Título: Absolvições revoltam Conselho de Ética
Autor: Thiago Vitale Jayme
Fonte: Valor Econômico, 10/03/2006, Política, p. A12

Crise Integrantes ameaçam deixar colegiado e acusam deputados de votar com base na amizade e biografia

As absolvições dos deputados Roberto Brant (PFL-MG) e Professor Luizinho (PT-SP) pelo plenário da Câmara na noite de quarta-feira fomentaram protestos violentos no Conselho de Ética na manhã de ontem. Sem clima depois da desmoralização de quarta-feira (o colegiado havia pedido a cassação dos dois parlamentares), não houve trabalho na comissão ontem. A leitura e votação do relatório sobre o deputado José Mentor (PT-SP), marcada para ontem, foi transferida para o dia 16. "Sem dúvida, estamos em uma ressaca. Estamos frustrados. Os deputados não votaram com base nos fatos, mas na amizade e na biografia dos acusados", esbravejou o presidente do colegiado, Ricardo Izar (PTB-SP). "É constrangedor. Fazemos um trabalho difícil e vemos o plenário ignorar as nossas decisões", disse o deputado Júlio Delgado (PSB-MG). Luizinho e Brant eram réus confessos do recebimento do dinheiro de Marcos Valério de Souza e condenados pelo Conselho de Ética. Luizinho fez saques, e Brant recebeu doação da Usiminas por intermédio da agência de publicidade da empresa, a SMP&B, de Valério. Nervoso, Delgado bateu boca com o deputado Fernando Ferro (PT-PE) no Salão Verde e chegou a anunciar que haveria uma renúncia em massa dos cargos no conselho. Mais tarde, recuou, pelo menos por enquanto. "Vamos esperar e reavaliar isso depois do fim das análises dos processos que restam. Não podemos abandonar nosso companheiro assim", afirmou. Coubert Martins (PPS-BA), suplente de Delgado, anunciou ontem a renúncia ao cargo no conselho em protesto contra as absolvições. Não só Coubert Martins e Júlio Delgado devem pedir para deixar o Conselho de Ética. Edmar Moreira revelou ontem a disposição de abandonar a cadeira no colegiado depois de definido o processo contra Mentor. O deputado Chico Alencar (P-SOL-RJ) também estuda deixar o colegiado. "Vamos terminar a nossa missão de julgar todos os processos e depois vamos repensar tudo isso", disse. E completou: "O plenário está, aos poucos, cassando o próprio Conselho de Ética". Júlio Delgado acusou os colegas de não acompanhar o trabalho do Conselho. "Temos de avisar para o plenário prestar mais atenção aos relatórios elaborados pelos conselheiros", afirmou. Izar tem a mesma opinião. "Oitenta porcento dos deputados não sabiam nem quais eram as acusações contra os dois deputados julgados ontem (quarta)", reclamou o presidente do Conselho, apoiando a suspeita de um acordão entre PT e PFL para salvar seus acusados. Outro momento de irritação de Izar aconteceu por causa da falta de transparência dele próprio ao justificar o adiamento da votação de Mentor. Na pauta do dia, o aviso era claro: "Apresentação, leitura, discussão e votação do parecer do relator". Izar abriu os trabalhos, marcou a sessão para o dia 16 e encerrou os trabalhos. Interpelado pelos colegas, disse que nunca havia previsto votação para ontem. O pedido teria sido feito por Edmar Moreira (PFL-MG), relator do caso, e pelo próprio Mentor. O petista tinha receio de sofrer com a ira dos conselheiros no dia seguinte a duas absolvições. O presidente também teria avaliado que seria ruim aprovar uma cassação no dia seguinte a uma desmoralização tão grande. Para Alencar, a Câmara definiu ontem uma forma de interpretação das acusações de recebimento de mensalão e de caixa 2. "Ontem (quarta) ficou provado que os deputados não encaram o recebimento de dinheiro do Marcos Valério de Souza e do uso de caixa 2 como delitos passíveis de pedido de cassação. Além disso, fala-se em observar o passado do parlamentar. Mas não é por aí. Fatos graves aconteceram agora", analisou. Ele prevê um festival de absolvições a partir dessas. A avaliação de alguns deputados - não integrantes do Conselho - escapa um pouco ao pessimismo de Alencar. Muitos parlamentares acreditam, sim, em diversas absolvições. Mas prevêem algumas cassações, ainda que poucas. Na próxima semana, terão seus processos analisados pelo plenário, na quarta-feira, os deputados Pedro Corrêa (PP-PE) e Pedro Henry (PP-MS). Parlamentares influentes do PT e do PFL acreditam na cassação do pernambucano, já que se trata do terceiro pedido de cassação feito contra ele. "Toda crise que aparece tem o Pedro Corrêa no meio. Não acredito que o plenário vá poupá-lo", disse um petista de alto gabarito. Outros prognósticos são complicados. "Depende muito do clima do dia", afirmou um pefelista influente. O caso de João Paulo Cunha (PT-SP) é um dos mais aguardados. O forte relatório elaborado pelo relator Cezar Schirmer (PMDB-RS) na terça-feira mudou algumas opiniões. "Eu imaginava que ele seria absolvido. Mas com o relatório tão bem feito, é complicado. É preciso ver o clima no dia da votação", afirma um petista. Cunha tem a vantagem de ter ótima relação com os colegas, diferente de outro parlamentar próximo da cassação, José Mentor. O petista deverá ter problemas pois nunca foi um parlamentar com bom trânsito em diversos partidos, como eram Brant, Luizinho, Sandro Mabel (PL-GO) e Romeu Queiroz (PTB-MG), absolvidos até agora.