Título: Educação precária trava contratações
Autor: Braga, Gustavo Henrique; Freitas, Jorge
Fonte: Correio Braziliense, 06/11/2010, Economia, p. 22

Relatório da ONU mostra fragilidade já conhecida pelas empresas do país. Só no DF, há 26 mi vagas à espera de gente qualificada Especial para o Correio

O relatório do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), elaborado pelas Nações Unidas (ONU), comprovou o que os empresários brasileiros já sentiam há muito tempo no chão de fábrica: a baixa qualidade do sistema educacional é a maior dificuldade para que os empregadores consigam preencher os postos com pessoal qualificado. Para se ter uma ideia, o Brasil tem hoje um contingente de desempregados superior a 2,5 milhões de pessoas só nas sete principais regiões metropolitanas do país, conforme dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Resultado: mesmo com a economia aquecida, milhões de vagas seguem ociosas.

Só no Distrito Federal, são mais de 26 mil postos que não conseguem ser preenchidos, segundo levantamento do Conselho de Trabalho do DF (CTDF), ligado à Secretaria de Trabalho do governo local. A baixa qualificação profissional da massa de desempregados configura um dos principais entraves para solucionar essa equação. As empresas precisam de mão de obra, mas as pessoas disponíveis não têm o conhecimento necessário para ocupar as vagas. Na avaliação de Alcides Leite, professor da Trevisan Escola de Negócios, o problema está na péssima qualidade do sistema de ensino nacional.

¿A educação brasileira é falha em vários aspectos, porque prioriza demais o ensino acadêmico. É tudo muito teórico e as grades são extensas. Estamos dando um ensino do século 20 para uma população do século 21¿, criticou. No entendimento de Leite, o país obteve avanços unicamente nos aspectos quantitativos do ensino, mas a qualidade ainda deixa a desejar. ¿O pior já passou. Hoje, a maior parte das crianças está na escola. O que falta agora é reformar e modernizar o sistema. Só assim, a médio e a longo prazos, o país terá um alívio em um dos principais gargalos para o crescimento: a falta de mão de obra qualificada¿, acrescentou.

Desigualdade Apesar dos recordes sucessivos no índice de desemprego ¿ em setembro, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apurou uma taxa de 6,2% ¿, a forma como a geração de postos de trabalho se dá apresenta ainda vícios crônicos, uma realidade que coloca a economia nacional em um terreno pantanoso. Grupos como jovens, negros e mulheres amargam taxas específicas na casa dos 8% a 9%, contra uma média de 5,5% para homens brancos, indicam pesquisas da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

O consultor Jorge Pinho defende que uma das consequências da péssima qualidade observada no ensino nacional é a de que as pessoas conquistam o título acadêmico, mas não adquirem a competência necessária para exercer as profissões. Para piorar a situação, a presidente eleita, Dilma Rousseff, já anunciou em seus primeiros discursos, após a vitória nas urnas, que a educação não será prioridade durante os próximos quatro anos.

O economista Sérgio Vale, da MB associados, ressalta que o Brasil passou por grandes reformas que estimularam o capital, mas o mercado de trabalho ficou estagnado. ¿O próximo governo pode, perigosamente, parecer com os governos Geisel e Dutra, sem nenhum pensamento sobre mão de obra¿, diz. A bomba-relógio que está sendo armada envolve ainda o tipo de emprego que o país está gerando. A maior parte dos postos criados nos últimos 12 meses é em setores que demandam pouca qualificação, pagam salários abaixo da média e são sensíveis às oscilações econômicas.

Nesse período, dos mais de 700 mil postos abertos nas sete principais regiões metropolitanas do país, metade foi no setor de serviços, no qual o trabalho é mais precário. Na indústria, que exige mais especialização e paga melhor, foram pouco mais de 25 mil vagas, ou 33% do total, puxadas pela reposição de vagas fechadas durante a crise mundial. Mas esse número vem caindo mês a mês, diante do tranco sentido pelas fábricas nacionais com a entrada massiva de produtos importados.

Preocupação Pesquisa recente da consultoria PwC mostra que a principal preocupação das empresas familiares brasileiras para os próximos 12 meses é o recrutamento de pessoal qualificado. Enquanto, no Brasil, 63% dos empresários colocaram a falta de mão de obra como principal desafio, o índice mundial para o tema foi de 38%. Sócio da empresa, Geovani Fagunde avalia que o resultado ilustra o momento econômico que o país vive, com o menor nível de desemprego da história.

O otimismo do consumidor brasileiro atingiu 120,7 pontos, o que representa um crescimento de 2% em outubro na comparação com setembro, conforme aponta o Índice Nacional de Expectativa do Consumidor (Inec), da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Com base fixa 100, pontuaação acima desse valor indica expectativa positiva, a exemplo da última medição realizada ¿ maior patamar desde 2001. O resultado reforça as projeções otimistas segundo as quais o próximo Natal será o melhor dos últimos anos, especialmente devido à invasão de importados por conta do dólar desvalorizado.

Entidades como Confederação Nacional do Comércio (CNC) e Confederação Nacional de Dirigentes Logistas (CNDL) projetam um crescimento acima de dois dígitos para o varejo neste ano. No entendimento da CNI, o resultado recorde é fruto de níveis igualmente recordes das perspectivas do consumidor sobre o desemprego nos próximos seis meses e o comportamento da inflação.

Dívidas Houve um aumento de 6%, ante setembro, no percentual de consumidores que acreditam em queda no desemprego, atingindo 144,9 pontos, também o maior valor da série histórica. A pesquisa sugere que o otimismo reflete o baixo nível de desemprego. Já o percentual dos que esperam declínio da inflação chegou a 131,5 pontos, o maior em quatro anos. Aumentou também a proporção dos consumidores que afirmam ter reduzido suas dívidas, com 3,3% mais em relação a setembro, alcançando 114,1 pontos.

Os índices que medem as perspectivas de compra de bens de maior valor e a situação financeira do consumidor mantiveram-se praticamente estáveis, com crescimento de 0,5% (115,1 pontos) e queda de 0,1% (117,4 pontos), respectivamente. O índice de expectativa de evolução da renda pessoal assinalou queda de 1,3% em outubro, alcançando 113,5 pontos. (GHB)