Título: Bancada da bola atrai votos e busca imunidade parlamentar
Autor: Grabois , Ana Paula
Fonte: Valor Econômico, 02/10/2009, Política, p. A10

Dos gramados para as urnas, os ex-jogadores Romário e Edmundo se aposentaram do futebol e preparam-se para concorrer às eleições do ano que vem. Em torno do sucesso nos campos, saem agora em busca de uma goleada de votos nas próximas eleições. Os partidos os procuram como puxadores de votos, enquanto os boleiros, muitos com problemas na Justiça, anseiam por um novo emprego fora dos campos e a salvaguarda da imunidade parlamentar.

Edmundo e Romário, que já formaram dupla de ataque no Vasco, Flamengo e Fluminense agora vestem camisas diferentes. Enquanto Edmundo deve fechar sua filiação ao PP, com as benções do ex-deputado federal e ex-presidente do Vasco, Eurico Miranda (com quem faria tabelinha nas urnas, o primeiro sendo candidato a deputado estadual e o segundo a federal), Romário saiu do PP e acertou sua entrada no PSB - com direito à gafe de chamar o partido de PSDB logo na estreia.

"Suderj informa: substituição no PP, sai Romário e entra Edmundo". A frase do deputado estadual Dionísio Lins (PP - RJ), coordenador de novas filiações no partido, é sintomática também para outras mudanças. Outrora protegido de Eurico, Romário se indispôs fatalmente com o ex-manda-chuva vascaíno. Numa ocsião, quando estavam no Vasco, Edmundo reclamou das regalias de Romário no clube e o apelidou de "príncipe". Romário não se abateu e respondeu: "Agora a corte toda está feliz: o rei (Eurico Miranda), o príncipe (Romário) e o bobo (Edmundo)".

Os jogadores ainda coincidem no quesito confusão fora dos gramados: neste ano, Romário chegou a ser preso por falta de pagamento de pensão alimentícia a dois filhos e sua cobertura da Barra da Tijuca foi leiloada para pagamentos de dívidas de condomínio. O ex-jogador teve bens bloqueados pela Justiça para pagar indenização ao ex-técnico Zagallo, é investigado por envolvimento em uma pirâmide financeira e deve IPTU, IPVA e indenizações trabalhistas.

Em julho, Romário chegou a ser condenado a três anos e meio de prisão e foi multado em R$ 1,7 milhão por crime tributário por omitir informações à Receita Federal. A prisão deve ser substituída por prestação de serviços comunitários.

Já Edmundo, 38 anos, apelidado de Animal, tem condenação de quatro anos e meio de prisão pela morte de três pessoas em acidente de carro ocorrido em 1995. Seus advogados já tentaram oito vezes reverter a condenação sem sucesso. A oitava negativa ocorreu no ano passado no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e novo pedido de reversão deve ser julgado no Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo a interpretação de seu advogado, Luiz Roberto Leven Siano, no entanto, o crime já teria prescrito.

Para o deputado estadual Dionísio Lins (PP-RJ), os jogadores são puxadores de legenda. "O Edmundo pode ter 100 mil votos somente com os torcedores do Vasco", afirmou Lins. O PP do Rio pretende lançar ainda o cantor popular Elymar Santos, que teria potencial de eleger-se com 500 mil votos, segundo estimativa do partido.

O presidente regional do PSB e secretário estadual de Ciência e Tecnologia do Rio, Alexandre Cardoso, diz que a estratégia do partido para 2010 é lançar candidatos já conhecidos, jogadores e artistas, para angariar o voto popular. "Temos que entrar nas comunidades com algum mito para ocupar o espaço das milícias e dos evangélicos", afirmou. Podem candidatar-se pelo PSB a atriz e apresentadora Ângela Bismarck e o ex-participante do programa Big Brother Brasil Bam Bam. "Nossa tese é popularizar sem vulgarizar o processo político", disse Cardoso.

Em São Paulo, Marcelinho Carioca, ídolo corinthiano e atualmente no Santo André, chegou a ser dado como certo no PDT, mas sairá candidato a deputado federal pelo PSB. As recentes filiações do vereador Gabriel Chalita e do presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), Paulo Skaf foram decisivas na escolha do jogador. Também concorrerão a deputado estadual em São Paulo o ex-jogador Dinei e a deputado federal o ex-goleiro do Corinthians Ronaldo.

Dois outros personagens do mundo futebolístico paulista podem também tentar a sorte nas eleições de 2010: o presidente do Corinthians, Andrés Sanchez, e o técnico do Santos, Vanderlei Luxemburgo. Andrés acaba de se refiliar ao PT, em ato que teve a participação da provável candidata à Presidência, a ministra Dilma Rousseff. "Ele é um petista por história. Quando houve o recadastramento do PT, nos anos 90, Andrés não participou, mas agora está de volta. Seu irmão (Tadeo) foi, inclusive, coordenador de núcleos do partido na Europa", afirma o presidente da Executiva Estadual do PT, Edinho Silva, que descarta a possibilidade de Andrés concorrer nas próximas eleições. Andrés Sanchez fica na presidência do Corinthians até 2012.

Já Luxemburgo, cujo contrato com o Santos termina no fim do ano, foi convidado pelo PSB, com vistas a concorrer ao Senado pelo Tocantins. Também sondado pelo PT, por sua amizade com o prefeito de Palmas, Raul Filho, Luxemburgo empresta seu nome a campeonatos de futebol para garotos de 7 a 18 anos no Estado. Para Kairo Bernardo, secretário de Esportes e Juventude de Palmas e responsável pelo convite do PSB, "Vanderlei tem muita identificação com o Tocantins, está sempre por aqui". Kairo conta ainda que a possível filiação de Luxemburgo já é do conhecimento da direção nacional do partido. "Até o Ciro Gomes está sabendo, mas disse que não ia se meter".

Luxemburgo está sob investigação da Receita Federal. O fisco acusa uma diferença entre R$ 5 milhões e R$ 6 milhões em sua declaração de imposto. Antonio Carlos Sandoval Catta-Preta, advogado do treinador, diz que houve revisão deste valor, que estaria na casa de R$ 1 milhão após discussões com a Receita, com processos administrativos em curso para determinar o valor exato.

Dois personagens aqui elencados têm ações contra Luxemburgo: em 1999, Edmundo investiu cerca de R$ 400 mil em uma empresa de um amigo de Luxemburgo. Como a empresa faliu, o técnico se responsabilizou pelo pagamento, dando dois cheques ao jogador. Catta-Preta afirma que seu cliente pagou o que devia, mas como não tinha qualquer comprovante, Edmundo entrou com ação na Justiça - e venceu, tendo a receber R$ 1,3 milhão.

Há ainda uma ação, vencida em primeira instância, de Marcelinho Carioca, por danos morais. Em uma programa de TV, Luxemburgo chamou o jogador de "safado e moleque", disse que havia tirado mulheres de seu quarto durante as concentrações, quando era seu técnico no Corinthians, além de afirmar que Marcelinho "se esconde atrás da religião".

Jogadores de futebol que ingressam na política não são novidade. Túlio Maravilha, ex-atacante do Botafogo, é vereador de Goiânia pelo PMDB. João Leite, ex-goleiro do Atlético Mineiro, é deputado estadual em Minas Gerais (PSB). O médico e supervisor de futebol do São Paulo, Marco Aurélio Cunha, é vereador em São Paulo e também deverá ser candidato a deputado estadual pelo DEM.

Ademir da Guia, ex-Palmeiras, foi vereador em São Paulo pelo PCdoB, eleito em 2004. Pouco habituado aos trâmites da vida partidária, Ademir votava com a situação. O PCdoB, porém, era aliado do PT e defendia a oposição ao então prefeito José Serra (PSDB). Essa situação desgastou a relação entre o vereador e o partido. Posteriormente, Ademir foi acusado de reter parte dos salários de funcionários de seu gabinete em benefício próprio. Pouco depois, rompeu com o partido e foi para o PR.

De olho nos investimentos que virão por conta da Copa do Mundo de 2014, no Brasil, esses novatos da política com passado futebolístico têm por mérito um discurso de plataforma única: o esporte como inclusão social. O deputado federal Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força (PDT-SP), ex-boleiro do Londrina, apesar de reconhecer a capacidade dos esportistas em angariar eleitorado, é reticente quanto à atuação dos mesmos: "É claro que futebol traz votos. Eu mesmo, que sempre jogo com o time da Força Sindical, uso o campo como palanque, porque depois do jogo dá pra conversar com as pessoas. Os maiores índices de voto do PDT são em bairros onde nosso time joga sempre". Mas pondera: "Eleitor percebe quando o cara só fala de uma coisa. O Dinei mesmo só falava de Corinthians, de atuar na política para construir um estádio pro time. Aquilo pegou muito mal. Ele estava meio tosco, mas conversamos muito com ele. Acredito que agora estará bem mais preparado."

Na Câmara Federal, o ex-jogador Deley, que foi estrela do Fluminense nos anos 70 e 80, está no segundo mandato consecutivo. Entre seus projetos, destaca a criação do Dia do Jogo Limpo, lei que alertaria para os efeitos maléficos do uso de anabolizantes por atletas. "É uma coisa simbólica", explicou o deputado.