Título: Serviços e comércio recuam, e indústria sobe
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 17/06/2010, Brasil, p. A3

Dois novos indicadores de atividade divulgados ontem reforçaram a tese de que a economia brasileira deixou para trás parte do exagerado crescimento do primeiro trimestre e, embora ainda crescendo fortemente, está desacelerando. A confiança dos empresários do setor de serviços caiu pelo segundo mês consecutivo em maio. Ao mesmo tempo, as vendas no comércio varejista passaram, em abril, pela maior queda mensal da série histórica, iniciada em 2000 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Se a leitura direta desses dois indicadores reforçou a avaliação de uma pequena desaceleração no ritmo de crescimento, novos indicadores da indústria (referentes a maio), apontam na direção de nova aceleração. No mês passado, a venda e a produção de veículos se expandiram frente a abril - respectivamente, 4,5% e 2,9%. A produção de papelão ondulado, importante insumo industrial, cresceu 5,3% no mesmo período. Para analistas ouvidos pelo Valor, a queda no comércio varejista e o menor otimismo dos empresários do setor de serviços é "um ponto fora da curva".

Divulgado ontem pela primeira vez, o Índice de Confiança dos Serviços, calculado pela Fundação Getulio Vargas (FGV) em parceria com o Banco Central, aponta o nível de atividade e as expectativas dos empresários do setor que representa a maior fatia do Produto Interno Bruto (PIB) - algo como 60%. Calculado desde junho de 2008, a FGV esperou completar dois anos para formar base de comparação e, assim, constituir um índice que sirva de parâmetro antecedente de atividade.

O dado do mês passado, de 133,4 pontos, apresentou queda frente aos 134 pontos apurados em abril e aos 135,5 pontos de março, o nível mais elevado desde agosto de 2008, antes da explosão da crise mundial. "Trata-se de um índice de difusão, ou seja, qualquer valor acima de 100 significa que tem uma proporção maior de respostas fortes do que fracas. Portanto, o índice a 130 pontos ainda é bem forte, apesar de ter caído um pouco nos últimos dois meses", avalia Fernando Rocha, economista da JGP Gestão de Recursos.

A queda nas expectativas dos empresários do setor de serviços se dá, avaliam os economistas, devido à perspectiva de arrefecimento econômico. As taxas de juros estão em elevação desde abril e as estimativas mais otimistas para o PIB dão conta de uma redução do ritmo experimentado desde o fim de 2009. "O país continua a se expandir muito fortemente, ainda que não naquele ritmo alucinante do primeiro trimestre", diz Rocha, em referência à elevação de 2,7% pela qual passou o PIB entre janeiro e março deste ano, frente aos últimos três meses de 2009 - um ritmo anualizado de 11%.

Segmento importante para sustentar a atividade econômica no ano passado, o consumo das famílias deve continuar sua trajetória de queda. O tombo recorde do comércio varejista auferido em abril, no entanto, está longe de representar uma tendência, avaliam os analistas. Segundo a Pesquisa Mensal de Comércio (PMC), divulgada ontem pelo IBGE, o varejo passou por queda de 3% entre março e abril, depois de três meses consecutivos de forte expansão. O principal componente da PMC, o segmento de hiper e supermercados, que representa 49,3% de todo o varejo, caiu 7,4%, depois de passar por alta de 2,3% entre fevereiro e março.

"Não há fator estrutural que explique isso", diz Bernardo Wjuniski, economista da Tendências Consultoria. Wjuniski elenca a crescente incorporação de mão de obra - até abril, houve saldo de 962,3 mil contratações formais - e os reajustes salariais para justificar sua análise. "Não tem como comprar muito em supermercado em um mês e comprar tão pouco no mês seguinte, não faz sentido", diz.

Para Rocha, há o efeito da Páscoa para entender a oscilação entre março e abril. Enquanto no ano passado o feriado caiu no dia 12 de abril, neste ano a Páscoa ocorreu no dia 1º daquele mês. "Assim, todas as compras foram feitas em março, o que ajudou a inflar o resultado desse mês e reduzir o de abril", explica. Ainda assim, houve elevação de 5,3% na comparação com o mesmo mês do ano passado. "A base de abril de 2009 era elevada e mesmo assim houve alta nos gastos em supermercados", afirma Rocha. "Isso diz muito quanto ao crescimento."

Entre os dados do comércio varejista de abril, apenas o segmento de artigos pessoais registrou avanço. Todos os outros sete segmentos apresentaram quedas na comparação com o mês anterior. Nos dados de varejo ampliado, que incluem veículos e material de construção, o tombo foi maior - 4,7% - influenciado pelo mergulho de 11,7% verificado na venda de veículos.