíveis aumentos das alíquotas. E o clima nas empresas é de insegurança: o volume de impugnações é muito grande - cerca de 70 por empresa - e os profissionais temem que o INSS não tenha tempo hábil para avaliar todas elas. Há a possibilidade de que todas as defesas desaguarem no Poder Judiciário.

Neste ano, o INSS passou a utilizar uma nova metodologia para o cálculo do FAP que é questionada pelas empresas - o chamado Nexo Técnico Epidemiológico (NTEP), que relaciona a Classificação Internacional de Doenças (CID) e a Classificação Nacional de Atividade Econômica (CNAE). O FAP será multiplicado à alíquota do seguro - que pode ser de 1%, 2% ou 3%, de acordo com o risco de cada atividade -, fazendo com que ela seja estabelecida para cada empresa individualmente, podendo ser reduzida ou aumentada. Há cerca de 20 dias, as ocorrências estão listadas no site do INSS com o número de identificação do trabalhador (NIT) recebedor do benefício nas empresas. Depois de analisar as impugnações das empresas, o órgão divulgará, em setembro de 2008, o FAP que determina a alíquota recolhida em 2009.

Com a correlação automática entre as moléstias dos trabalhadores e as doenças pertencentes ao ramo de sua ocupação, inverteu-se o ônus da prova - ou seja, as empresas devem comprovar que os benefícios previdenciários não têm nexo causal, ainda que não tenha sido emitida a Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT). Para isso, os advogados estão checando cada caso de auxílio-doença e acidentário listados pelo INSS. A primeira argumentação possível refere-se aos supostos erros do INSS - por exemplo, ao listar doenças que não estão relacionadas à atividade exercida pela empresa. Em uma das empresas atendidas pelo advogado Marcel Cordeiro, da banca Pompeu, Longo, Kignel & Cipullo Advogados, há 65 ocorrências, sendo que 53 delas não apresentam relação entre a CID e a CNAE. Para o advogado Juliano Barra, do escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados, que está auxiliando cerca de dez empresas, um equívoco freqüente tem sido a inclusão de benefícios de funcionários demitidos antes de 2004. Já a advogada Simone Oliveira Rocha, do Homero Costa Advogados, constatou a repetição de ocorrências referentes a um mesmo afastamento.

Constatadas as falhas, o trabalho mais árduo é o de reunir provas para a contestação. Em um dos casos analisados pelo advogado Heliomar dos Santos Junior, do Leite, Tosto e Barros Advogados Associados, que prepara impugnações para 12 empresas, há um registro de afastamento de um empregado por uma lesão no joelho. O advogado obteve provas de que a lesão foi causada em um jogo de futebol e anexou-as à defesa. "Estamos usando não só registros documentais, mas alegando que temos provas testemunhais e periciais", diz. Em outro caso atendido por Simone, do Homero Costa, constava a doença "traumatismo de abdômen", na verdade causada por um tiroteio - a advogada juntou o boletim de ocorrência à impugnação.

Para preparar a defesa, os médicos das empresas e as equipes de recursos humanos têm sido peças-chave no fornecimento de históricos laborais aos advogados. O advogado Adelmo do Valle Sousa Leão, do Peixoto e Cury Advogados, diz que é necessário munir-se de um "kit" de documentos, como o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) - dados completos de um trabalhador fornecidos pelo Ministério da Previdência Social -, certificados de programas de prevenção de riscos ambientais, laudo técnico ambiental e laudo pericial, se houver algum emitido pela Justiça em processos trabalhistas.

Além do objetivo de evitar a majoração da alíquota do SAT, alguns advogados temem que as impugnações não aceitas pelo INSS sirvam de base para trabalhadores pleitearem indenizações na Justiça e também para ações regressivas, movidas pelo próprio órgão, contra empregadores considerados responsáveis por acidentes de trabalho. Isto porque, em agosto, uma resolução do Conselho Nacional de Previdência Social determinou que o INSS incremente o ingresso de ações regressivas na Justiça em casos de negligência no cumprimento de normas de segurança por parte das empresas. Outro risco levantado é o de trabalhadores moverem processos por terem seu sigilo médico violado durante o levantamento de provas dos advogados. Já há um caso deste tipo na Justiça do Trabalho, contra uma empresa cujo empregado tenta uma indenização por danos morais ao alegar a exposição desmesurada de seu prontuário médico.

Alguns profissionais envolvidos no trabalho de defesa temem que o INSS não tenha tempo hábil para analisar todas as impugnações até setembro de 2008 - algumas empresas chegam a ter 200 ocorrências listadas. "A impugnação de uma empresa chegou a ter um metro de altura", diz Cordeiro. Por este motivo, na opinião de muitos advogados não será possível recorrer na instância administrativa recursal do INSS, o que tornará inevitável a via judicial. "Com certeza muitas empresas vão tentar questionamentos na Justiça" diz Rodrigo Takano, do Machado, Meyer. Procurada pelo Valor, a assessoria de imprensa do INSS informou que o órgão decidiu não se manifestar até o término do prazo para as impugnações.