Título: Aliados apóiam derrubada de MP em protesto contra nomeações
Autor: Ulhôa , Raquel
Fonte: Valor Econômico, 27/09/2007, Política, p. A9

Num ato de clara rebeldia contra o tratamento político recebido pelo governo e de desagravo ao presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), o PMDB do Senado aliou-se à oposição para derrubar a medida provisória que criou a Secretaria de Planejamento de Longo Prazo da Presidência da República, cargo ocupado pelo filósofo Roberto Mangabeira Unger desde 19 junho.

O movimento da bancada pemedebista foi interpretada como demonstração de força de Renan Calheiros (AL), que está insatisfeito com o comportamento da bancada petista na Casa em relação aos processos por quebra de decoro que vem sofrendo. Com Aloizio Mercadante (SP) à frente, os petistas defendem o afastamento de Renan da presidência.

Com a derrubada da MP, caberá ao Congresso Nacional aprovar decreto legislativo regulamentando as relações jurídicas estabelecidas enquanto a regra teve validade. Rejeitada pelo Senado por 22 votos a favor e 46 contra, a MP criava 660 cargos mais 34 funções gratificadas, causando um impacto de R$ 23 milhões aos cofres públicos, segundo o relator, Valter Pereira (PMDB-MS).

Em seu parecer, ele recomendou a rejeição da admissibilidade da MP, considerando que ela não cumpre a exigência constitucional da relevância e urgência. O argumento técnico foi usado para dar o recado político ao governo.

Na terça-feira, Pereira reuniu em seu apartamento um grupo de dez senadores do PMDB, todos com queixas contra o Palácio do Planalto. Eram eles: Valdir Raupp (RO), líder da bancada, Almeida Lima (SE), Wellington Salgado (MG), José Maranhão (PB), Leomar Quintanilha (TO), Garibaldi Alves (RN), Geraldo Mesquita (AC), Neuto de Conto (SC) e Paulo Duque (RJ), além do anfitrião.

Integram o grupo senadores da chamada "tropa de choque" do presidente do Senado, como Raupp, Almeida e Wellington, além de Quintanilha, presidente do Conselho de Ética. Por isso, o gesto do grupo sinalizou a insatisfação de Renan com o fato de o PT ter abandonado sua defesa, nessa fase em que responde a três processos por quebra de decoro, já tendo sido absolvido no primeiro (uso de lobista de empreiteira em pagamentos pessoais).

O líder do PMDB, Valdir Raupp (RO), liderou a posição da bancada para derrubar a MP. "Na volta dessa medida ao Senado, espero que o governo tenha reduzido em 50% o número de cargos, para que possamos orientar a bancada a votar a favor", disse. Dos 16 senadores do PMDB votantes, apenas três votaram a favor da criação da secretaria de Unger: Romero Jucá (RR), líder do governo, José Sarney (AP) e Roseana Sarney (MA), líder do governo no Congresso.

Dos cargos que a MP criava, apenas 79 eram da secretaria de Unger. O restante era de vários órgãos públicos, como Defensoria Pública, Advocacia Geral da União, Ministério da Fazenda, Ministério da Previdência Social, Sudam, Sudene e Ministério do Turismo.

Mercadante considerou "absurdamente irracional" que um partido da base vote contra uma MP, prejudicando tantos órgãos públicos. Ele voltou a responsabilizar a permanência de Renan na presidência do Senado pela crise. "Isso mostra a sinuca de bico que a base do governo está vivendo. O ideal é que ele se licencie", disse Mercadante, considerando o gesto dos pemedebistas como "desagravo" a Renan.

Os governistas não sabiam dizer ao certo se o presidente tem uma saída para recriar a secretaria. Legalmente, ele não pode editar nova MP sobre o mesmo assunto num mesmo ano.

O maior partido da base do presidente Luiz Inácio Lula da Silva está insatisfeito com a não nomeação de indicados para cargos, com a não liberação de emendas dos parlamentares ao Orçamento da União, e com reivindicações não atendidas.

Segundo Pereira, o PMDB quer participar das decisões do governo. "No caso da CPMF, por exemplo, disseram que não admitem mudanças. Houve uma postura autoritária, que nos coloca em posição de submissão ao governo", afirmou o pemedebista.

As queixas dos senadores variam. José Maranhão, por exemplo, está revoltado com a demissão de Augusto Bezerra da diretoria do Banco do Nordeste, indicado pelo PMDB da Paraíba, e sua substituição por um petista. O líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), admite que a relação do governo com o PMDB precisa ser "afinada".

Na sessão de ontem, o governo sofreu outras derrotas. Em uma, a oposição conseguiu alter medida provisória que tratava dos débitos de responsabilidade dos estados e do Distrito Federal, de suas autarquias e fundações, relativos às contribuições sociais. A modificação em si tem pouca relevância. O problema é que a alteração faz com que a MP volta à Câmara.

Quando chegar naquela Casa, tranca automaticamente a pauta de votações - o que atrapalhará a tramitação da CPMF. Caberá a Renan enviar o texto imediatamente ou segurar alguns dias.

Pouco antes das 22h, o plenário começou a discutir o projeto de resolução que acabava com as sessões secretas no Senado.