Título: 2º tempo
Autor: Luciana Monteiro
Fonte: Valor Econômico, 03/07/2006, Eu &, p. D1

A instabilidade promete mais uma vez dar o tom aos mercados neste início de segundo semestre. Nos dois últimos meses, os investidores com aplicações em bolsa ou multimercados viram os ganhos obtidos durante todo o semestre se evaporarem em questão de dias diante da perspectiva de aumento da taxa de juros americana acima do esperado. Como esse temor ainda não foi dissipado, o que se deve ver em julho são fortes oscilações em bolsa, câmbio e juros.

As atenções continuam voltadas para o mercado externo. Na quinta-feira passada, o comitê de política monetária (FOMC) do Fed, banco central americano, fez o esperado pelo mercado, ao aumentar a taxa básica de juros dos Estados Unidos em 0,25 ponto percentual, para 5,25%. O mais importante, porém, foi o comunicado divulgado logo após a reunião, que animou bastante os investidores ao indicar menor preocupação com a inflação. Mas os especialistas dizem que ainda é cedo para falar na retomada da euforia verificada no início de maio, quando o dólar comercial atingiu a cotação de R$ 2,056 e a Bovespa chegou a quebrar quatro recordes históricos. Um novo capítulo dessa novela acontecerá no dia 8 de agosto, próxima reunião do Fed.

A expectativa é de que haveria uma nova elevação da taxa em agosto e depois uma pausa para avaliação dos efeitos sobre a atividade econômica, diz Rogerio Betti, sócio da Beta Advisors, escritório de aconselhamento financeiro. Pesa a favor de uma volatilidade menor no mercado brasileiro a elevação da classificação de risco pela agência Fitch, avalia o executivo.

Em junho, a apreensão e a incerteza continuaram a afetar os mercados mundiais. Como conseqüência, a maioria das bolsas mundiais caiu ao longo do mês com o temor de uma alta dos juros americanos além dos 5,5% ao ano. "Esse fato se acentuou com o aumento de juros por parte de vários bancos centrais ao redor do mundo, inclusive o europeu", lembra o consultor financeiro Fabio Colombo.

No mês passado, o principal indicador da bolsa brasileira, o Índice Bovespa, sofreu fortes variações. O índice oscilou da máxima de 37.942 pontos no mês à mínima de 32.847 pontos, o que corresponde a uma variação de 15,5%. O indicador fechou o mês com leve alta de 0,27%. No primeiro semestre do ano, entretanto, o índice acumula valorização de 9,49%. Desde que atingiu o pico de 41.979 em maio, o Ibovespa já se desvalorizou em 12,7%.

Para o investidor com um pouco mais de apetite para risco, boa parte analistas sugere aproveitar a queda da bolsa para diversificar. A estratégia é buscar papéis de maior liquidez, as chamadas "blue chips". Ações do setor bancário, como Bradesco, Itaú, Unibanco e Banco do Brasil têm conseguido amortecer parte da forte oscilação da bolsa e estão entre as recomendações do executivo da Beta.

Grandes empresas, com papéis altamente líquidos e com boa geração de caixa, são opções vantajosas num momento de instabilidade, avalia Mohamed Mourabet, sócio da gestora independente Victoire Finance Capital. Ele destaca ainda as ações de companhias do setor elétrico e de concessões (caso de ALL e CCR), além de empresas beneficiadas pelo aumento de consumo (especialmente AmBev e Petróleo Ipiranga).

Até o dia 27, os fundos compostos por ações da Petrobras fechavam o semestre com alta de 13,46%, mas tinham queda de 7,93% em junho. Ainda não está contabilizada a alta de 6,33% dos papéis da estatal entre 28 e 30 do mês. Já as carteiras Vale do Rio Doce subiam 3,01% nos seis primeiros meses do ano, até o dia 27. Em junho, perdiam 7,60%, mas a queda deve ser amortecida pela valorização de 7,11% das ações entre os dias 28 e 30.

As atenções dos investidores em julho estarão mais uma vez voltadas para os números da economia americana como inflação, crescimento, declarações das autoridades americanas e suas conseqüências sobre as expectativas sobre os juros nos Estados Unidos. Com a inflação, a preocupação é que, diante das pressões de aumento de preços, o Fed tenha de subir mais os juros, provocando uma fuga de capitais de países emergentes, explica Delano Franco, diretor da Mellon Global Investments Brasil. "A outra preocupação é que haja uma desaceleração bruta da atividade econômica mundial, que seria prejudicial para o Brasil que tem se beneficiado muito com esse crescimento."

No âmbito interno, as variáveis terão importância menor em comparação às externas. Mesmo assim, a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) nos dias 17 e 18 será observada de perto pelos investidores. Além disso, os dados sobre o crescimento e eleições estarão no radar. Apesar de vislumbrar oscilações nos mercados, os especialistas não recomendam o dólar como forma de investimento. "Não excluímos pressões momentâneas sobre o câmbio, mas o consenso de mercado é de um dólar variando entre R$ 2,00 e R$ 2,10", diz Mourabet, da Victoire.

Em junho, o dólar comercial encerrou em queda de 6,80%, após subir 11,30% em maio, seu melhor mês do ano. No primeiro semestre do ano, a moeda americana registrou perda de 6,84%. Já o euro fechou o mês passado com desvalorização de 6,10%, após alta de 11,82% em maio. No acumulado do ano, a moeda comum européia registra perda de 0,03%.

A queda do dólar derrubou também o ouro. O metal, cotado em reais, registrou perda de 13,31% em junho - a maior queda do ano. Em maio, o ouro havia surpreendido, com ganho de 12,73%. No ano, entretanto, o metal acumula ganho de 11,40%. A inflação medida pelo Índice Geral de Preços de Mercado (IGP-M) foi de 0,75%. No ano, o indicador tem alta de 1,40%.

Para Colombo, os títulos indexados à variação do IGP-M continuam como opções de investimento a longo prazo como diversificação de portfólio, com retorno na faixa de 10% a 11% ao ano, mais variação do indicador.

Os fundos multimercados com renda variável apresentavam retorno médio de 1,52% no mês, até o dia 27. No acumulado do ano, a categoria rende em média 6,48%. Os multimercados sem renda variável registraram ganho médio de 0,60% e, no ano, rendem 6,44%, até dia 27.