Título: O registro de capital estrangeiro no Brasil
Autor: Balduccini, Bruno e Nero, Fernando Del
Fonte: Valor Econômico, 10/04/2007, Legislação & Tributos, p. E2

O Conselho Monetário Nacional (CMN) emitiu no dia 5 de março deste ano a Resolução nº 3.447, regulamentando os procedimentos relacionados ao registro de capitais estrangeiros de que tratam os artigos 5º e 7º da Lei nº 11.371, de 28 de novembro de 2006. Tais artigos se referem ao registro do chamado "capital contaminado", assim denominado o investimento estrangeiro em pessoas jurídicas locais e não registrado no momento de ingresso dos recursos no Brasil.

A publicação da Resolução nº 3.447 foi imediatamente seguida pela emissão da Circular nº 3.344, publicada pelo Banco Central do Brasil (Bacen) em 7 de março deste ano, a qual acrescenta o capítulo quatro ao título três do Regulamento do Mercado de Câmbio e Capitais Internacionais (RMCCI) versando sobre a mesma matéria.

Nos termos do artigo 2º da Resolução nº 3.347, o registro do capital estrangeiro contaminado será efetuado de forma declaratória, por meio eletrônico, desde que conste dos registros contábeis da empresa brasileira receptora do capital, conforme previsto no artigo 5º da Lei nº 11.371. Para tal finalidade, deverá ser utilizado o próprio sistema de registro declaratório eletrônico dos investimentos estrangeiros diretos (RDE-IED), seguindo-se as regras genéricas trazidas pela Circular nº 2.997, de 15 de agosto de 2000, observado que, neste caso, o registro deverá ser efetuado em moeda nacional, uma vez que se baseia em registros contábeis locais.

Operacionalmente, a tela do sistema RDE-IED passará a ter um campo específico destinado a evidenciar os valores relacionados a registro em moeda nacional do capital contaminado e regularizar tal investimento estrangeiro. Isto significa que os indivíduos ou as pessoas jurídicas não residentes detentores de participação em uma sociedade brasileira deverão simplesmente declarar ao Banco Central o valor do investimento por eles realizado e não registrado. Em caso de fiscalização, o valor do investimento registrado poderá ser comprovado através de documentos contábeis e societários da empresa.

A Resolução nº 3.347 estabelece que, para fins fiscalização pelo Banco Central, deve o declarante manter os documentos comprobatórios das declarações por ele prestadas (os registros contábeis) pelo prazo de cinco anos, contados da data de cada declaração no módulo RDE-IED. A norma estabelece ainda que o investimento estrangeiro a ser registrado independe da data da integralização da participação estrangeira no capital da empresa brasileira receptora do investimento. Neste sentido, é necessária a comprovação documental da titularidade do capital externo (como por exemplo, o ato societário comprovando a participação e investimento estrangeiro na empresa). Desta forma, mesmo que tal investimento tenha sido realizado muitos anos atrás, ele poderá ser registrado a qualquer tempo pelo investidor não residente através do sistema do Banco Central.

É importante que sejam observados também os prazos para realização do registro, conforme determina o artigo 3º da Resolução 3.347: (1) até 30 de junho de 2007, caso o capital exista desde 31 de dezembro de 2005; ou (2) até o último dia do ano-calendário subseqüente ao balanço anual no qual a pessoa jurídica estiver obrigada a efetuar o registro, o capital contabilizado a partir do ano de 2006, inclusive.

-------------------------------------------------------------------------------- O investidor estrangeiro poderá, agora, efetuar livremente remessas de dividendos, reduzir e repatriar o capital --------------------------------------------------------------------------------

Vale notar que tais disposições não se aplicam aos investimentos sujeitos a registro no Banco Central com base em disposições específicas, os quais devem atender à legislação a eles atinente. Desta forma, os investimentos estrangeiros realizados via mercado de capitais (investimento em portfolio), por exemplo, devem ser registrados com base no regulamento da Resolução nº 2.689 de 26 de janeiro de 2000.

O artigo 7º da Resolução nº 3.347, por sua vez, dispõe sobre as penalidades a que estão sujeitos os declarantes que infringirem as normas reguladoras dos registros, bem como sobre o registro fora do prazo ou a prestação de informação falsa no ato do registro. Ademais, tal artigo penaliza com multa os detentores de investimento estrangeiro em empresa brasileira que deixarem de declarar sua participação. Neste sentido, o Banco Central deixa claro não ser opcional a realização do registro, uma vez que sua ausência implica a imposição de multa de 20% a 50% do valor máximo previsto na Lei nº 11.371, de R$ 250 mil. Vale lembrar que o registro previsto na Resolução nº 3.347 não elide o declarante das outras responsabilidades a ele imputadas pela regulamentação, tais como a prestação de informações ao Censo de Capitais Estrangeiros.

Com base no disposto na Resolução nº 3.347, o Banco Central emitiu, logo na seqüência, a Circular nº 3.344, incluindo um novo capítulo ao título "capitais estrangeiros no país" do RMCCI. O novo capítulo foi intitulado "capital em moeda nacional - Lei nº 11.371" e possui dispositivos semelhantes àqueles estabelecidos na Resolução nº 3.347.

O advento das regulamentações abordadas acima é de suma importância para a questão de capital contaminado de empresas brasileiras com participações estrangeiras. Antigamente, caso o registro não fosse efetuado no momento da realização do investimento de acordo com a Lei nº 4.131, de 1962, e na data de ingresso dos recursos, o mesmo não poderia mais ser realizado, ficando o capital da sociedade local contaminado, o que impedia, por exemplo, as sócias estrangeiras de receber dividendos incidentes sobre aquela parcela do capital contaminado.

A publicação destas novas regras não só conferiu aos sócios estrangeiros a possibilidade de registrar tardiamente o investimento ora feito por eles em pessoas jurídicas nacionais como também expressamente os obrigou a efetuar o registro, de modo a garantir o controle de ingresso de recursos pelo Banco Central do Brasil.

A maneira relativamente simplista pela qual as autoridades monetárias regulamentaram um tema tão controverso indica que a intenção foi a de simplesmente regularizar a situação do capital contaminado nas empresas brasileiras. Independentemente do que gerou a falta de registro do investimento, basta o investidor estrangeiro declarar o valor de sua participação "contaminada" para conseguir o devido registro no Banco Central.

Nosso entendimento é o de que, com base nesse registro, o investidor estrangeiro poderá, agora, efetuar livremente remessas de dividendos, reduzir o capital e repatriar o capital em caso de venda ou liquidação do investimento.

Bruno Balduccini, Fernando M. Del Nero Gomes e Marília de Cara são advogados e, respectivamente, sócio, associado e assistente da área empresarial do escritório Pinheiro Neto Advogados

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações