Título: Sobra crédito bancário externo para o Brasil
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 22/10/2010, Finanças, p. C8

Com o mercado de eurobônus a todo vapor e os spreads de risco-Brasil perto dos níveis recordes de baixa histórica, as empresas estão tomando menos empréstimos externos sindicalizados (com a participação de vários bancos) neste ano. As instituições financeiras, que haviam aumentado seus limites para o Brasil em relação a 2009, estão com liquidez sobrando no caixa. Acabam fazendo operações bilaterais (entre um banco e uma empresa) de maior volume e com prêmios menores, contribuindo para trazer mais dólares ao país. No total, considerando-se cerca de US$ 4 bilhões em transações já fechadas e em andamento, temos neste ano até agora US$ 8,6 bilhões em empréstimos externos sindicalizados realizados por empresas e bancos, segundo o Valor Data. É uma queda de 40% na comparação com os US$ 14,3 bilhões em 2009. Os bancos acreditam que poucas transações novas deverão acontecer até o final do ano.

Enquanto isso, as empresas e bancos captaram US$ 31,6 bilhões em eurobônus no exterior, um recorde histórico. Considerando-se as transações feitas pelo governo federal, o total obtido por meio de bônus vai a US$ 34,4 bilhões e por meio de empréstimos sindicalizados, a US$ 17,3 bilhões. São US$ 52 bilhões em captações externas totais, também um recorde.

As empresas têm preferido os eurobônus não apenas pela ampla liquidez disponível nesse mercado, mas também por causa dos juros baixos que têm de pagar, que já caíram para níveis inferiores aos experimentados antes da crise de 2008. Os juros dos títulos do Tesouro americano, que são a base sobre a qual são colocados os spreads de risco-país e risco corporativo nos eurobônus, estão em recorde de baixa por causa da política monetária adotada pelos Estados Unidos no pós-crise. O risco-Brasil medido pelo swap de crédito (Credit Default Swap) da dívida externa brasileira de vencimento em cinco anos também está em queda livre e se aproxima de seu menor nível histórico, de 61,4 pontos básicos.

O mesmo não acontece no mercado de empréstimos externos sindicalizados. Segundo Paulo César Souza, diretor comercial do Société Générale, embora a taxa básica usada nesse mercado, a Libor, taxa interbancária de Londres, esteja em queda, os prêmios de risco para captação dos próprios bancos internacionais ainda estão superiores aos verificados antes da crise de 2008, quando se aproximavam de zero. Hoje, chegam a 200 pontos básicos para os maiores riscos. "Os bancos não têm como derrubar spreads abaixo de um certo nível, pois estão pagando mais", explica o executivo.

Transações para a construção de novos navios-sonda de perfuração de petróleo a serem alugados para a Petrobras são as que mais têm movimentado o mercado de empréstimos sindicalizados. Durante o período de construção do navio, não há fluxo de caixa e há necessidade de carência de pagamento do principal e juros no início, o que os bônus, em geral, não podem proporcionar.

Segundo o mercado, a Odebrecht Óleo e Gás já teve oferta de crédito de mais de US$ 2 bilhões para empréstimo de US$ 1,1 bilhão para a construção de navios de perfuração de petróleo. O prazo da transação chega a 12 anos e os prêmios de risco de crédito vão de 275 a 300 pontos básicos. Os líderes são BNP Paribas e HSBC. Também a Petroserv e a Queiroz Galvão estão com transações no mercado para o mesmo fim, de US$ 200 milhões e US$ 575 milhões, diz o mercado.

"Não temos visto muitas operações novas de empréstimos sindicalizados e não é por falta de vontade dos bancos de emprestar", comenta Samuel Canineu, vice-presidente de sindicalização nas Américas do ING. Ele lembra que até mesmo para sondas de perfuração de petróleo têm sido usado eurobônus, embora não para projetos novos.

A Lancer, do Grupo Schahin, lançou eurobônus de US$ 270 milhões no mercado externo de vencimento em 2016 que paga juros de 5,85% ao ano para rolagem de dívida de sonda de perfuração de óleo em fase já operacional. "No mundo todo, os chamados "project bonds", emitidos especialmente para financiar projetos, têm se tornado cada vez mais populares", diz Canineu.

"As empresas estão tomando empréstimos externos para investimento e para pagar dívida mais curta e cara e têm conseguido taxas atraentes", afirma Ernesto Meyer, que acaba de ser promovido para diretor-gerente e responsável pela área de empréstimos sindicalizados para a América Latina do BNP Paribas. O executivo, que está de mudança para Nova York, lembra que os encontros de bancos lotados e a vendas dos empréstimos no varejo bancário voltaram a acontecer.

Os bancos brasileiros têm sido tomadores importantes de empréstimos sindicalizados neste ano, como mostram as transações do Votorantim, Itaú, BicBanco e Sofisa. A Bahia Pulp e a Samarco também estão com transações em andamento, segundo o mercado.