Título: Agenda de Aldo fomenta disputa interna
Autor: Raymundo Costa
Fonte: Valor Econômico, 01/03/2006, Política, p. A8

Congresso Presidente da Câmara monta "agenda do desenvolvimento" e bate de frente com a pasta da Fazenda

Passado o Carnaval, o presidente da Câmara, Aldo Rebelo, pretende reunir representantes do Banco Mundial com líderes partidários e deputados da bancada ambientalista. O Bird tem planos para investir no setor de infra-estrutura, numa mudança do enfoque que, até agora, privilegiava a área social, mas quer se assegurar de que esses projetos, em geral de longo prazo, contarão com respaldo político, independente de mudanças no governo. A reunião será o pontapé inicial do que Aldo chama de "agenda do desenvolvimento", um plano de vôo para 2006, cuja linha mestre será o resgate de projetos que eliminem gargalos para o desenvolvimento. O ponto alto da agenda será o "Seminário Caminhos do Desenvolvimento", a ser realizado no dia 15 de março, que tem tudo para bater de frente com a atual política econômica. Painel que promete aquecer o debate: "A lógica do Copom frente a uma política de crescimento", que deve discutir "a crucial diferença de objetivos do FED americano e do Banco Central do Brasil", além do "conceito de metas de inflação como centro de política monetária e desta como centro de política econômica". Aldo desvincula o governo da iniciativa da "agenda do crescimento". Mas se a pauta é incômoda para o ministro Antonio Palocci (Fazenda), soa como música aos ouvidos de ministros como Dilma Rousseff (Casa Civil) e Ciro Gomes (Integração Nacional), para citar apenas dois dos ministros engajados na chamada linha desenvolvimentista. O próprio documento que definiu "escopos e objetivos do seminário", preparado pela assessoria técnica da Câmara, é duro ao afirmar que "estabilidade sem crescimento não resolve nenhum dos grandes problemas do país: criação de empregos, geração de renda, crescimento do PIB, desafogo da pressão social". Além do debate interno que o governo mal consegue conter e conversas com partidos aliados como o PT e o PSB, foram as conversas com entidades empresariais e sindicais que levaram Aldo a amadurecer a "agenda do crescimento". Com a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), o presidente da Câmara deve assinar um convênio de "cooperação técnico-científica e cultural, além do intercâmbio de conhecimentos, informações e experiências entre as instituições". A entidade entregou a Aldo uma lista com quatro projetos, em tramitação, que considera prioritários. Além da Fiesp, o presidente da Câmara fez um roteiro que passou pelo Sindipeças e Abdib, entre outros. Em conversas anteriores, no fim do ano passado, Aldo notara que os empresários só falavam de sucessão. Agora, vêem que o Congresso ainda tem condições de votar projetos importantes para o crescimento, apesar do ano eleitoral, quando o Legislativo costuma esvaziar, sobretudo no segundo semestre. No atacado, as preocupações manifestadas foram com a redução do Estado e a necessidade de uma nova reforma da Previdência - algo que Aldo também considera inevitável de ser tratado no Congresso, independente do governo a ser eleito em outubro. Ele sugeriu que os empresários tomassem a iniciativa, desde já, de levantar essa e outras discussões, como a do gerenciamento dos gastos da saúde. Usar o dinheiro existente na prevenção, em projetos de saneamento básico, por exemplo. Para viabilizar a "agenda do crescimento", o presidente da Câmara concluiu que ela não poderia ser uma agenda do governo, mas que corresponda aos interesses de várias correntes. Assim começou a resgatar projetos que estavam parados nas comissões técnicas, como a Lei Geral da Micro e Pequena Empresa, já pronta para ser votada no plenário. Os próximos da lista são a Lei do Gás, que muda a legislação sobre produção e comercialização de gás, e o projeto que estabelece as regras para a prestação de serviços de saneamento no país. Os projetos em discussão sobre o gás e sobre as micro e pequenas empresas batem de frente com o que pensam, respectivamente, a Petrobras e o Ministério da Fazenda. Já as divergências no projeto da lei de saneamento são residuais e são boas as possibilidades de acordo. Para viabilizar o andamento das propostas, Aldo tem procurado indicar relatores de partidos grandes, sem privilegiar a base do governo. Ele espera ainda votar este ano a lei que cria o Super Cade - uma mudança fundamental seria a análise anterior da fusão de empresas, com prazo determinado. Deve enfrentar o poderoso lobby dos escritórios de advocacia. Foi a partir de uma conversa com o diretor do Banco Mundial para o Brasil, John Briscoe, que Aldo teve a idéia de incluir a questão ambiental na "agenda do crescimento". Nessa conversa, Briscoe falou a Aldo da experiência do Bird com a China e a indica em investimentos de infra-estrutura. Havia no entanto a preocupação de que esses investimentos, de longo prazo, pudessem ser colocados em questão por razões políticas - seria desgastante para o banco financiar projetos que depois ficassem parados. O presidente da Câmara considera, desde o tempo em que trabalhava no Palácio do Planalto, que "o custo da legislação ambiental para o investimento tem sido muito alto". Nas próximas semanas, Aldo deve reunir Briscoe com líderes partidários e deputados da bancada ambientalista. Além de um aval político do Congresso, Aldo pretende oferecer mais: a mudança na legislação, como o estabelecimento de prazos para que o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) se pronuncie sobre os projetos e transferir para o procurador-geral da República a iniciativa para pedir o embargo de obras federais, hoje ao alcance os escalões inferiores do Ministério Público Federal. Há dois anos, o cálculo era que havia usinas que produziriam 10.226 MW com restrições ambientais, várias delas com liminares na Justiça. Ou simplesmente com licenças ainda não expedidas, pela morosidade do Ibama. Exemplo bem acabado dessa situação ocorreu em dezembro, quando o governo programou um leilão de energia nova no qual tinha a intenção de levar ao martelo 17 usinas. No dia marcado, apenas sete estavam em condições de ser leiloadas - as demais estavam sem a licença prévia do Ibama. Isso gera incerteza no fornecimento de energia elétrica para o futuro, no caso, 2011, já que é de cinco anos o prazo de cada projeto. E energia é fundamental para crescimento. Aldo também gostaria de mudar o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), que considera "quase um Congresso paralelo". Na opinião do presidente da Câmara, antes de a legislação ser estabelecida "os crimes ambientais eram horrendos", o que levou os legisladores a passar do "ponto de equilíbrio, com um emaranhado de leis, portarias, decretos e regulamentos que inviabilizam tanto a construção da infra-estrutura como também o investimento". Haveria agora espaço para se discutir uma legislação realista com as necessidades do crescimento. Aldo está otimista, apesar do ano eleitoral. É uma agenda para remover gargalos do crescimento e desde já estabelecer um debate que será crítico a partir de 2007. Ele acha que talvez possa votar até alguns itens da reforma tributária. O seminário de março, que terá a participação de boa parte da inteligência universitária e da elite empresarial do país, pode dar a medida do interesse que a "agenda do crescimento" deve despertar na sociedade e no Congresso.