Título: CVM inabilita executivo da Fazenda para atuar em companhias abertas
Autor: Vieira, Catherine
Fonte: Valor Econômico, 14/12/2006, Finanças, p. C2

A diretoria colegiada da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) enfrentou ontem uma tarefa difícil ao analisar o caso Banespa. No maior julgamento já feito na autarquia, levando em conta o número de pessoas envolvidas, os diretores avaliaram a conduta de 102 indiciados e aplicaram penas a metade deles. O caso, que analisava irregularidades ocorridas no Banespa entre 1990 e 1994, já seria suficientemente complicado se na lista dos punidos não estivesse o atual secretário de Política Econômica, Júlio Sérgio Gomes de Almeida. O secretário é homem de confiança de Guido Mantega, titular da Fazenda, ministério ao qual a CVM é vinculada.

Almeida era vice-presidente do Banespa na época. A CVM o inabilitou por três anos para exercer cargo em companhia aberta.

A decisão de ontem da CVM foi unânime entre os diretores Wladimir Castello Branco (relator do processo) e Maria Helena Santana, além do presidente Marcelo Trindade. O diretor Pedro Marcílio se considerou impedido no caso. Outros 50 indiciados foram punidos com penas de inabilitação entre um e três anos. Também julgados, os ex-governadores Orestes Quércia e Luiz Antonio Fleury Filho foram absolvidos.

No processo estavam envolvidos executivos do Banespa e políticos do governo de São Paulo - controlador do banco à época. As irregularidades inicialmente investigadas estavam relacionadas a operações de Antecipação de Receita Orçamentária (ARO) e à concessões de crédito feitas de forma irregular. A CVM entendeu que houve falta de dever de diligência na aprovação de algumas dessas últimas operações.

Em alguns dos casos, o crédito era concedido apesar de pareceres negativos das áreas técnicas e sem justificativa formal. Já com relação às operações de ARO, a autarquia não constatou infrações na área de sua competência. A função da CVM é analisar operações que possam ter sido eventualmente lesivas aos acionistas da instituição. Nas operações de crédito muitas vezes a falta de diligência na concessão do dinheiro acabava gerando incerteza na recuperação dos empréstimos, o que implica em risco para os acionistas.

Segundo o relatório, entre as operações de crédito analisadas pela autarquia estavam concessões feitas à Vasp e à Gurgel, apesar de advertência da área técnica e de experiência negativa anterior.

A decisão tomada ontem pela CVM é de primeira instância administrativa e ainda cabe recurso ao Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional (o conselhinho). Até lá, há o chamado efeito suspensivo (as penas não são imediatamente aplicadas). Alguns dos indiciados já foram punidos em processo semelhante analisado pelo Banco Central e as penalidades foram confirmadas pelo conselhinho em 2004. Almeida já havia sido inabilitado por três anos para o exercício de cargo no sistema financeiro.

O secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Júlio Gomes de Almeida, afirmou, por meio de sua assessoria, que o processo decidido pela CVM refere-se a uma operação de crédito realizada em 1991, quando não era diretor de crédito do Banespa, mas apenas integrante do Comitê de Crédito, junto com outras quinze pessoas. Além disso, esse empréstimo teve parecer técnico favorável. Quanto à decisão do Banco Central, o secretário informou que levou o caso à Justiça Comum, por discordar de seu desfecho.

(Colaborou Arnaldo Galvão, de Brasília)