Título: O Brasil e o Protocolo de Madri
Autor: Ejnisman, Marcela W. e Gomes, Andreia de Andrade
Fonte: Valor Econômico, 22/06/2007, Legislação & Tributos, p. E2

A adesão do Brasil ao Protocolo de Madri virou quase um mito. As discussões sobre o tema misturam controvérsias, complicações, lugares-comuns, conclusões genéricas e argumentos passionais. O assunto ganhou ainda mais destaque quando as autoridades de propriedade intelectual e o próprio governo sinalizaram que o país deverá adotar o tratado a partir de 2008. Por enquanto, o projeto está na Casa Civil e, como se trata de um acordo internacional, tem de ser aprovado pelo Congresso Nacional.

É bom lembrar que o acordo, hoje adotado por 72 países, prevê, tão somente, um sistema de registro internacional de marcas administrado pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), com o objetivo de diminuir os custos e simplificar o procedimento de pedido de marca em âmbito mundial.

No Brasil, muito se falou que os agentes e profissionais do setor seriam afetados, perderiam volume de trabalho e, como conseqüência, seriam prejudicados financeiramente. Mas, na verdade, com a previsão de que o Brasil já entre no novo sistema em 2008, começaram a surgir trabalhos e seminários relacionados exatamente ao tratado. Além disso, o sistema de registro do Protocolo de Madri é alternativo, ou seja, não é obrigatório. Pode o particular, segundo seu critério, utilizar-se do protocolo ou continuar usando o sistema de marcas previsto na Lei da Propriedade Industrial.

O Protocolo de Madri pode despertar ainda discussões jurídicas que exigirão a assessoria de advogados especializados na área - por exemplo, se uma marca for registrada, via protocolo, dentro dos 18 meses de prazo determinado pelo acordo, antes de outra que está aguardando o registro tradicional há anos, abre-se uma questão sobre o direito de procedência e a isonomia entre brasileiros e estrangeiros. Isso porque poderia ser alegado tratamento desigual e contrário aos princípios constitucionais pátrios. Segundo as regras do Protocolo de Madri, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) não é obrigado a aprovar a marca por decurso de prazo. O órgão deve apenas notificar a OMPI, dentro de 12 ou 18 meses, sobre o possível indeferimento de uma marca cuja origem se deu através do protocolo, podendo concluir o exame após este prazo.

Como argumento contrário à adesão do Brasil ao Protocolo de Madri, alega-se que marcas estrangeiras, originárias do sistema, virão para o nosso país e congestionarão ainda mais o INPI. Trata-se de um equívoco: com base nos dados oficiais da OMPI, é estimado que o Brasil não receberá mais do que três a quatro mil pedidos de registro de marcas no primeiro ano, caso venha a aderir ao Protocolo de Madri. Esses números representam menos de 3% do que é depositado, em média, anualmente no Brasil.

Hoje, o Protocolo de Madri está totalmente estabelecido na Europa e fortemente na Ásia. A Índia saiu na frente de alguns países emergentes e já comunicou a sua adesão para este ano. No Oriente Médio, Irã, Bahrein e Síria já são membros e Jordânia e Israel anunciaram a adesão também para este ano. Na África, o protocolo já foi adotado em 14 países.

Somente nas Américas a adesão ao Protocolo de Madri ainda não é expressiva, sendo membros apenas Cuba, Antígua e Barbuda e Estados Unidos. Ironicamente, as empresas da América Latina têm que pagar mais para registrar suas marcas do que as empresas européias e americanas.

Para o Brasil, esperamos que a adesão ao tratado internacional traga um aumento no volume de marcas brasileiras que serão protegidas no exterior. Como sabemos, as empresas estrangeiras que se instalam no Brasil protegem sua marca independentemente do custo envolvido, ao contrário das pequenas e médias empresas exportadoras brasileiras, que muitas vezes se vêem impossibilitadas de fazer isso em muitos países do exterior, devido ao custo dos registros.

Dados recentes da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) mostram que existem 18.500 empresas exportadoras no país. Esse número da Fiesp representa, para os profissionais da área de propriedade intelectual, a certeza de que, com a chegada do Protocolo de Madri, seus clientes - justamente as empresas brasileiras exportadoras - precisarão de assessoria para entender as vantagens e os mecanismos do tratado, beneficiando-se, portanto, do novo sistema.

O Protocolo de Madri também facilita o acesso das pequenas e médias empresas brasileiras exportadoras a novos mercados. Considerando a importância das exportações para a economia brasileira, parece claro que o Brasil deve fazer parte dos acordos e tratados internacionais que facilitam o acesso aos grandes mercados.

Resta, portanto, a seguinte questão: adotaremos uma postura passiva que nos colocaria à margem da competição ou partiremos para o caminho dos nossos parceiros comerciais, que aproveitaram ao máximo as oportunidades de expansão no mercado exportador mundial?

Marcela W. Ejnisman e Andreia de Andrade Gomes são, respectivamente, sócia e advogada da área de propriedade intelectual do escritório TozziniFreire Advogados

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