Título: Argentina mantém resistência a dois itens da proposta
Autor: Raquel Landim e Marli Olmos
Fonte: Valor Econômico, 21/02/2006, Brasil, p. A3

Na reta final para um acordo provisório de extensão do atual acordo sobre o setor automotivo, o governo argentino vem resistindo a duas reivindicações brasileiras, segundo pessoas que acompanham de perto a negociação. Os termos finais do acordo entre os dois países serão negociados nesta semana, para entrar em vigor entre março e junho. Os argentinos resistem a manter no acordo dois itens desejados pelo governo brasileiro: medidas em favor da "competitividade" (texto propositadamente vago formulado para tratar da exigência das montadoras de extensão de todo ou parte do desconto de 40% na tarifa de importação de autopeças) e a idéia de prever a fixação de datas para o livre comércio no setor. O acordo em negociação tem de estar firmado até 28 de fevereiro, quando acaba o regime automotivo em vigor (o regime deveria acabar em 1º de janeiro e foi estendido até o fim deste mês). Basicamente quatro pontos estão em discussão: a decisão, já tomada, de não estabelecer agora o livre comércio para o setor automotivo; a decisão de manter o sistema de "flex", pelo qual as vendas de um país ao outro estão limitadas a uma proporção do que é comprado pelo parceiro; as linhas gerais para orientar a negociação do acordo definitivo; e uma fórmula para acomodar a reivindicação das montadoras de redução em 40% das alíquotas de importação de autopeças no Brasil. Nas discussões internas do governo brasileiro, o ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, foi o principal defensor da inclusão dessa cláusula no acordo. O Itamaraty propôs um texto genérico, que permita a continuidade das conversas com os argentinos sobre o assunto, mas mesmo esse texto foi recusado pela diplomacia argentina, na última reunião de negociações, há duas semanas. Há expectativa de que haja uma mudança de posição do governo Kirchner, que estaria resistindo para fortalecer suas posições. O acordo provisório adiará para depois de março uma outra discussão delicada, sobre possíveis mudanças no sistema de "flex". Hoje, cada país pode exportar ao vizinho o equivalente a 2,6 vezes o que importou do parceiro. A Argentina, que abastece hoje 75% do mercado interno com veículos comprados do Brasil (enquanto o Brasil tem apenas 3% de automóveis de fabricação argentina) pretendia modificar essa proporção. A recusa do Brasil em mudar o índice do "flex" levou os argentinos a mudar de posição: agora querem que a proporção seja calculada individualmente para cada montadora - o que prejudicaria as empresas que não têm filial em solo argentino. Um outro tema polêmico que fará parte das negociações será o futuro dos investimentos do setor. Os argentinos têm se queixado da migração de investimentos das montadoras para o Brasil. Repercutiu mal no país vizinho a recente entrevista de Carlos Ghosn, presidente mundial da Renault, em que o executivo encarregado da reestruturação da empresa anunciou planos de fortalecimento da produção no Brasil, e foi evasivo quando lhe perguntaram sobre a fábrica na Argentina. Os dois governos pretendem discutir algum mecanismo que estimule a distribuição das linhas de produção entre os dois países.