Título: Benefícios trabalhistas ainda são raros
Autor: Torres, Carmen Lígia
Fonte: Valor Econômico, 17/08/2006, Caderno Especial, p. F3

As conquistas trabalhistas dos empregados da indústria de médio e grande porte não se verificam nas micros e pequenas empresas industriais. São poucas as que oferecem benefícios além dos estabelecidos pela legislação trabalhista, como participação no FGTS, inscrição do INSS, férias remuneradas e vale-transporte. As mais estruturadas conseguem fornecer cesta básica, vale-alimentação, assistência médica e odontológica. Mas, mesmo entre essas, é incomum haver, por exemplo, programas de participação nos lucros e resultados ou 14º salário.

Em geral, as oscilações econômico-financeiras atingem mais rapidamente esse segmento de empresas, impedindo a continuidade de eventuais programas de incentivos e benefícios. Foi o que aconteceu na Unicrom, indústria de componentes injetados, sediada em Diadema, região metropolitana de São Paulo.

O plano de implantação de participação nos lucros e de 14º salário foi atropelado, há pouco mais de um ano, pela conjuntura econômico-financeira. "Estávamos nos preparando para iniciar o processo, mas a forte alta no preço de nossa matéria-prima principal (zinco) e a impossibilidade de repasse desse custo na ponta roubou todo capital de giro, exigindo a entrada no sistema financeiro para bancar os custos fixos", conta Cadmo Roberto Barbeto, diretor da empresa. Esses problemas geraram uma perda de R$ 750 mil, em 12 meses.

Com 23 anos de existência, a Unicrom tem 60 funcionários (categoria de pequena empresa, segundo critério do Sebrae), com vínculo empregatício, que recebem como benefícios cesta básica, plano de saúde e odontológico e vale-transporte. O próximo benefício, para quando a situação melhorar, é uma infra-estrutura para a alimentação dos funcionário. "A empresa trabalha com apenas 30% de automação e temos como política de gestão a valorização da mão-de-obra", diz Cadmo.

Além da vulnerabilidade à conjuntura, entre as indústrias desse porte faltam, muitas vezes, capacidade administrativa e organização para enfrentar as dificuldades operacionais de implantação de programas como participação nos lucros.

"Embora o setor da indústria esteja mais bem aparelhado em relação ao do comércio e de serviços, também a ele faltam controle gerencial e pré-requisitos organizacionais ", diz Sandra Regina B. Fiorentine, consultora jurídica do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Estado de São Paulo (Sebrae-SP). Na falta de dados estatísticos sobre o assunto, Sandra mostra sua experiência - em nove anos de trabalho no Sebrae, nunca chegou a acompanhar a implantação de nada parecido. Nesse período foi consultada sobre o assunto no máximo 15 vezes.

Um programa de Participação nos Lucros e Resultados, que segue normas estabelecidas pela Lei 10.101, exige que a empresa estabeleça metas de produção ou produtividade e outros requisitos organizacionais que passam ao largo da maioria das indústrias. Além do quê é necessário que os trabalhadores tenham vínculos formais com a empresa.

Nas micros e pequenas empresas, incluídas as industriais, as relações trabalhistas carecem de solidez. Se atualmente a fragilidade dos vínculos trabalhistas está se ampliando de maneira generalizada, nas micros e pequenas, essa fragilidade é marca de origem. Tanto que as pesquisas do Sebrae utilizam uma metodologia diferenciada para analisar a ocupação e o rendimento dos funcionários. "Não fazemos a distinção entre trabalhadores com carteira assinada ou sem carteira e nossa base de cálculo é a despesa da empresa com folha de pagamento", explica Marco Aurélio Bedê, coordenador do Observatório das Micro e Pequenas Empresas do Sebrae SP.

As pesquisas do Sebrae SP, que abrangem um terço das micro e pequenas de todo o Brasil, mapeiam os acontecimentos sobre trabalho e rendimento em dois grupos distintos de trabalhadores: os ocupados e os empregados. Entre os ocupados incluem-se, além dos empregados diretos e terceiros (com ou sem carteira), os sócio-proprietários e familiares que trabalham na empresa.

Assim como a área administrativa e operacional, as relações de trabalho no segmento de micro e pequenas empresas também são mais estruturadas nos empreendimentos industriais, em comparação ao que ocorre no de comércio e de serviços. As indústrias desse porte são 19% do total de micro e pequenas (dados de maio de 2006) e têm uma média de 5,33 empregados/empresa, ante 2,03 empregados/empresa do comércio e 2,70 empregados/empresa em serviços. "Elas são em menor número mas têm um número maior de trabalhadores em relação aos outros setores", diz Bedê.

Entre os três setores, os rendimentos da indústria são os que demonstram mais regularidade. Pesquisa de conjuntura econômica feita mensalmente pelo Sebrae-SP mostra que a faixa de rendimento dos empregados industriais em meses de maio, desde 1998, mostrou pequenas oscilações no patamar entre R$ 707 (maio de 2004) e R$ 758 (maio de 2006). A única exceção foi maio de 2003, quando desceu para R$ 674. Nas empresas de serviços e de comércio, os rendimentos registraram grande variação de faixa de valores, especialmente nos serviços, com valores entre R$ 663 (maio de 2003) e R$ 852 (maio de 2001).

Em maio de 2006, o rendimento médio das micro e pequenas empresas em geral, aumentou 9,2% em relação a maio de 2005, sendo que o da indústria (R$ 758) foi o maior salário pago já registrado em um mês de maio e o terceiro consecutivo em expansão. Naquele mês, a pesquisa do Sebrae SP registrou 5,810 milhões de pessoas ocupadas, sendo 3,609 empregados diretos e terceiros e 2,201 milhões de sócios-proprietários e familiares.