Título: Debênture atrai capital fechado
Autor: Mandl , Carolina
Fonte: Valor Econômico, 19/03/2010, Finanças, p. C1

Asempresas de capital fechado começam a usar um novo instrumento paracaptar recursos: as debêntures, seguindo o sinal verde dado pelaComissão de Valores Mobiliários (CVM) em janeiro do ano passado. Antesdisso, apenas aquelas com registro de companhia aberta podiam emitiresse tipo de papel.

Atéagora, a lista de emissoras é limitada, com 13 empresas que lançaram R$6,1 bilhões em debêntures, segundo levantamento feito pelo Valorcom base nos dados da Associação Brasileira das Entidades dos MercadosFinanceiro e de Capitais (Anbima). Dessa relação foram excluídas ascompanhias fechadas com controladoras de capital aberto e que,portanto, já podiam se beneficiar de emissões desses papéis.

"Oobjetivo é criar para as empresas fechadas uma porta de entrada para omercado de capitais. Quem sabe elas não se animam e depois listam suasações na bolsa", diz Felipe Claret, superintendente de registro da CVM.

Porenquanto, essa porta aberta pelo xerife do mercado tem sido usada maiscomo uma forma alternativa de obter uma linha crédito com os bancos comcusto mais baixo, já que não há incidência da alíquota de 1,88% deImposto sobre Operações Financeiras (IOF), como ocorre nas transaçõesde empréstimo. Assim, em vez de a instituição conceder um empréstimo auma companhia, ela compra suas debêntures e as mantém em carteira.

É o que a Hermes,que vende produtos por catálogo e pela internet, fez. Trocou ostradicionais financiamentos de capital de giro por uma emissão dedebêntures de R$ 135 milhões que foi comprada pelo Banco do Brasil,com prazo de dois anos. Além de se livrar do imposto, a companhiaconseguiu alongar o prazo dos empréstimos. "Conseguimos pegar umempréstimo de mais longo prazo, de dois anos. Antes, as linhas decapital de giro venciam em, no máximo, um ano", explica BernardoFerreira, diretor financeiro da Hermes.

Agora,quando os bancos vão dar dinheiro a uma empresa fechada, eles jáavaliam a opção das debêntures. "É uma forma de o banco diferenciar aoperação de crédito que vai oferecer ao cliente", diz Ricardo Leoni,superintendente de mercado de capitais do Santander. Antes esse "truque" só podia ser utilizado pelas empresas abertas.

O Standard Bank, que adquiriu a Casa do Pão de Queijopor meio de uma operação alavancada no fim do ano passado, também optoupelas debêntures. "Foi a forma mais rápida que encontramos deviabilizar um empréstimo", afirma Marcelo Di Lorenzo, chefe de privateequity do Standard Bank.

Umavantagem que a operação de crédito via debêntures pode trazer para obanco é a possibilidade de um dia repassar esse papel aos investidores,mesmo que num primeiro momento tenha de ficar com eles. É visando essemovimento futuro de liquidez, por exemplo, que o fundo de investimentodo Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) tem emprestado recursospara o setor imobiliário, comprando debêntures de empresas como OAS e Odebrecht.

Algumaspoucas operações feitas por companhias fechadas já estão sendooferecidas aos investidores. Foi o caso, por exemplo, das debêntures daCamargo Corrêa. Não houve apetite dos investidorespara comprar nada além do R$ 1 bilhão inicialmente ofertado, mas osbancos participantes da oferta - Bradesco BBI, Banco do Brasil, Itaú BBA e HSBC- conseguiram tirar dos seus balanços aquilo que seria um tradicionalfinanciamento. A emissão teve duas séries. A mais curta, de três anos,deve pagar 110% da taxa do Depósito Interfinanceiro (DI). Já a maislonga, com cinco anos, dá uma remuneração de 114% do DI. Ao todo, acompanhia já emitiu R$ 2,8 bilhões.

"Comoum banco de investimento, meu objetivo é sempre vender o papel, mas àsvezes esbarramos em uma qualidade de crédito baixa para o padrão dosinvestidores. Nesses casos, optamos por ficar com as debêntures",afirma João Carlos Zani, diretor do Bradesco BBI.

Umaexigência para que as empresas fechadas possam ofertar debêntures édivulgar suas informações financeiras. Mas, por lei, elas só precisampublicar um balanço anual, enquanto as abertas divulgam os dadostrimestralmente. "É uma questão de amadurecimento do mercado. Se orisco é maior, a remuneração também deve ser. Tudo vai depender de comoas ofertas iniciais vão evoluir", afirma Rubens Cardoso da Silva,gerente-executivo de mercado de capitais do Banco do Brasil.

Paratornar o acesso ao balanço mais fácil, a CVM exige que seja publicadono site da empresa até três meses depois do encerramento do exercíciosocial. Além disso, os dados devem ser auditados por empresasregistradas na autarquia.

Paracompensar a falta de informação, de uma forma geral, o tipo de ofertaque as companhias fechadas podem fazer ainda é bastante diferente dagama de opções disponível para as empresas abertas. Para começar, ainstrução que trouxe essa novidade, a 476, só permite a oferta de umavariedade restrita de valores mobiliários, como debêntures e notaspromissórias. Ações, por exemplo, ficaram de fora. Além disso, ospapéis só podem ser ofertados a investidores de grande porte, sendo queno máximo 50 deles podem analisar a emissão e até 20 podem comprá-la.Por isso a oferta é chamada de "esforços restritos".