Título: Central de crédito emperra e BC quer regular cessão
Autor: Cotias, Adriana; Travaglini, Fernando
Fonte: Valor Econômico, 17/03/2011, Finanças, p. C10

A Central de Cessão de Crédito (C3) vai levar mais tempo do que o previsto para ser erguida. Idealizada para dar mais segurança à venda de carteiras entre bancos após o furo contábil do PanAmericano, os seus sistemas começariam a ser carregados no início do mês, mas ainda não saíram da fase de testes. Sem um horizonte de tempo definido para a C3 se tornar operacional, uma das principais fontes de captação das instituições de pequeno e médio porte ainda não foi plenamente restabelecida.

Três bancos que costumam ceder carteiras relatam que o Santander parou de adquirir créditos, sob o argumento de ser essa a recomendação da matriz na Espanha. Demais nomes do varejo, que costumavam financiar as instituições menores, estão comprando volumes inferiores ao que faziam antes do episódio PanAmericano - eles mesmos estão às voltas com alguma restrição de liquidez, seja pelo aumento dos compulsórios, seja pelo maior requerimento de capital para operar no crédito à pessoa física desde dezembro.

Procurado, o banco espanhol informou, em nota, que continua com o processo de compra de carteiras de forma pontual e seletiva e que vem trabalhando junto à Febraban, ao regulador e a outros bancos para o rápido desenvolvimento da central de crédito para que este processo fique mais seguro e transparente.

Debaixo da Câmara Interbancária de Pagamentos (CIP), ligada à Febraban, a previsão, agora, é de que, na melhor das hipóteses, a C3 só comece a operar em junho. Inicialmente, a previsão era de que, ao longo de março, a central receberia as informações de cerca de 30 milhões de operações de financiamento de veículos e de consignado, que estão cedidas no sistema financeiro nacional. A partir da formação desse estoque, estaria apta a registrar novas cessões. Na primeira fase do projeto, cada uma das operações seria "carimbada" para evitar a duplicidade na venda de ativos que se revelou como a origem do problema no PanAmericano.

A arquitetura vinha sendo desenhada pelo próprio setor financeiro, mas, com a expectativa de que o Banco Central (BC) regule o tema, os prazos estabelecidos para o envio dos dados para a CIP deixaram de existir.

O BC, por meio da assessoria de imprensa, informou que está "efetivamente analisando a possibilidade de baixar uma regulamentação para as cessões de carteira, dada a importância desse mercado para o sistema financeiro". Esclareceu, entretanto, que a implementação não precisa estar vinculada a tal normatização. O BC também analisa a proposta de criação da central que recebeu das entidades de classe. Entre os pontos que avalia estão: adequação da plataforma eletrônica, aderência da central à legislação existente, requisitos mínimos de operação e alcance operacional da central. Essa análise também não impede que o setor coloque em funcionamento a C3, segundo o BC.

Quem cuida do tema é a diretoria de normas, hoje acumulada pelo diretor Luiz Awazu Pereira da Silva, de assuntos internacionais. A diretoria de normas permanece sem um titular desde que Alexandre Tombini assumiu a presidência do BC.

Só que, enquanto a C3 não sai, bancos de nicho e financeiras, que tinham na venda de carteiras uma importante fonte de captação, estão engessados. O aumento do requerimento de capital nas operações de financiamento de veículos a partir de 24 meses e no consignado acima de 36 meses só agravam essa condição.

Nos bastidores, a Cetip se ressente de ter sido preterida como a desenvolvedora da C3. Por ser uma central de registros, seria uma fornecedora natural desse tipo de serviço, em lugar da CIP, na origem uma central de pagamentos. No processo de licitação feito pela Febraban, dona da CIP, a Cetip perdeu no preço. Na CIP, cada registro de uma operação de crédito vai custar R$ 0,21 - tanto o banco que cedeu quanto o que comprou pagam essa quantia e as duas informações são confrontadas. Procuradas, a Cetip, a CIP e a Febraban não quiseram se manifestar.