Título: Risco de calote do consignado surpreende as seguradoras
Autor: Silva Júnior, Altamiro e Carvalho, Maria Christina
Fonte: Valor Econômico, 23/08/2006, Finanças, p. C1

O mercado de seguros para operações de crédito consignado para aposentados está em pé de guerra. Algumas seguradoras descobriram que o risco de inadimplência por óbito do aposentado é superior ao que estimavam. Em consequência, passaram a cobrar reajustes pesados na renovação das apólices ou restringiram a cobertura. A situação ficou mais tensa com a imposição do teto do juro para o aposentado, que limitou os repasses de custos pelos bancos.

O seguro prestamista - que cobre o risco do crédito - é um dos que mais cresce dentro do setor nos últimos meses. No primeiro semestre, os prêmios aumentaram 43%, para R$ 631 milhões, segundo dados da Superintendência de Seguros Privados (Susep). Este tipo de seguro garante o pagamento pela seguradora das parcelas restantes de um empréstimo em caso de morte, invalidez ou desemprego do tomador. Os números da Susep incluem não só o consignado, mas todas as operações de crédito do mercado interno.

A sinistralidade deste tipo de seguro também vem aumentando. Só em junho, ficou em 79%, quase o dobro do que era no mês anterior (44%). No início de 2003, quando praticamente não havia empréstimo consignado para aposentados, estava em 9%.

Os bancos não acham que o risco aumentou. Para o diretor do Banco Cruzeiro do Sul, Luis Octavio Índio da Costa, as seguradoras subavaliaram o risco desse tipo de operação.

O diretor do Banco Cacique e também diretor da Associação Brasileira de Bancos (ABBC), Renato Oliva, concorda com o diagnóstico de que as seguradoras "precificaram mal" o risco da operação quando ela começou a deslanchar, em 2004, e "caíram na realidade" em 2005.

Segundo Oliva, não houve nenhuma surpresa com o índice de óbitos. A inadimplência em função de óbito no crédito a aposentados é estimada em torno de 2% e está até abaixo disso, em 1,6%.

O crescimento registrado pelas seguradoras, afirmou o diretor do Cacique, é em função do fato de a carteira ser nova e do atraso que costuma ocorrer entre o óbito do aposentado e a comunicação desse fato ao INSS. A dimensão continental do país é um dos motivos que atrasa a comunicação dos óbitos. Além disso, algumas vezes, os próprios parentes do aposentado falecido retardam a informação para continuar recebendo a aposentadoria. A defasagem pode chegar a um ano, mostra a experiência de Oliva. "Em abril passado ainda estavamos recebendo a notificação de falecimentos ocorridos um ano antes", disse Oliva.

Embora raramente consiga recuperar a aposentadoria paga indevidamente a parentes dos falecidos, o INSS, assim que é comunicado do óbito, intima o banco a devolver o dinheiro descontado a título de pagamento do crédito concedido. Por isso, os bancos recorrem ao seguro.

A discussão com as seguradoras, porém, está levando alguns bancos a dispensarem o seguro e correrem elas mesmas o risco. "Se o risco é de 0,5%, as seguradoras sempre vão me cobrar a mais", disse um banqueiro.

A solução do Cacique, disse Oliva, foi fazer um contrato de seguro cujo prêmio é renegociado mensalmente em função dos óbitos registrados e do saldo devedor. A apólice cobre o risco das operações em curso do banco.

O tomador de crédito não paga por isso, garantem os bancos. Mas, naturalmente, esse custo deve estar embutido na prestação.

José Roberto Loureiro, presidente da MetLife, seguradora que detém participação expressiva no mercado de seguro prestamista para o crédito consignado, conta que a sinistralidade tem sido alta principalmente nos três primeiros meses do empréstimo. A seguradora, que apostou forte neste segmento, decidiu ir agora com mais cautela. Segundo Loureiro, a MetLife está revendo a estratégia para o segmento.

A precificação deste tipo de seguro também é complicado, avalia Loureiro. Como o empréstimo acaba sendo constantemente renovado, o seguro que deveria ser por um prazo pequeno, acaba sendo por um prazo longo. Pelas regras, a seguradora não pode discriminar o aposentado pela idade e tem que oferecer o seguro para qualquer demanda.

Para Loureiro, com a alta sinistralidade, há o risco de os próprios bancos não quererem mais oferecer o seguro para os aposentados.

Para Ricardo Braga, presidente da Cardif, seguradora do grupo francês BNP Paribas, que atua forte no prestamista, muitas seguradoras ofereceram taxas muito agressivas para ganhar mercado. Com as altas taxas de sinistralidade, muitas carteiras estão sendo renegociadas. Por causa disso, a Cardif preferiu focar no crédito para o setor privado.